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O JARDIM DOS FINZI-CONTINI - GIORGIO BASSANI

Lançado em 1962, eis um dos mais tristes livros já escritos. ---------------- Antes falo do filme, que assisti em 1978, na TV, em um sábado de noite. De Sica o dirigiu e deu um destaque à Segunda Guerra, o que no livro não é tão destacado. De qualquer modo, se trata de um filme, feito em 1971, doloroso e de uma beleza inesquecível. Tanto trilha sonora como fotografia são sublimes. Na época ele me deixou comovido, revisto hoje é ainda uma joia da arte de Itália. ---------------------- O livro: O narrador é um jovem judeu que vive em Ferrara, na Itália dos anos que precedem a segunda guerra. Rico, ele conhece Micol, uma milionária judia quando ainda crianças. A princípio ambos mal se falam, mas na época de faculdade se tornam amigos. O que os aproxima é a proibição, pelos fascistas, de que os judeus joguem tênis com cristãos. Assim, vários jovens passam a jogar tênis na casa de Micol. ------------------------ O centro do livro é a casa. Imensa, riquíssima, tão bela como é Micol, os Finzi-Contini fazem parte de um ramo judaico-italiano que foi extinto na guerra. Nobres, muito pálidos, cultos, etéreos, eles advogam a vida no presente e no passado, o futuro não existe. E é por isso que riem das proibições e negam o pergigo até o fim. O romance cessa no momento em que a família Finzi-Contini desaparece. Não se fala dos campos de concentração, não há soldados, o foco é todo no cotidiano que muda lentamente e no amor do narrador ´por Micol. ----------------------- O passado é nosso, o presente só tem valor por se tornar nosso passado, o futuro não existe. Esse o credo de Micol. Esse o modo de viver que levará toda a família à morte. Eles esperam, não fogem. Eles continuam a viver, rindo do ridículo do estado que se intromete em tudo. Eles perdem. Serão eliminados. Meticuloso em suas lembranças, o autor tece o livro como homenagem à Micol e como poesia á um modo de viver desaparecido. ------------------- Micol rejeita o amor do narrador, e então ele quase deixa de frequentar a família. Sempre semi irreal, Micol se vai... O que fica é o passado, a lembrança de uma história feita de modos contidos, beleza sem limite e fé nos bons modos. Eles acreditam que Stalin se unirá à Churchill e De Gaule, e que unidos eles vencerão o fascismo. Se enganam. Stalin trai o Ocidente. ------------------------- Dados pesquisados dizem que hoje, em 2024, o número de judeus na Europa é ainda menor que aquele de 1930. Nisso, o nazismo venceu. A cultura judaica, central em países como Alemanha, Polônia, Hungria e Austria morreu para sempre. E os Finzi-Contini, ramo nobre de uma cultura judaico latina, se foi sem deixar um só descendente. Bassani fez aqui uma homenagem que doi em que lê. Um romance belíssimo!

CIDADE DOS DESILUDIDOS ( FAT CITY ), UM DOS GRANDES FILMES DE JOHN HUSTON.

   Chesterton diz que no inferno o pior sofrimento é a falta de esperança. Huston foi o diretor daqueles que a perderam. Dentre sua imensa variedade de temas, o ponto em comum é esse, ele fala dos desesperançados. Do Falcão Maltês até Os Mortos, esse seu interesse central.
   Este filme, de 1972, começa com uma das mais belas canções de Kris Kristofferson. "Ajude-me a atravessar a Noite", um country tão bonito que Bryan Ferry o regravou em 1974. Enquanto a música ecoa, vemos cenas de Stockton, gente pobre nas ruas, cenário de terceiro mundo. Numa academia, um cara, Stacy Keach, boxeia. Ele se aproxima de um garoto, Jeff Bridges, eles lutam, e o veterano dá ao novato a ideia de se tornar lutador. Até o fim do filme os dois não se verão mais.
  O novato passa a treinar, luta algumas lutas fuleiras, perde, ganha, perde mais. O veterano tenta voltar e é surrado. Além disso ele bebe muito, ganha trocados colhendo cebolas, e mora com uma mulher, Susan Tyrrell. Nunca vi na história do cinema um casal mais lamentável. Ela é chorona, bêbada, feia de dar medo, de uma mediocridade que beira a caricatura. Não sei se Susan Tyrrell tem uma interpretação genial, ou se é tão ruim que se torna sublime. É aterrorizante.
  Huston diz em sua biografia que ele queria Marlon Brando ou Paul Newman para o papel que foi para Keach, ator da moda na época. Huston detestou o trabalho com Keach. Injusto. Ele está ok. Se a gente ficar pensando no que Newman e Brando poderiam ter feito com um papel tão rico...bem, aí seremos injustos com Stacy Keach. Quanto a Jeff Bridges, engraçado pensar que dali a pouco mais de 30 anos ele seria "O Dude". Seu personagem pode ter sido "O Dude" aos 19 anos.
  O filme é hipnotizante. Ele anda com a segurança de um diretor gigante que dessa vez está a fim de filmar. ( 50% dos filmes de John Huston foram feitos só pra pagar dívidas ). E há a cena final:
  Os dois boxeadores se encontram na rua. Vão à um bar. E lá dentro temos uma das mais perfeitas e reveladoras cenas do cinema. Um tipo de cena que só poderia ter sido feita nos anos 70, o auge do pessimismo em filmes. Essa cena eleva o filme, até então ótimo, para o patamar do genial.
  Veja,
  PS: Os coadjuvantes, gente como o dono da academia, o garoto negro lutador...são dignos do melhor neo-realismo italiano. De Sica os adoraria!

