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GOTTFRIED KELLER E O ROMANTISMO A QUE ESTAMOS FADADOS

   Quanto mais o homem é amassado pelo anonimato, pelo medo ou pelo puro desespero, mais ele tende a reafirmar a presença de seu ego. É simples: se tudo grita a seu redor que voce é um nada, mais e mais voce vai berrar: Eu existo e eu sou Eu.
   Esmagaram toda a história e tudo o que era "homem" no século XVIII. De repente nada era mais o que era certo, tudo virara nada. Que reação poderia nascer a não ser a afirmação desesperada da única coisa que se mantinha " ao lado" ( aparentemente confiável e fiel ), o Ego. Pois veja então....
   Até então a paisagem onde uma criança nascia seria a mesma de sua velhice. E se ele nascia rico, morreria rico, se pobre seria pobre. Ele teria a profissão do pai ou de um tio e se casaria com uma vizinha ou uma prima. Seria batizado, casado e enterrado na mesma igreja. Teria a proteção do mesmo barão e lutaria uma guerra que seria certamente justa. O mundo era conhecido, imutável, confiável e principalmente vivido em grupo. Todos saberiam quem voce era: filho de seu pai.
  A indústria trouxe novos cenários. Fábricas, sujeira, fumaça e a derrubada de bosques. O progresso mudou a vila, o bairro. E seu futuro já não seria o de seu pai. Na fábrica voce não seria filho de ninguém. Voce seria mais um. Estradas, trens, bancos, desemprego, fuga do campo.
  Assustado, o homem precisa se reerguer. Nasce o romantismo. Se voce não é mais filho de seu pai, então será filho de sua nação, da história de seu país, de seu folclore. Seu Ego é seu mundo, e nesse mundo voce cria fantasias. O amor é livre, escolhe e luta, Deus agora é amor, o Amor manda. A vida não é mais algo dado a cada um, ela agora terá de ser conquistada. É imperativo viver e deixar sua marca no mundo.
   Penso que tudo isso sobrevive. Jamais voltaremos ao mundo pré-romantico. Onde nossa vida era do grupo. Assinamos tudo o que fazemos, lutamos para nos afirmar. Somos todos romanticos.
   Gottfried Keller era suiço. Leio duas novelas: O TRAJE FAZ O HOMEM trata de um alfaiate pobre, que por ser belo e bem vestido. vê-se confundido com um conde. A trama segue deliciosa, ele tenta resistir a mentira, mas vai mergulhando fundo e acaba, claro, por se apaixonar.
   A outra novela é ROMEU E JULIETA DO CAMPO, que traz um belo retrato dos camponeses de então. A infelicidade surge entre vizinhos que brigam e a vida de ambos se desfaz em dividas e rancor. Os filhos se apaixonam e fogem. Acabam por ter um destino trágico. No final dessa novela há toda a confirmação do ego romântico. Os dois se amam por uma noite e se deixam afogar, juntos, afirmando assim sua vontade de "eternidade". Se precisam ser conformados a vida familiar, preferem antes morrer.
   Nunca mais alguém se conformaria a ser e ter aquilo que seu pai foi e possuiu. Nunca mais viver seria apenas continuar a "doce rotina" da eternidade. A rotina doce fora corrompida, a inocência se perdera, e como bem sabemos, quando se deixa ir a inocência, nunca mais a reencontramos.
   Aldous Huxley afirma em seu livro " A FILOSOFIA PERENE" que a função sublime da religião é exatamente destruir esse ego, trazer ao ser a conciência de que ele é parte de um todo, de que nada ele pode possuir e que toda posse é dor. Incrível!!!! Com toda sua adoração por magos, bruxas, vampiros, celtas e druidas, os romanticos são dos menos religiosos dos seres. Percebem o mundo como um espelho e ansiam por um amor que é posse egoísta. Alimentam o eu, inflam, sentem pena de si-mesmos, se imaginam como seres hiper-sensiveis e especiais. Deixam de lado toda chance de paz e de serenidade.
   Se nosso mundo é uma ponte ao anonimato, somos todos pequenos romanticos com nossos blogs, nossas bandas de rock e nossos videos bombando. Em meio a bilhões de seres tentamos fazer nosso ego sobressair. Gritamos: Estou aqui ! Sou diferente! Existo!!!!Tenho opinião!
   Huxley e todos os seus santos, gurus e xamãs devem estar com piedade de nós.

EUGÊNIO ONEGUIN- ALEXANDR PUSHKIN ( O MAIS AMADO AUTOR RUSSO )

