PARA ONDE FORAM AS BOAS MÚSICAS DE CINEMA?

   Alguém pode me dizer o que aconteceu com a arte da trilha sonora de cinema? E mesmo da TV? Eu estava agora vendo uma prova de patins e um dos concorrentes usou a maravilhosa trilha de East Of Eden, filme com James Dean. Outros usam trilhas de filmes com 40, 50 anos...O que houve? Voce consegue lembrar da trilha sonora de Avatar, Harry Potter, Os Vingadores ou Homem Aranha? Falo de sucessos imensos, se falar de filmes menores a coisa piora. Eu adorei A Grande Beleza, mas não recordo da trilha. Ah sim, podemos dizer que adoramos uma canção usada num filme, mas isso não é música de cinema!
   Pessoas usam e recordam as músicas de Superman, De Volta Para o Futuro, E O Vento Levou ou de O Poderoso Chefão. Nino Rota com Fellini, todo mundo lembra. As trilhas da Pantera Cor de Rosa, de James Bond ou de Butch Cassidy, Tubarão e Spartacus. Alguém lembra do tema de Erin Brockovich? Mas não existe quem não identifique os temas de Elza em Born Free ou de Lara em Dr. Jivago.
   O que aconteceu? Mesmo Duro de Matar tinha uma trilha sonora identificável, assim como Rambo ou Rocky, mas onde a trilha de Homem de Ferro? 
   Uma arte que se perdeu?

O QUE É A BELEZA

   Pessoas infelizes perdem o senso de beleza. A tristeza pode ser bonita, mas a infelicidade não consegue reconhecer esse fato. Algum psicólogo deveria estudar isso. A capacidade de perceber o que é belo pode salvar uma vida. Mais que isso, salvar um povo.
  Pintores são os divulgadores daquilo que seu tempo pode ver. Se Giotto pintava a pureza de anjos em paredes de igrejas pobres, isso se devia a capacidade de seu tempo em perceber anjos em cada manhã. E se Monet via movimento e cor como tudo que existe no mundo, era porque seu tempo tomava a consciência de que tudo era velocidade e fugacidade. Os artistas percebem antes. O Zé da esquina só notou isso 50 anos mais tarde. Cézanne lutou contra isso. Sua obra é uma tentativa de parar o que se move. 
  Pollock viu que tudo é uma energia nervosa e que na verdade a vida é desfeita. Um ato aleatório que espiritualmente faz sentido, mas esse sentido nos escapa. O Zé só começa a perceber isso agora, sessenta anos depois. Warhol viu nos supermercados nossa nova igreja e nosso museu. Acertou na mosca. Mesmo que hoje a arte pareça esquecida, sua mediocridade é ainda testemunho relevante da futura hiper-mediocridade dos Zés. 
  Porque o artista percebe antes. Bowie brincou em 1972 de artista Pop e em 2014 todos são Bowie ( produzidos, calculados, frios, profissionais, atores ). Assim como Welles percebeu antes que o cinema era arte do ego do diretor e Shakespeare sentiu que a escrita podia ser um campo de guerra entre o eu e o anti-eu.
  A beleza se faz em todos eles. Sem o maravilhamento, mesmo que brega, mesmo que rápido, não se faz nada que permaneça. O que mais nos deixa aturdidos é quando percebemos a beleza da tragédia. 
  O senso do belo, sei disso com absoluta certeza, nasce na infância. E não por se crescer em lugar bonito, ou ter a sorte de ser feliz e amado. Mas quando temos tempo para ver. Na infância, quando deixados em paz, entregues a nós mesmos, vemos um mundo inteiro numa tarde de marasmo, intuimos a poesia numa manhã de calor, criamos uma lenda entre pedras e panos velhos. Cheiros, cores, ruídos, tudo é novo e tudo se fixa em mente vazia e virgem. Se não somos perturbados por horários, barulho e pressão, criamos a certeza da beleza. Ela se afirma e existe para o resto da vida.
  Em Sochi, nesta Olimpíada de Inverno, vive beleza para quem a conhece. Uma suiça que desce em seu snowboard e erra tudo. O rosto com um olhar que é mais triste que morrer. Os olhos não conseguem ver, ela vira a face para o chão, a boca se contrái, os cabelos parecem dizer: Eu errei. Eis a beleza se dando para ser notada por quem a conhece.
  Foi John Keats quem falou que uma coisa bela é uma alegria que dura para sempre. Mais que isso. Uma coisa bela nos faz viver para sempre.