SOPHIA LOREN/ BILL MURRAY/ DASSIN/ BORZAGE/ ZINNEMANN/ HENRY KING

   UM FIM DE SEMANA NO HYDE PARK de Roger Michell com Bill Murray, Laura Linney, Samuel West e Olivia Colman
Que filme esquisito!!! Fala de um final de semana em que o rei da Inglaterra vem aos EUA com a rainha a fim de visitar o presidente Roosevelt. O rei deseja convencer os EUA a entrar na guerra. Adendo histórico: até então a politica americana era toda isolacionista. O país pouco ligava para a Europa. É aqui que o mundo muda e a América passa a se envolver com o planeta. O encontro é cômico. Roosevelt os recebe na casa de sua mãe, no campo. A realeza é abrigada em quarto comum e vão a pic nic. Esperteza de Roosevelt, assim a opinião pública americana, que odiava reis e Europeus, passa a ver o rei como "gente". O filme é esquisito por ser um  misto de drama e comédia, poesia e arte. É bonito de ver e tem ótimas atuações. Murray tem aqui seu melhor papel. Faz um presidente humano, simpático e mulherengo. Ele mantém um harém ao seu redor. O ator Samuel West faz o mesmo rei que Firth fez no ótimo Discurso do Rei. West está excelente. Hesitante, assustado, reprimido. Uma das amantes de Roosevelt morreu aos 100 anos e foi só então que encontraram esta história com ela. O filme é contado por seu ponto de vista. Aviso que ele começa meio chato e de repente te pega. Nota 6.
   O ÍDOLO DE CRISTAL de Henry King com Gregory Peck e Deborah Kerr
Uma chatice sobre Scott Fitzgerald e sua namorada Sheila Graham. Peck, que não está mal, bebe e bebe e bebe. Kerr é a amante que tenta o salvar. O filme é flácido, embolado, tolo. Nota 1.
   O CASTELO SINISTRO de George Marshall com Bob Hope e Paulette Goddard
Sátira aos filmes de horror. Tem um belo clima e é agradável. O humor de Hope envelheceu mal, o filme é alegre mas não nos faz rir. Dá pra ver. Nota 5.
   UMA AVENTURA EM PARIS de Jules Dassin com Joan Crawford, John Wayne e Philip Dorn
Assisti a caixa com seis filmes sobre a segunda-guerra. Dois deles são tão ruins que não consegui ver. Portanto não falo deles aqui. Este é bom. Mostra a Paris ocupada. Wayne é um piloto que tenta sair da cidade. Crawford ama um 'traidor". Dassin se tornaria depois um diretor maravilhoso. Aqui ele entrega um filme que se deixa ver. Há um belo suspense ao final. Nota 6.
   TEMPESTADES D'ALMA de Frank Borzage com James Stewart e Margaret Sullavan
Este é quase uma obra-prima. Na Alemanha, no começo do nazismo, vemos uma familia ser destruída. Filhos se tornam nazistas, crêem em Hitler e passam a perseguir amigos e vizinhos. Há um pai que é expulso da faculdade onde dava aula e acaba morto em campo de concentração. Stewart, sempre ótimo, é um vizinho que foge do país. Ele volta para salvar sua namorada. O final é bem triste. É um lindo filme. Borzage foi um dos grandes diretores do começo do cinema falado e do fim do silencioso. Nota 8.
   HORAS DE TORMENTA de Herman Shumlin com Bette Davis e Paul Lukas
Roteiro de Dashiell Hammet baseado em peça de Lillian Hellman. Paul Lukas ganhou um absurdo Oscar de melhor ator, batendo Bogey em Casablanca. O filme se passa na América e fala de refugiados. Lukas é um guerrilheiro anti-fascismo que é chantageado por canalha. O filme tem cena forte em que o canalha é morto a sangue-frio. Mas está longe de ser um grande filme. Nota 5.
   A SÉTIMA CRUZ de Fred Zinnemann com Spencer Tracy
Zinnemann sabia do que falava. Ele acabara de fugir do nazismo quando fez este filme. O futuro de Fred seria brilahnte: Julia, Um Passo Para a Eternidade, Matar ou Morrer... Tracy foge de campo de concentração com companheiros e tenta sobreviver. Todos são pegos e executados, ele não. Um achado do filme é mostrar sua reumanização. Algumas pessoas lhe ajudam e ele vai recuperando a fé nos homens. É um belo filme. Nota 6.
   A CIDADE DOS DESILUDIDOS de Vincente Minelli com Kirk Douglas, Edward G.Robinson, Cyd Charisse e Dahlia Lavi
Kirk é um ex-astro que está em clínica psiquiátrica. Tem alta e volta a ativa, Vai a Roma fazer filme com diretor americano decadente. O filme é tétrico. Todos são fracassados, destrutivos, amargos e vazios. Minelli via que seu tempo passara e faz um tipo de auto-retrato cruel. Estranho porque ele sempre foi um diretor amado pelo sistema que ele cospe em cima. Nota 3.
   JOÃO E MARIA CAÇADORES DE VAMPIROS de Tommy Wirkola com Jeremy Renner
Já esqueci deste filme. É um samba do crioulo doido. Se passa na idade média mas tem metralhadoras e roupas à Matrix. Eles NÂO caçam vampiros, são bruxas! Nota 2.
   SUAVE É A NOITE de Henry King com Jennifer Jones, Jason Robards e Joan Fontaine
Henry King novamente no mundo de Fitzgerald. É o último trabalho deste grande diretor. Robards faz o Dr. Diver que se destrói ao salvar Nicole da loucura. O filme se passa entre os muito ricos, hedonistas, futeis. A tragédia de Diver é lutar contra esse mundo, não aceitar o dinherio de sua esposa muito rica. O filme passa longe do romantismo de Scott, mas tem alguns momentos belos, fortes. Bons atores. Nota 7.
   PENA QUE SEJA UMA CANALHA de Alessandro Blasetti com Sophia Loren, Marcello Mastroianni e Vittorio de Sica
Marcello é um taxista. Sophia uma ladra e Vittorio o pai que rouba malas na estação de trens. Apesar de ser sempre feito de trouxa por Sophia, Marcello não consegue a odiar e cai irremediávelmente em suas artimanhas, sempre. O filme é alegre, leve, bom de ver. Atinge magnificência no trabalho dos atores. Sophia, muito jovem, está linda e atua de modo tão fácil, tão prazeroso que faz com que sua arte pareça a coisa mais simples do mundo. O esforço é o que diferencia o talento do gênio. O talento demonstra esforço, o gênio faz o grande com facilidade, como a brincar. Sophia é genial. Assim como Marcello. Que estupendo bobo é esse taxista! Ele passa todo o filme resmungando contra Sophia, tentando se livrar dela, mas sempre volta, vencido, ingenuo, absurdo. Amamos Mastroianni. E há De Sica, o malandro veterano, playboy, fino e mentiroso. O filme mostra uma Itália onde todos são ladrões e todos são feitos de bobos por uma bela mulher. Verdade? Nota 7.

