FLUSH...VIRGINIA WOOLF...NOVA E BELA EDIÇÃO DA ED. AUTÊNTICA.

   Escrito nos anos 30, este é o livro que mais vendeu de Woolf. Foi escrito como diversão, ela tentava descansar após a laboriosa escrita de Ao Farol.
  Se vendeu bem, a crítica ignorou. Passou a ser um livro pouco considerado. Mas, a partir dos anos de 1990, com a onda de "estudos literários animais", ele recebe a atenção que merece. Sim, Flush é um cocker-spaniel. E é o personagem principal deste biografia canina. Flush existiu de fato. Foi o cão de Elizabeth Barret Browning, a famosa poeta inglesa do século XIX. O cachorro foi imortalizado em dois poemas escritos por Elizabeth, e pela vasta correspondência, onde ela o cita várias vezes. Virginia pega essas cartas e escreve a vida de Flush e da poeta. Tudo sob o ponto de vista do cachorro.
  O livro não é jamais choroso. Ao contrário da maioria do que lemos em livros sobre bichos, Flush não é um sofredor. É um aturdido. Nasce no campo, depois vive na casa rica e esnobe da poeta, na Londres de 1850, e ao fim, se muda para a Itália, Florença, onde ele conhece a liberdade do sol e das ruas. No fim do livro ele morre, e creia, nada há de melodramático nisso. Flush simplesmente, velho e cansado, fecha seus olhos, e vira uma outra coisa, não mais um cão.
  Ilustrado, com capa dura, cheio de comentários, é uma linda edição, digna de ser dado como presente de fim de ano. Mas atenção! Não é para crianças! É para adultos que amam bichos. Pois as aventuras do cachorro estão muito mais ligadas aos sentidos e aos sentimentos, a relação entre ele e a poeta,e depois entre ele e o marido da poeta ( o brilhante poeta Robert Browning ), que as aventuras do tipo "Disney". ( Que são também ótimas, mas passam longe daqui ).
  É um belo livro. Não o melhor sobre cachorros, mas um belo livro.

Leonard Cohen - I'm Your Man



leia e escreva já!

Leonard Cohen - Dance Me to the End of Love



leia e escreva já!

82 É UMA BOA IDADE PARA MORRER ( LEONARD COHEN )

   Rilke disse que nós humanos não podemos ver anjos porque a visão de tanta beleza seria para nós completamente insuportável. Anjos terríveis.
  A música de Leo tinha essa coisa horrível. Era fria, distante, trágica e perversa. E ao mesmo tempo era linda, porque sabíamos que quem cantava, cantava para seus anjos.
  Leo agora vê seus anjos judaicos. Suzanne lhe abre as portas dos céus e Leo pode fazer suas perguntas mais uma vez. Talvez agora alguém as responda. Mas penso que não mais importa.
  A vida inteira Leonard Cohen amou a morte. Não como um suicida, que a odeia tanto que se afoga em seu horror. Ele a amou como se ama uma mulher. Com fascínio, medo, respeito e desejo. Ele pensava sempre no lado de lá.
  A morte, essa prostituta, levou Lou Reed e sádica, raptou Bowie de nós. Agora, entre véus, seduzida, pega Leo pela mão e o leva em valsa.
  Nenhuma morte me parece tão justa.

REVOLUÇÕES...

   Nenhuma invenção é mais trágica que essa coisa francesa chamada de FERVOR REVOLUCIONÁRIO. Junte um bando de pessoas querendo reformar o mundo, o resultado será sempre injusto e violento.
   Foram os franceses que patentearam essa febre por reformas. Foi a REVOLUÇÃO FRANCESA, a grande farsa, que trouxe ao mundo a moda da revolução. Mas antes esse fervor já existia. Queimar hereges, matar protestantes, massacrar judeus, tudo isso era feito da mesma água.
  Depois da revolução francesa tivemos as COMUNAS DE PARIS, a REVOLUÇÃO RUSSA,  a CHINESA,  o NAZISMO, o FRNAQUISMO e mais um milhão de movimentos grupais revolucionários. Todos trouxeram sangue, atraso, repressão e injustiça. E todos tiveram de criar a terrível imagem do BODE EXPIATÓRIO. Pois NENHUMA revolução cresce no amor. Quando falamos de revolução falamos sempre de ÓDIO.
  Por isso adoro o estilo INGLÊS  de ser. Seus movimentos sociais preservam sempre o BOM SENSO. E não à toa, foram eles que resistiram a Napoleão, Hitler, Stalin e tantos outros. Nunca devemos nos esquecer que é em Londres que Karl Marx se refugia. Assim como Freud. Os judeus. Aliás, nunca se queimou uma bruxa na Inglaterra. Na alma do inglês existe o amor a discrição, a preservação de um costume. Eles nunca aceitam que se derrube uma parede. Preferem pinta-la.
  Pergunte a um indiano sua opinião sobre a colonização inglesa e eu lhe garanto que será menos amarga que a opinião de um africano sobre a colonização francesa, belga ou alemã.
  Por isso eles tinham de sair do EURO.