Visage - The Damned Don't Cry



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The xx - VCR



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FESTIVAL INDIE: THE XX

Eu não sei se eu não gosto ou se reprimo as lembranças. Não sei se gosto ainda, ou se é um tipo de querer ainda gostar. Na verdade nem sei se foi de verdade ou se foi tudo mentira.
Um festival INDIE. Indie? Existe? Indie era coisa de bandas que ninguém conhecia e que os fãs pegavam a missão de lhes dar suporte. Com internet tem indie? Bom.......
The XX. Se fosse em 1982 seria uma novidade. Novidade dentre muitas porque em 1982 The XX seria parte de um bando. Em 1982 meu irmão, que sempre foi moderno, gostou de bandas iguais ao The XX. Por dois meses. Eu descobri o som dos XX em 1984, aquele ano mágico em que fui radicalmente moderno. E vamos dizer a verdade, para estar dentro dos XX é preciso ter 20 anos.
Mas eles, se em 2014 eu tivesse 20 anos, eu gostaria dos XX? Como saber? Nascido em 1994 eu não seria eu. Como saber?
Vejo um tipo Alison Moyet. Vejo um tipo Vince Clark. E vozes que cantam aquilo que cantei em invernos de amor vampiresco. Ah!! A sedução das peles brancas e dos lençóis gelados! A esquálida e impotente beleza do assexuado!
Volta a questão: eu ainda amo esse mundo frio? Ou ver XX é como ver um velho desenho da Hannah Barbera? Mark Almond, Siouxssie, Visage, oh doce desbunde sem vida! A timidez de amores contidos em redomas de papel de seda!
Para gostar de XX é preciso ter vinte anos e não ter visto a verdadeira beleza. Porque em 1984 eu nada sabia e brincava, como criança asmática, de ser belo. Tanta coisa depois o XX é somente uma fotografia viva em minha memória.
Triste sina da música indie: Ser uma Nova Memória...

HER/ MICHAEL CAINE/ BILL NIGHY/ ROBERT REDFORD/ TIO BOONMEE

ELA/HER de Spike Jonze com Joaquim Phoenix, Scarlet Johanssen
Sei lá. Nem lembro mais. É alguma coisa sobre um cara que se apaixona por uma voz. E essa voz, que vem de um PC, quer ser real. Mas não se anime, nada de profundo, nada de belo, nada de funny. A coisa depois de meia hora fica beeem entediante. Nota 3.
QUESTÃO DE TEMPO de Richard Curtis com Domhnall Gleeson, Rachel McAdams e Bill Nighy
Curtis fez a fama com o roteiro de 4 Casamentos e um Funeral. Depois disso começou a dirigir. Vi tudo o que ele fez desde então. Ele não tem um só filme ruim, mas também todos são frustrantes. Curtis ocupa uma região estranha, ele faz cinema clássico, mas com ideias teen. Aqui um adolescente timido descobre que pode voltar no tempo. É um dom dos homens da familia. Isso faz com que escolhas sejam feitas, escolhas duras. O filme não escolhe nada: não é comédia e nem fantasia. Temas fascinantes são tratados com rapidez. Well...Rachel é excelente, uma atriz com cara de gente. E eu adoro Bill Nighy! Os bons momentos são todos com ele. Nota 3.
TIO BOONMEE, QUE PODE RECORDAR VIDAS PASSADAS de Apichatpong Weerasethakul
Este estranho filme tailandês ganhou a Palma em Cannes em 2008. Dificil entrar nele, a barreira cultural é enorme. Fala de um homem que ao morrer, na agonia, recebe visitas de espíritos. Eles podem ser recordações de suas outras vidas. O filme é assustador. Morte e alma são tratados com absoluta naturalidade. Esquisito.
O ÚLTIMO AMOR DE MR.MORGAN de Sandra Nettelbeck com Michael Caine, Clemence Poésy, Justin Kirk e Jane Alexander
Quando estrear por aqui, fuja! Um homem velho, rico, viúvo inconsolável, se aproxima de uma jovem professora de dança. Nada de romântico entre os dois, mas ela o cativa. O filme é de um vazio irritante! Pra que fazer isso? Caine está assustadoramente velho...pena....Nota 1.
ATÉ O FIM de J.C.Chandor com Robert Redford
Redford, o querido Redford, ganhará mais um Oscar? ( Tem um de diretor ). O filme é surpreendente! Acompanhamos, detalhe por detalhe, a luta de um homem a deriva no oceano. Seu barco está danificado. Nada de trilha sonora, nada de vozes, só o som do mar e a ação do homem em meio a ondas, sol, cordas, reparos, comida em lata e solidão. Não deixa de ser o mesmo tema do filme com Sandra Bullock. Mas é um filme cansativo. Longo. muito longo. E estranhamente sem suspense. Nota 5.