O LADO BOM DA VIDA/ HITCHCOCK/ SOPHIA LOREN/ REVOLUÇÃO SEXUAL

   O LADO BOM DA VIDA de David O. Russel com Bradley Cooper, Jennifer Lawrence, Robert De Niro, Chris Tucker, Jacki Weaver
Um casal de desajustados anda pelas ruas. Ele tem saudades da ex-esposa. Lentamente esse novo casal, que foi apresentado por amigos, vai se envolvendo. Mas seus problemas emotivos costumam atrapalhar tudo e dar ao filme seus momentos de humor. Poderia esse ser um resumo de Manhattan ou de Annie Hall. Mas infelizmente não é. O filme é este O Lado Bom da Vida. Ele não é ruim. É um filme muito gracinha. Um fofo. Um querido. Mas é ao mesmo tempo profundamente conservador, careta, reaça, antigo. Isento de sexo, de crítica social, de qualquer sinal de ousadia. Por que cobro ousadia deste filme? Porque me irrita essa coisa de se colocar gente pseudo-moderninha, gente com problemas "modernos" em filmes que no fundo são tão comodistas. Transforme o cara num alcoólatra vulgar no lugar de ser um bipolar, e transforme a mocinha numa descasada com roupas comuns e voce terá um filme de Doris Day. Mas dá pra ver algo de ainda pior. É uma comédia sem graça e um drama sem seriedade. E Jennifer Lawrence, por favor!, nada faz de especial, é uma atuação de rotina. A indústria resolveu que ela é a Jennifer da vez e poderá ganhar o Oscar numa atuação tão comum como as que premiaram Gwyneth Paltrow e Reese Witherspoon. O filme é de Mr.Cooper, e nos limites do roteiro pobre, ele se sai bem. Aliás se assistirmos ao filme esquecendo do absurdo de suas 8 indicações ( antigamente 8 indicações era coisa só para filmes excelentes ), poderemos ver um bom filme tipo Sessão da Tarde. Os personagens são simpáticos e torcemos pela mocinha e pelo mocinho. Torcemos mesmo. A gente sente peninha deles. O que nunca aconteceu com os personagens de Woody Allen. A gente pode odiar, mas nunca sente dó de Annie Hall e de Alvin. Escuta gente: a neurose foi extinta? Cooper nada tem de neurótico. Ele nada questiona, nada critica, não vai fundo em nada, nada tem a dizer. Nem chato ele é! Ele apenas sofre com seu TOC e fica nessa coisa de manias e obsessão. Não estou falando que ser neurótico é cool. Apenas digo que cada época tem sua doença e que hoje temos TOC e deprê. Em 1976 era a neurose. Talvez não tenhamos mais neuróticos porque não há bons comprimidos para eles. A neurose é traço da alma, não tem como curar. Não é sintoma, é um caráter. Termino dizendo que cada geração tem seu Annie Hall. Em 1989 foi Harry e Sally e em 2013 é este filme. Ah, ia esquecendo, De Niro faz De Niro de novo. Nota 6.
   HITCHCOCK de Sacha Gervase com Anthony Hopkins, Helen Mirren, Scarlet Johanson, Toni Colette, Jessica Biel e James D'Arcy
Tem uma comovente imitação de Anthony Perkins feita por James D'Arcy. E um belo retrato de Hitch por um Hopkins contido. Como em todo filme que tem sua presença, Helen Mirren engole todo o elenco e domina o filme. Sem forçar. Scarlet imita Janet Leigh. A esposa de Tony Curtis era tão adorável que fazendo Leigh até Scarlet ficou mais humana. O filme é uma delicia. O momento em que a trilha de Bernard Herrman comparece na cena do chuveiro em Psycho é sublime. Um adendo: crianças que começaram a ver filmes agora tendem a não compreender o porque de tanta idolatria por Hitchcock. Ora meus novatos, todos os filmes que voces amam são hitchcockianos! O mestre inglês foi o cara que criou o cinema como "manipulação das emoções do público". Filmes planejados para dar emoções e reações a seu público. Hitch não contava histórias, ele criava sensações. Esse é o cinema, quando bom, de agora. Este filme cria uma sensação: a de testemunharmos a criação de um filme ícone. Nota 8.
   VÍCIOS PRIVADOS, VIRTUDES PÚBLICAS de Miklós Jancsó
Nudez frontal feminina e masculina todo o tempo. Masturbação explícita. Só dois cenários: um jardim e um salão. Um fiapo de história: dois jovens herdeiros resolvem sabotar o reino dopando toda a nobreza e fotografando uma orgia com duques, barões etc. Esse será o estopim da revolução. Jancsó é considerado por alguns o maior diretor do cinema húngaro. Foi famoso nos anos 60/70, e este filme, de 1976, tem a cara da década mais doida, é exagerado, otimista, tolo, brega, sem noção, despudorado, sujo e feio. E chato. Não tem história, não tem emoção, não tem nada. Tudo o que vemos são pênis, seios, muitas bundas, vaginas, e ouvimos risos, risos e mais risos. Hora e meia de uma cena dionisíaca. Seria bom estar lá, assistir cansa. Houve um tempo em que se tinha a certeza de que toda a tristeza do mundo vinha da repressão ao sexo. Liberando o sexo haveria naturalmente uma renascença. Os seres, livres, fariam uma revolução social e implantariam um socialismo libertário no planeta. Todos seriam felizes, sem patrões e com muito sexo. Essa era a fé da década. Daí seu otimismo. Jamais imaginaram que a liberdade sexual seria usada como produto e o gozo como objetivo em si-mesmo. Cães copulam a vontade e nem por isso são mais ou menos revolucionários. A liberdade é coisa muito mais individualista que a geração dos anos 60 queria crer. Não darei nota porque isto não é cinema. É uma tese.
   A BELA MOLEIRA de Mario Camerini com Sophia Loren, Marcello Mastroianni e Vittorio de Sica
Não seria Sophia a maior estrela do cinema mundial ainda viva? Felizmente viva. Ela é tão grande quanto Audrey, Liz Taylor ou Brigitte Bardot. De todas é a mais sensual, carnal, saudável. Uma festa na tela. Aqui, muito jovem e ao lado do sempre brilhante Marcello, ela faz uma camponesa que por ser bonita não padece dos impostos cobrados pelos invasores espanhóis na Nápoles de 1700. Marcello é seu marido, um malandro que começa a sentir ciúmes. É apenas isso, um alegre passatempo sobre a bella e alegre Itália. A direção é bastante tosca, mas os atores nos dão calor e encanto. Vale a pena. Nota 6.
  