TARKOVSKI ....VALLÉE...RUSSELL CROWE...ROD STEIGER...NAOMI WATTS

   WATERLOO de Sergei Bondarchuk com Rod Steiger, Christopher Plummer eJack Hawkins.
Todas as falas de Napoleão são de rir. Toscas. Mas a batalha em si é soberba. O filme usou o exército vermelho como figuração nessa produção e o que vemos são milhares de soldados, gente de verdade, naquilo que teria sido a batalha que acabou com o doido general francês. Felizmente essa batalha dura mais que a metade do filme, o que quase o salva. A guerra, como vista em 1814, é uma festa de cores, movimento e gestos em grupo. Mas, claro, ao final o que vemos é sangue, dor e uma fealdade total. O filme é bastante tolo, o Napoleão de Steiger fala como um ator ruim ( Steiger foi um grande ator ).
  A CANÇÃO DO POR DO SOL de Terence Davies
Este é o novo filme desse importante diretor da Inglaterra que não é muito conhecido fora da ilha. Mas, que pena, é uma obra banal. Narra a vida de uma família rural no começo do século XX.
  PAIS E FILHAS de Gabrielle Muccino com Russell Crowe, Amanda Seyfried, Diana Kruger.
Incrivelmente ruim. Chega a parecer brincadeira! Tem o nível das piores novelas mexicanas. Crowe, mais choroso que nunca, é um pai com problemas que tenta manter a guarda de sua filha. Já adolescente, ela cria problemas... Os atores se perdem em cenas inconvincentes, mal escritas, bobas...Um desastre.
  OS SEGREDOS DE CHURCHILL  de Charles Sturridge com Michael Gambon e Romola Garai.
Mais um filme novo sobre gente doente...Sim, vemos Churchill sofrendo de Parkinson. E sua relação com a enfermeira que cuida dele. E é só isso.
  DEMOLIÇÃO de Jean-Marc Vallée com Jake Gyllenhaal e Naomi Watts.
Num acidente de carro um cara bem sucedido perde sua esposa. Ele nada sente, fica apático e passa então a demolir sua vida. Tem atitudes estranhas no trabalho e faz demolição de casas como hobby. Então conhece uma mulher e percebe que jamais amara sua esposa. Mais um filme de Vallée, esse canadense que começou a ser notado com o maravilhoso filme de 2005 Crazy.Este é um bom filme, longe de ser emocionante, mas ok.
  FILMES DE ANDREI TARKOVSKI
Assisti 4 filmes desse original diretor russo. Falecido ainda jovem, em 1986, O ROLO COMPRESSOR E O VIOLINISTA é seu primeiro filme, feito ainda na faculdade de cinema, em 1960. O filme, simples, puro, encantador, fala do relacionamento de um menino de 7 anos e um operário que trabalha no rolo compressor. Lembra os belos filmes de Ozu. A INFÂNCIA DE IVAN, de 1961, seria seu primeiro filme pra valer. Acompanha a vida de um órfão, que cheio de ódio, se torna espião na segunda guerra. Não pense num filme convencional. Tarkovski filma apenas a base onde os soldados estão, um mundo de lama, ruínas, escuridão, árvores, e cenas inesquecíveis. As cenas junto ao poço, o encontro com o velho, a cena final, são momentos que afirmam a beleza desse cinema único. Escrevi sobre STALKER abaixo. Voce carrega o filme dentro de voce depois que ele termina. É para ser revisto. Muito. O ESPELHO, feito em 1974, é talvez o mais difícil. Se Solaris foi o 2001 de Tarkovski, O Espelho é seu Amarcord. Mas é um Amarcord quase incompreensível. Tarkovski recorda cenas de sua infância, mas faz com que elas pareçam um sonho, pesadelo, terror e beleza. Jamais vi cenas tão lindas de ventanias, mudanças de clima, cabanas...De certo modo não é um filme, é um poema em colagem...rasgado.