   Muito mais que Tolstoi, Dostoievski ou Tchekov, russos amam Pushkin. Eugênio Oneguin está para a literatura de lá como o Quixote para a Espanha ou Brás Cubas para o Brasil. É um centro, retrato de alma nacional. Dario Moreira de Castro Alves, tradutor do livro, diz que na Russia, taxistas, professores ou policiais, todos sabem trechos de Eugênio Oneguin na ponta da lingua.
   Pushkin é pouco traduzido. Esta tradução, de 2010, é a primeira para o português de sua obra-prima. Foi saudada com os louvores devidos. Dario foi diplomata. Aposentado, dedica-se a seu grande amor: as letras. Tem trabalhos sobre Eça e Camilo. E esta tradução trabalhosa. Trata-se de um romance em versos. É um romance por descrever ações, por conter personagens que agem no tempo; e é um poema, por ser todo escrito em versos de oito linhas, rimados.
   Pushkin é dos mais românticos dentre os românticos. Seu bisavô foi um negro etíope. Dado de presente a um nobre russo, esse antepassado foi educado e feito militar. O pai de Pushkin é neto desse etíope.
   Há um dito russo que fala que o czar Pedro lançou à Russia o desafio de se fazer moderna. E a Russia respondeu com Pushkin, o primeiro russo moderno. Nascido em 1799, é o poeta um homem da Europa. Cheio de ideais do romantismo, cheio de ansia por viver, e tombado pelo tédio/spleen. Mas ao mesmo tempo é Pushkin um russo. Para vencer esse nada, esse vazio existencial, ele mergulha nas raízes russas, no povo, no folclore, na alma única de seu país. Mais que europeu, um russo sempre.
   Viveu apenas 38 anos, foi morto em duelo. Deixou vários romances puros, sem verso, e este Eugênio.
    Eugênio é um nobre que descobre que a vida lhe é estranha. Tomado pelo tédio, ele ama as mulheres sem se envolver e acaba por tomar a decisão de se recolher. Irá viver só, estudando e observando. Tatiana é uma adolescente simples, mas jamais simplória, que se apaixona por ele. Lhe escreve carta onde se declara e ele lhe responde pessoalmente com frieza. Eugênio lhe explica que com alguém como ele, tão amargo, ela só poderá ser infeliz. Que ele não nasceu para casar-se. O tempo irá passar e ele se verá apaixonado por ela. Mas Tatiana já se casou então, e irá o rejeitar. A vida de Eugênio se resolverá em duelo.
   Como personagem Eugênio Oneguin é apaixonante. Imerso em Byron e Scott, tudo o que ele percebe da vida é sua própria face. Ele pensa apenas em si-mesmo, dialoga com seu coração, preocupa-se com sua vida. Mas não é um egoísta. Na verdade ele abre mão de tudo. Nada retém de seu, nada deseja, e acaba por se derrotar. Pior que isso, o livro mostra que Eugênio é um homem indesejado na sociedade russa. Seus questionamentos perturbam.
   Maravilhosamente romântico, todo o texto exala sensibilidade, consciência temporal, e aquela raiva contida, tão particular aos românticos de todos os tempos. Eugênio ama tanto ao amor que é incapaz de amar uma mulher. É tão ligado à vida que se abstém de viver. Livre, se prende ao seu mundo criado. É belo. É Pushkin.

CATHERINE

Folha, segunda, 20 de julho.
Coluna de Luiz Felipe Pondé. Nome: Catherine.
LEIAM. Leiam e releiam. Ele radiografou minha alma. Meu desejo, meu orgulho, meu mal. Tudo está naquele texto. Existe um espírito que rege uma época. Uma afinidade entre descontentes. Luiz Felipe radiografa esse momento. Me radiografa. Em cheio.
" Não esqueça, caro leitor, que o romântico não é propriamente um idiota nostálgico, o romântico é um sobrevivente, sente-se como uma espécie caçada, um mutante nascido em ambiente hostil. Esse tipo é mais perigoso que você, que ri tranquilo, cercado pela crença boçal de que o mundo seja seu."
"Os melhores entre eles aprenderam a dissimular as lágrimas, mudar de assunto, fazer uma piada inteligente, fechar a porta do quarto. Quem se sabe derrotado desde o início, detém uma forma de poder invisível que o torna perigoso, justamente por não combater pela vitória."
"Resistir é nesta alma sua primeira natureza. Talvez combatam porque esta seja a natureza de quem nasceu num mundo que não é seu ou porque não conheçam outra forma de se comportar num mundo onde não há esperanças para suas almas. Todo cuidado é pouco diante de quem não tem nenhuma expectativa."
"O desencanto do romantismo é uma forma de inteligência sem função. O romântico é uma espécie de contradição insolúvel no progresso definitivo da vida calculada. São caçados como praga. E com razão: são inimigos de uma vida perfeita. Diante deles, babamos como predadores esfomeados."
"O desafio de um romântico é aprender a lidar com suas sensações num mundo onde elas significam nada."
"Ao encontrá-lo devemos ter por ele o respeito que merecem as espécies em extinção."
" A alma romântica habitando um corpo moderno enfrentará o mundo devastado pela arrogãncia idiota dos modernos, pela objetividade morta da ciência, pelo niilismo do dinheiro, pela certeza cética da inutilidade da verdade. Em uma palavra, será uma exilada."
"Todavia, não se engane o leitor que gargalha em seu sofá cercado pela vitória definitiva da arrogância adolescente idiota, da inércia burocrática, da objetividade do dinheiro, do cinismo histriônico e do ceticismo chique. Românticos aprendem a falar a língua do mundo banal. Se o encontrar num desses jantares inteligentes, o confundirá com um pós-moderno cínico. Ele irá rir do amor, defenderá bebês feitos pela indústria farmacêutica, afirmará a vitória do relativismo elegante. Ele manipulará o código da vida devassa. Pois para ele sua vida é a vida de vermes a que ele observa."
Tudo que posso dizer sobre este texto é : BINGO!!!!!!