ORSON WELLES/ DEPARDIEU/ WISE/ BURTON/ DE SICA/ PETER SELLERS/ ZULU

ZULU de Cy Endfield com Stanley Baker, Michael Caine, Jack Hawkins e Ulla Jacobson
Um grande clássico do cinema inglês, foi votado recentemente um dos top 40 de toda a história do cine britânico. É diferente de tudo aquilo que voce espera. O excelente roteiro narra a história verídica de um grupo de soldados que em 1875 se defende na Africa de ataque de 4000 zulus. A primeira cena ( excelente ) já revela do que trata o filme: vemos uma longa dança ritual zulu. O filme não toma partido, os zulus não são vistos como "bons selvagens", mas tampouco são vilões. Assim como os soldados ingleses, eles são guerreiros humanos. O desenvolvimento dos personagens é perfeito, todos são bem delineados, nenhum é um herói, mas também não existe o anti-herói, têm falhas e qualidades e todos estão transidos de medo. A ação é muito bem feita, o som percussivo dos zulus vindo em crescendo, a violência explodindo de súbito. E o final é um explendor. Em suma, maravilhoso prazer. É um dos primeiros filmes de Caine, é aqui que ele se torna star ( em 64, ano do filme, ele só perdeu em bilheteria britânica para James Bond e A Hard Days Night ). Caine compõe um tenente afetado, fraco, exitante, mas que acaba por fazer o que dele se espera. Stanley Baker, grande estrela da época, é um oficial que luta para ser duro, tenta ser profissional, mas percebe todo o tempo o absurdo daquela matança. Excelente, tem ainda uma fantástica trilha sonora de John Barry, talvez meu compositor de cinema favorito. Nota 9.
A MARCA DA MALDADE de Orson Welles com Orson Welles, Charlton Heston, Janet Leigh, Marlene Dietrich
Um filme de Tarantino feito em 1958. A primeira cena é antológica: um longo plano sem cortes em que Heston anda por rua da fronteira Mexico/EUA em meio a carros, gente e casas. A câmera sobe, desce, corre e caminha e nenhum corte é feito até acontecer uma explosão. O tipo de esbanjamento de talento que foi inventado por Welles. Se Kane é seu filme mais perfeito é este que dá mais prazer ao ser visto. Fala de crime, do confronto entre um velho policial sem ética ( Welles, em atuação de explendor ) e um policial mexicano honesto ( Heston, muito bem ). Tudo no filme é fatalismo, pessimismo, escuro ( a fotografia é maravilhosa ). E tem algumas linhas de diálogo de cinismo cintilante. É um desses filmes cult-chic que fica bem gostar, mas ele merece toda sua fama. Se voce não penetrou no segredo do genial talento de Welles, este talvez comece a mudar sua opinião. Nota 9.
MAMMUTH de Gustave Kervern e Benoit Delepine com Gerard Depardieu e Isabelle Adjani
Minhas Tardes Com Margueritte é o melhor filme em cartaz. Se voce não o viu por ter ido atrás do hype, sinto muito. Lá Depardieu dá um show e pasmem, é um filme atual que trata de gente comum, sem grandes loucuras e doenças mortais. Mas aqui tudo se desacerta. Ele está ok como um aposentado entediado que parte pelas estradas atrás de papéis que provem onde e quanto tempo trabalhou ( problemas de aposentadoria ). Belo tema que poderia lembrar o Schmidt de Alexander Payne com Nicholson ( Payne é um dos muito bons novos diretores que têm pouco hype por não serem "geniais" ). Mas este Mammuth envereda pelo desejo de ser esquisito, diferente, inesperado, e nessa busca tola por arte, ele se faz previsível e pior, enfadonho. Uma pena.... Nota 2.
CORRA QUE A POLICIA VEM AÍ 2 E 1/2 de David Zucker com Leslie Nielsen e Priscilla Presley
Adoro Nielsen!!!!! Ele surge e já abro um sorriso. É daqueles humoristas que apenas por estarem em cena já fazem graça ( Eddie Murphy foi assim há séculos atrás ). Mas esta segunda aventura do hilário policial está longe da naturalidade da primeira. Aqui voce percebe o riso sendo procurado. Mesmo assim tem algumas cenas de humor antológico. Nota 6.
HELENA DE TROIA de Robert Wise com Rossana Podestá, Jack Sernas e Brigitte Bardot
O filme já começa com um erro: no papel de escrava, a muito jovem BB rouba o filme da insignificante Helena/ Podestá. E todo o resto vai nesse ritmo: o Paris feito por Sernas é patético, a guerra de Troia é constrangedoramente ruim e tudo no filme acaba por se parecer com carnaval na Sapucaí. Mistério: como um diretor tão bom como Wise se meteu nessa embrulhada? Nota Zero.
ALEXANDRE, O GRANDE de Robert Rossen com Richard Burton, Frederic March e Claire Bloom
Excelente. Burton, apesar de sua ridicula peruca, dá dignidade a figura de Alexandre. March, como seu pai, Filipe, está ainda melhor, e o filme é visto como um embate edipiano entre pai e filho. Filipe é todo desejo, virilidade, exuberância; e Alexandre, apesar de suas vitórias, é estranhamente fraco, solitário, travado. Rossen, grande diretor, sabe contar sua história. O filme flui. Não existe aqui aquele excesso de luxo hollywoodiano nos cenários "gregos", tudo é simples, claro e natural. Pode ser visto sem medo, ele se sustém, nada é inverossímel. Nota 8.
O FINO DA VIGARICE de Vittorio de Sica com Peter Sellers, Britt Ekland, Victor Mature, Martin Balsam, Maria Grazia Buccella
Uma comédia onde Peter Sellers faz um gatuno italiano só pode ser coisa boa. E é. Sellers foi um gênio e aqui ele dá uma pequena mostra disso. Faz um italiano típico e não parece forçado ou caricato. Faz rir, pelas situações de humor, não por ridicularizar sua interpretação. O filme trata de um roubo de barras de ouro e de um ladrão, The Fox, que deverá transportar esse ouro para dentro da Itália. Para isso, ele se passa por um famoso diretor de cinema "de arte", e usa a população de vilarejo, ávida por fazer cinema, como cúmplices no crime. Mature é um decadente ator americano canastrão ( ele se auto-parodia. Está ótimo ) e temos ainda todos aqueles hilários atores italianos em pequenos papéis. De Sica deixa Sellers atuar, o modo como ele move suas mãos, os olhares à Mastroianni, são aulas de como imitar sem parodiar. Uma comédia de primeira que tem ainda a bela trilha de Burt Bacharach e a linda Britt Ekland, uma atriz suéca do mal ( casou-se com Sellers e destruiu a carreira dele, e depois casou com Rod Stewart e o transformou num playboy. Os dois foram corneados por Britt ). Ah, o roteiro é de Neil Simon. Nota 7.
COLUMBO ( Box com 3 discos ) com Peter Falk, Leslie Nielsen, Lee Grant, Roddy McDowall...
Columbo é um policial feio e mal vestido, que com tranquilidade vai descobrindo seu criminoso. Quando Wim Wenders fez seu maravilhoso ASAS DO DESEJO ele escolheu Peter Falk/Columbo para ser um anjo. Vendo a série entendemos o porque. Columbo se move no crime, mas ele é sempre uma figura calma, plácida, familiar ( apesar do fedorento charuto ), um anjo que não tem uma só cena de violência. O filme começa sempre com o crime. Vemos quem o cometeu e a engenhosidade da execução. O interesse está em saber como Columbo chegará a solução. Ele então, se aproxima lentamente do crime. Toda a força da série está na composição de Falk e nos diálogos. Columbo vai irritando o criminoso, deixando-o confuso, acuado, temeroso. Columbo é obssessivo, racional, teimoso e fica todo o tempo surgindo onde menos se espera. Uma criação inspirada. Nesta caixa, o primeiro episódio tem direção de Steven Spielberg ( é seu primeiro trabalho ). Não darei nota por não ser cinema ( apesar de as imagens, com menos closes do que se usa hoje, serem quase cinematográficas. Cada episódio dura 80 minutos. )