SONHO

   Minha mãe pendurava roupa e longe um radinho de pilhas transmitia o som de um jogo de futebol. Uma lesma saiu do gramado e cruzou o quintal deixando um rastro de gosma sobre o cimento. Meu pai sopra o alpiste dos canários.
   Um cobra verde está enrolada num vaso de antúrios e espreita a porta da cozinha. Olho  a tela da TV onde um duende transforma um homem em asno. Ele olha seu rosto na lagoa e chora. Toco a tela e a deixo suja de açúcar.
   O vento faz todo o capim dançar e as nuvens assistem minha pipa que luta para escapar. Meu primo faz cola no porão sujo de casa. Água com farinha numa lata. Escrevo linhas nas paredes. A fogueira na noite gelada ergue folhas de seda.
   Voce vai gostar de mim pra sempre. Pergunto. Pra sempre. Ela responde.
   Quando menino a gente olha. Sem tentar ou pensar em entender a gente apenas olha. Essa a pureza. O Eden. As luzes dos postes que voam ao lado do taxi que voa.
   Uma cobra está acuada na rua onde vivo. E eu a solto no mato, livre, viva.
   Ela vem aqui e nós dois passeamos pela rua. Ela quer ver tudo e vai na frente, eu a sigo. Estamos soltos nas esquinas, nas pedras do calçamento, nas casas que olham. Vozes, e cães, e gente, e árvores.
   A vida existe para que a gente crie alma.
   A gente cresce para poder voltar.
  No sol absoluto do meio dia eu e meu irmão vigiamos o matagal. Não deixamos ninguém perturbar a cobra que dorme. Sim, eu fui um tonto e hoje disfarço. Minha inteligência é inútil como é um sonho.
  Se a carne fosse verdade ela não sonhava.

STALKER, FILME DE ANDREI TARKOVSKI

   Stalker é um filme muito, muito chato. E ao mesmo tempo, e o tempo todo, é um filme muito, muito bom. Porque ele cria seu próprio tempo, e nos obriga a entrar nesse tempo, que é outro, diferente do nosso. E ao fim de suas duas horas e meia, que parecem mais de oito, sentimos que valeu à pena, valeu muito à pena.
   Os primeiros dez minutos são os piores. O filme começa num tipo de bar. Um Stalker, que é um guia, vai levar um escritor e um professor para a ZONA. A ZONA é um lugar que surgiu na Terra, um lugar que é agora proibido. O escritor não acredita em nada e quer ir até a zona para tentar reaver sua inspiração. O professor pouco fala. A zona realiza os desejos de quem adentra seu espaço. Isso é o que dizem...
  Passam por uma fábrica abandonada, uma mina e um trilho de trem. O primeiro ponto alto do filme surge aí: a viagem pelo trilho de trem. É uma longa sequência com trilha sonora belíssima ( ao estilo Brian Eno....o filme é de 1979 ). Bela e simples. O filme tem produção pequena e Tarkovski sempre escolhe ângulos de camera originais. Ele monta quadros, corta pouco, esquecemos da sua presença.
  Chegam à entrada da zona. Apenas um bosque banal com alguns postes caídos. O filme, que era feito num tipo de sépia escura se torna colorido. Verde. Muito verde. O Stalker os guia. Não podem voltar. Não podem levar armas. O mais belo momento do filme: água. Cruzam água, adormecem na água, peixes, lixo, pedras. Penso que o filme é uma entrada no inconsciente, Jung, pode ser... Um deles pensa em se matar. Medo. Prosseguem.....  Passam por esgoto, e enfim chegam ao túnel. Outro momento lindo: o escritor anda sozinho no túnel. Silêncio. Chegam enfim à SALA. Um belo espaço com areia. Um cão negro surge do nada. Testemunha os três que entram em conflito. O professor trouxe uma bomba, quer destruir a ZONA. O Stalker é surrado.
  Estão de volta ao bar. Trouxeram o cão preto. Em casa o Stalker sofre. Eles não acreditam mais. Ninguém acredita mais. As pessoas são más. E ele só quer que elas acreditem.
  Esse Stalker, ficamos sabendo no começo do filme, tem uma filha MUTANTE. Ela não tem pernas. E vem a última cena do filme: a filha, sozinha, com o rosto sobre a mesa, sonolenta, faz com que alguns copos caiam no chão, com a força de sua mente.
  Fim.
  Acho que não preciso dizer mais nada...mas digo: Jung, religião e ecologia. Escolha o que este filme é. Para mim ele é os três.

ROGER SCRUTON, FILÓSOFO - O BELO E A CONSOLAÇÃO



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