RUSSOS

   Sochi 2014 me faz pensar. E lembrar. Os americanos e seus filmes fizeram com que a gente pensasse nos russos como frios e calculistas. A KGB e Stálin ajudaram. Mas eles nunca foram assim. E não adianta fazer filme de máfia russa. Pensar que o caráter russo é esse é como achar que todo americano é John Wayne ou que todo brasileiro é bicheiro. Aprendo que eles são eslavos, nem europeus e nem asiáticos. E que o que define um eslavo é o fatalismo e o sentido familiar. Familia: se voce é bisneto de alemão, não importa onde nasça, voce é um alemão. Sua nacionalidade não é dada pelo chão onde voce pisa, mas sim pelo sangue de onde voce brotou. Fatalismo não é melancolia ou pessimismo. Também é mas é além. Fatalismo é saber que o que é sempre há de ser.
   Minha amiga Eliana Llorca me ensina que no mundo só existem duas línguas que vivem essa mania do diminutivo: o português, com suas mãezinhas, barquinhos e Paulinhos, e o russo, que se trata por irmãozinho, patriazinha e amorzinho.
   Houve um tempo em que eu amava a Rússia. Tempo frio ( que saudade do inverno! ), em que Dostoievski e Pushkin me pareciam mais próximos que Machado ou Lima Barreto. Mas tinha mais, tinha Rimsky-Korsakoff, Tchaikovsky e Prokofiev. ( Tolstoi só descobri adulto ). Tinha a bio de Tchaikovsky de Ken Russell ( uma visão inglesa sobre a Rússia ). Eu amava o fatalismo russo, o frio escuro, o exagero da dor. Um russo não sofre, ele uiva, um russo não ama, padece de amor. Mas a ideologia estragou tudo. Os comunistas, logo descobri, eram tão fanáticos que tratavam a Rússia como o Eden na Terra. A Rússia virou uma máquina, um relógio perfeito. O povo era soldado. Esqueci da velha mãezinha russa.
  Russas, as meninas russas, são especiais. Porque são tristes e submissas como as mamães de 1900, são duras como as operárias de 1920 e tentam ser modernas como as americanas de 1980. São russas, variam entre a camponesa e a estrela do Bolshoi.
  Planícies imensas onde o gelo e a lama se confundem. Um passado.

The Who live at the Isle of Wight Festival 1970



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The Who - Baba O'riley (live Keith Moon)



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PETE TOWNSHEND, A AUTOBIOGRAFIA

   Pete é um solitário. Mesmo casado por 24 anos, filhos, banda, fãs, ele sempre foi um homem só, e muito consciente disso. Na verdade ele sempre amou a solidão. Individualista, egocêntrico, mas nunca vaidoso, Pete é um complicado. Em 50 anos de banda ele nunca conseguiu se sentir um dos caras. Em 50 anos de rock, nunca se sentiu como um cara do rock. Sempre fora, um casado que tinha casos e se sentia culpado, um pai distante, rei dos palcos que logo se cansou de tocar. Insatisfeito. sempre.
 Termino o livro e falo aqui da segunda parte ( a primeira está abaixo ). O auge foi em 69/71, depois disso, a lenta decadência. Lendo notamos que The Who sempre foi palco, os discos eram secundários. Ou não? Pete é um workaholic. Composições para teatro, filmes, solo, banda, produtor. Em 1970 ele começa a lidar com música eletrônica. Um projeto, Lifehouse, imenso, ambicioso, que acaba por dar em nada. Faz palestras sobre o novo som ( é visto por Eno, que sente na palestra qual seu futuro como um não-músico ). Pete trabalha pela música do futuro, música programada, aleatória, ou livre. Quadrophenia surge como um novo Tommy. Ele fala das várias versões de Tommy, do sucesso de Tommy nos palcos. Os anos 70. A loucura exagerada, as brigas com Keith Moon. A morte do baterista louco, Pete não disfarça, a morte de Moon foi um alivio. 
  Os anos 80. Pete se liga em Clash, Jam, Specials. Mas acontece com ele o que amaldiçoou toda a época: cocaína, bebida, ego. Albuns solo, excursões em o Who. Roger Daltrey surge no livro como um herói. Pete sem querer lhe dá um perfil muito admirável. O cara íntegro, apaixonado pela banda, lutando para a manter forte. Um grande cantor, um conquistador, um cara legal.
  Pete se torna editor da Faber, a mítica editora de TS Eliot. Convive com Pinter, Ted Hughes, Byatt. O livro se fecha em sua vida fora do rock. Livros, familia, Broadway. E neste século, enfim, a volta do Who. E a acusação de pedofilia.
  Pete Townshend seguiu Meher Baba, fez terapia, casou, foi pai, escreveu algumas das melhores músicas do século XX. Fã de Kinks e Stones. Livre. Um homem que se diz feliz, finalmente feliz.