WOODY/ COPPOLLA/ VISCONTI/ YIMOU/ DE SICA/ HAWKS

VOCE VAI CONHECER O HOMEM DOS SEUS SONHOS de Woody Allen com Brolin, Banderas, Watts, Hopkins e Jones
Um dos mais amargos filmes de Woody. O filme serve como um lembrete das diferenças do Allen de 1976 e do Woody de 2010. Antes seus filmes eram centrados em politica, pretensões intelectuais e um saudável hedonismo. Hoje ele fala básicamente de dinheiro, poder e ambição. É como se Woody Allen não se sentisse mais a vontade neste mundo, seus filmes parecem tortos, desconfortáveis e pior, eles têm personagens chatos. Essa chatice é sintoma do não-afeto que Allen sente por eles ( neste filme a única excessão é a divorciada "crente". ) Quando vemos qualquer filme dele pré 1998, há um transbordamento de simpatia por seus personagens, ele ama cada um deles. Vendo este filme tenho a impressão de que Allen os abomina. O filme, mais um fiasco, é completamente desinteressante. Nota 3.
O ESTRANGEIRO de Luchino Visconti com Marcello Mastroianni e Anna Karina
Existem livros que são pegos pelo diretor errado. O Estrangeiro de Camus é um livro soberbo e Visconti é um dos mais cultos e talentosos diretores da história. Mas o estilo dos dois não combina. Camus pede um diretor muito mais seco, distante, frio; Visconti é sensível, exagerado, politico. O filme acaba não sendo nem Camus e nem Visconti. Marcello faz o que pode, mas todo o projeto nasceu errado. Nota 4.
UMBERTO D de Vittorio de Sica
Eis o mais triste filme já feito. Acompanhamos o cotidiano de um velho solitário e pobre. O filme é de uma realidade que beira o insuportável. De Sica inclusive nos mostra um velho nada simpático. Nenhuma cena é feita para chorar, nada é bonitinho ou meloso, o velho, sem casa e sem nenhuma esperança tenta se matar, e nesse momento, em que ele desiste do suicidio ao olhar para seu cão ( que nunca é um cão à Disney ), o filme chega a seu limite: nenhum filme me fez sentir tão triste. Ele é de uma tristeza não-poética, é uma melancolia desagradável, de rua quente, de fome e de solidão absoluta. Vittorio de Sica era além de um gênio, um anjo. O nascimento de um diretor como ele hoje ( e bem que os iranianos tentam ) é impossível. Ele crê no homem, ele ama o homem, ele conhece o que é a vida. Nota DEZ.
HATARI! de Howard Hawks com John Wayne e Elsa Martinelli
Um bando de homens recebe, na Africa, a visita de fotógrafa italiana. E é isso: Hawks filma esses homens bebendo, tomando café, caçando animais para zoos e paquerando a garota. Nada de importante acontece. É o misterioso estilo de Hawks, voce fica vendo o nada e se sentindo bem, como se voce fosse um convidado daqueles caras. Quando o filme termina não há nada para se dizer, mas voce se sente um deles. Hawks era ainda mais despretensioso que Ford, seus filmes parecem fáceis de fazer, parecem uma brincadeira. Ninguém nunca brincou tão bem. Não é a toa que todos os diretores o adoram, quem se interessa pela feitura de um filme sabe como é trabalhoso ser tão fácil. Nota DEZ.
O CLÃ DAS ADAGAS VOADORAS de Zhang Yimou
O diretor se empolgou após o excelente Herói e cometeu este filme frouxo. Trata-se de uma aventura que deveria ser empolgante e comovente, ela é fria e muito mal desenvolvida. O romance não nos importa e as lutas se parecem com ensaios. Pior, notamos que os atores não sabem nada de artes marciais. Uma desilusão. Nota 2.
TETRO de Coppolla com Vincent Gallo
Vendo este filme percebemos o quanto o preto e branco nos dá. A foto em P/B é mais densa, o filme se torna irreal e ao mesmo tempo muito mais urgente. Além do que, é chic! Coppolla não perdeu sua genialidade para enquadrar e criar clima, mas, infelizmente, o roteiro ( dele ) é apenas uma muito longa sessão de auto-expiação. Ele vomita dores, mas o que nos interessa aquilo? Tetro não é um personagem interessante, ele nada tem de brilhante, de original, de cativante. É como ser obrigado a assistir um filme bonito sobre um Fiat 174 qualquer. Todos dizem que Tetro é isso, Tetro é aquilo, mas o que vemos é um chato cheio de auto-piedade. De maravilhoso as cenas de filmes de Michael Powell ( nada hoje é mais in que amar Powell. Com justiça, o homem foi um dos maiores. ) Se servir para alguém sentir desejo de assistir um filme de Michael Powell já valeu. Nota 3.

FINZI-CONTINI/ TATI/ SALLY FIELD/ JORDAN/ WOODSTOCK/ EASTWOOD

NORMA RAE de Martin Ritt com Sally Fields
Sally ganhou seu primeiro Oscar com este filme sobre sindicalismo americano. Ela faz uma caipira, meia saidinha, que vai se conscientizando politicamente, ao conhecer um radical sindicalista "de esquerda". Além da muito carismática atuação de Sally, há um belo roteiro de Ratchett, que não romantiza nada ( não há romance entre os dois ) e nem cria nada de violento ou policial na história. O que vemos é uma tecelagem desumana, e a rotina deplorável de seus empregados. Ritt sempre gostou de fazer filmes com mensagem e este é de seus melhores. Não há panfletagem crua, o que há é bom cinema. Nota 7.
O PEQUENO GRANDE HOMEM de Arthur Penn com Dustin Hoffamn e Faye Dunaway
Dustin, no auge da fama, fez esta sátira ao western. Ele é um velho de 120 anos de idade, que em 1970, recorda sua vida a um jornalista. Este é um "Dança com Lobos" da era hippie. O herói é criado com os índios e se perde entre duas culturas : a branca é vista como hiper violenta e materialista; mas os índios também são bastante tolos. Há uma cena em que o velho chefe se deita para morrer que é hilária ! O filme começa meio sem sal, mas após 30 minutos ele se torna uma divertida comédia ( com algumas cenas cruéis ). Dustin era grande amigo de Penn, recusou convite de Bergman para fazer este filme.... Nota 6.
CAFÉ DA MANHÃ EM PLUTÃO de Neil Jordan com Cillian Murphy, Stephen Rea e Bryan Ferry !!!!!!!!!!
Desconcertante ! Acompanhamos a vida de um adotado menino, menino que se torna menina, que de Patrick se faz Kitten. Tudo para ele/ela é fantasia : ele tenta fazer do mundo uma festa. O acompanhamos na escola, já assumido e depois em sua adolescência/ juventude. Ele se envolve com cantor glitter ( feito por Gavin Friday. O filme vale por sua redescoberta. Procure no youtube clips de sua banda dos 80 : Virgin Prunes. São do cacete ! Glitter/ Punk genial. ) Continuando : vem uma tentativa de assassinato por um velho tarado ( Ferry, breve cena e muito bem ) e envolvimento com a guerra na Irlanda. Com tamanho assunto, o filme é bom ? Não. Irrita a voz do ruim Cillian. Não nos interessamos pelo personagem, não nos convence, e como o filme é com e sobre ele... A trilha sonora é um primor ! Nota 3.
ACONTECEU EM WOODSTOCK de Ang Lee
Fuja !!!!! Fuja correndo ! Um imenso fiasco ! Um anti-Woodstock, um caretésimo filme sobre um jovem tentando sair do armário. Quem se importa ? Com um dos momentos chave do século XX acontecendo ao lado, quem se interessa pela história daquele mala ? O filme chega a ser ofensivo de tão errado. Nota 1.
BLOOD WORK de Clint Eastwood com Clint Eastwood e Jeff Daniels
A história do ex-policial que volta a ativa para tentar descobrir quem matou sua doadora de coração transplantado. Clint sempre fez dois tipos de filme : ambiciosos filmes para novos fãs, e entretenimentos descompromissados para velhos fãs. Sou velho fã, adoro seus filmes mais pop, mais simples. Que belo policial é este !!!! Meio triste, lento, bastante envolvente, delicioso. Clint Eastwood é nosso Hawks e nosso Ford. Viva !!!! Nota 8
TRAFIC de Jacques Tati
Último filme de um muito grande diretor. Tati era cinema puro. Não há closes em seus filmes. Todas as cenas são vistas de longe, ângulo aberto ( em todos seus filmes ). Mal vemos os rostos dos atores, pois o que interessa a Tati são os corpos, as paisagens e principalmente as coisas em movimento. Seus filmes são fenômenos do olhar, suas tomadas lembram fotos de Doisneau ou Bresson. Vemos que cada movimento de cada figurante é milimetricamente ensaiado. Não há um só passo de um só figurante que seja casual. Todo movimento é parte de um mecanismo, e sempre existem vários movimentos coordenados acontecendo. Este filme, inferior ao perfeito "As férias de Mr. Hulot ", é fascinante em suas imagens e tem duas cenas de humor irresistível : a do guarda-chuva e a genial dos limpadores de para-brisa. O filme é crítico em relação ao amor dos homens por seus carros, mas nada tem de amargo. Tati adora as coisas. O que mais me agrada nele é sua falta de respeito pelas palavras. Seus filmes são dialogados, mas o que é dito não tem nenhuma importância. Gestos e atos, eis a vida para ele. Na parte final do filme, passada na Holanda, repare num dos mais belos cenários que já ví. Preservar um lugar como aquele é imperativo ! Já disse Roger Ebbert, assistir Tati não é como ver um "filme"; é como visitar um lugar muito querido. Trafic é lugar de férias agradáveis. Nota 8.
O JARDIM DOS FINZI-CONTINI de Vittorio de Sica com Lino Capolichio, Dominique Sanda, Fabio Testi e Helmut Berger
A profanação do que é nobre... Foi com a primeira guerra mundial que toda a nobreza viveu seu golpe final. E com a segunda ruiu toda a ilusão que o homem ainda podia ter sobre bondade ou dignidade. Este filme mostra acima de tudo a profanação da beleza. A destruição da nobre linhagem dos judeus de Ferrara. ( Uma das idéias mais tolas sobre a guerra é a de que os italianos eram um tipo de fascista-cômico. Há quem pense que judeus italianos não foram executados. Tanto foram que toda uma comunidade de judeus foi exterminada. ) O filme, auto-biográfico, centra-se na família Finzi-Contini, uma família tão rica que se dá ao luxo de jamais sair de casa. Eles nunca se misturam. Seu palácio e seus jardins recebem amigos e dentre eles Giorgio, que se enamorará por Micol, amiga de infância. Ela o repele, mas além dessa dolorida história de amor frustrado, há a história de um cerco que se fecha sobre todos, e mais cenas proustianas sobre tempo e memória e a tolice de judeus otimistas, pensando serem italianos e portanto salvos. Mas a beleza ( o filme é esteticamente primoroso ) do filme está nessa terrível sensação de "extinção" que nos assalta. Vemos o final de algo que nossa geração jamais conheceu : nobreza. Pois o fascismo ( de direita ou esquerda, tanto faz ) traz ao mundo algo novo : a cultura do feio, do estridente, do mínimo denominador comum, do vulgar, do grito e da delação. Nosso mundo afinal... E beleza fria, radiantemente fria nasce em cena após cena, seja pelo belo roteiro baseado em Giorgio Bassani, seja na foto de Ennio Guarnieri ou na bela trilha de Manuel de Sica. Vittorio foi um gentleman. Seus filmes têm o toque leve, porém contundente, de um verdadeiro poeta. Este filme, monumento discreto e simples às coisas belas, é um poema a tudo que termina, coisas que são abandonadas, à profanação. O jardim é pisado por não-convidados, o estrago é para sempre....
Eu tinha 14 anos quando assisti a este filme numa Sessão de Gala de um sábado muito frio. Foi um de meus primeiros contatos com aquilo que o cinema poderia ser. Lembro que chorei. Tanto tempo depois, hoje, tantos filmes mais tarde, o reencontro. Mal recordava sua história, mas percebo, como madalenas proustianas, que certas imagens não foram esquecidas : o sol entre as árvores do jardim, o rosto de Micol e principalmente uma frase, a única, da qual nunca me esquecí : "Eu nunca mais verei este jardim..." Síntese de tragédia sem remédio e símbolo de toda beleza, beleza que é sempre um fim e nunca um começo.
Naquele tempo, Finzi-Contini, assim como HOUVE UMA VEZ UM VERÃO, O MENSAGEIRO, A NOITE AMERICANA e OITO E MEIO, foram os filmes que me fizeram perceber que havia alguma coisa maior na vida, mais brilhante, sem tempo e sem mácula. Um jardim.
Ele continua vivo.

GINGER ROGERS/ROGER RABBIT/WANDA/RIO LOBO/ STEVE MARTIN

En cas de Mal-heur de Autant-Lara com Jean Gabin e B.B.
Que bomba insuportável ! De todas as grandes musas do cinema ( Marlene, Garbo, Rita, Ava, Marilyn, Deneuve, Loren ) ninguém fez piores filmes que Bardot. Foi contra este tipo de lixo que Godard e Truffaut se ergueram. Nota zeroooooooooooooooooooooo!
Vivacious Lady de George Stevens com Ginger Rogers e James Stewart
Agradabilíssima comédia. O tipo de roteiro que Clooney, Reese, Spacey, Hanks, Os Coen, dariam a alma para ter. Passatempo que não te chama de idiota. 7.
The Rocky Horror Show com Tim Curry e Susan Sarandon.
Finalmente assisto o mitico Rocky Horror. Curry tem uma das maiores atuações do cinema. Sua entrada em cena, como o vampiro ultra-glitter-marc bolan-gay é antológica! Se Velvet Goldmine tivesse algum senso de humor ele seria assim. No mais, espero que voces saibam a história deste musical: um fracasso na estréia que se tornou cult, ficando vinte anos em cartaz na mesma sala, onde os fãs assistiam interagindo com a história. Há quem o tenha visto mais de cem vezes. Nota 6.
Um Rei Em NY de John Landis com Eddie Murphy e Arsenio Hall.
No período 73/93 se fizeram toneladas de grandes/excelentes comédias. Esta é uma das melhores. Todos já a viram, todos já gargalharam. Puro prazer e uma atuação histórica de Eddie lembrando o melhor de Alec Guiness. As cenas na barbearia e na igrja são antológicas.
Inesquecível. Nota 9.
Uma cilada para Roger Rabbit de Robert Zemeckis com Bob Hoskins e Christopher Lloyd.
Todos conhecem este filme. Resistiu ao tempo? Sim, resistiu, e é essa o único julgamento válido a qualquer obra de qualquer arte : resistiu ao tempo? nota 7.
Um Peixe Chamado Wanda de Alexander MacKendrick com John Cleese, Kevin Kline, Jamie Lee Curtis e Michael Palin.
Ele começa devagar. E vai crescendo, ficando cada vez mais doido, mais exagerado, atingindo ao final um frenesí de loucura e humor irresponsável. O trabalho de Kline beira a perfeição e todo o elenco brilha estupidamente. nota 8.
Alien de Ridley Scott com Sigourney Weaver, Tom Skerrit e John Hurt.
Segundo filme de Scott. Bela carreira tem esse inglês. No teste do tempo, Alien sobreviveu? Mais ou menos. Não provoca medo ou nojo, pois nos acostumamos a pornografia de visceras e sangue aos borbotões. Mas mantém seu clima claustrofóbico e a elegancia de uma direção enxuta e matemática. nota 7.
Rio Lobo de Howard Hawks com John Wayne.
Último filme de Hawks. É seu pior. Um western comum em que só se destaca a simpatia de Wayne. nota 5.
Longa Jornada Noite Adentro de Sidney Lumet com Kate Hepburn, Ralph Richardson, Jason Robards e Dean Stockwell.
A terrível peça de Eugene O'Neill levada inteira por Lumet. O filme é muito desagradável, árduo´,cruel, sem concessões. Mas há Kate. Mágica. Em minutos ela passa da estrema fragilidade para pura maldade egoísta; de jeito de criança para uma velha anciã. Tudo feito sem qualquer esforço. por ela o filme vale ouro. ( robards também dá seu show de sempre, como o filho alcoólatra ) nota 6.
Star Wars de George Lucas com os dois robots e mais alguns robots de carne e osso.
O filme que inaugurou a total simplificação do cinema ( com Tubarão ). Os atores estão interpretando como se fossem robots, os robots são os astros. O texto chega a ser ridículo e algumas falas com sua pseudo filosofia oriental, beiram o ridiculo. Tudo é infantil, jogado na tela sem qualquer senso de elegancia, ritmo ou psicologia de personagem. Lucas ( péssimo diretor) mal sabe cortar as cenas. Então o porque do sucesso?
Star Wars surge no auge do cinema deprê, intelectualizado, paranóico. Dá ao público a estética infantil da publicidade, o clima de tv e a profundidade das hq. A música de Willians, a foto de Gil Taylor e a batalha final ( uma obra-prima de montagem ) resgatam suas gritantes falhas. Para o bem ou para o mal, este filme antecipa tudo que se fez nos últimos 30 anos. 5.
O Panaca de Carl Reiner com Steve Martin.
A melhor comédia de Martin ( o que não é pouca coisa ). nota 9.
Oliver! de Carol Reed.
Reed é o genial diretor de vários filmes ingleses sobre o sub-mundo londrino, sobre a vida dos pequenos malandros derrotados. O chamaram para dirigir este imenso ( longo, caríssimo ) musical. Venceu quilos de oscars em 68, derrotando o 2001 de Kubrick. Mais uma das papagaiadas do prêmio. Este musical é tudo aquilo que um musical não pode ser : pesado, arrastado, sem simpatia. Mas faz cair o queixo sua cenografia: john Box ganhou o único oscar justo com seus imensos cenários. Uma maravilhosa Londres vitoriana, cheia de córregos, pontes, vielas, barracos e centenas de figurantes. O tipo de cenário que hoje seria inviável. Fariam tudo digitalmente, barateando os custos e frustrando sensibilidades mais afinadas. É o cenário que Tim Burton não pode fazer em seu último filme. nota 4.
A Roda da Fortuna de Joel e Ethan Coen com Tim Robbins, Paul Newman e Jennifer Jason Leigh.
Chatíssimo filme. Os Coen quando tentem fazer algo profundo sempre se tornam chatos. Perdem a leveza e o humor se torna óbvio. nota 2.
A Culpa é dos Pais de Vittorio de Sica.
Vittorio entendeu o que os homens são. Ninguém no cinema conseguiu como ele, mostrar a dor sem culpados, a injustiça sem vilões, como fazemos o mal sem perceber e como sofremos sem poder evitar a dor. Seus filmes são peças de música, poemas de água e fogo, encadeamentos lógicos e simples daquilo que a vida sempre é e sempre será.
Este é seu primeiro grande filme. Uma criança perdida entre seus pais. A total incomunicabilidade que existe entre o adulto e a criança ( mesmo que o adulto a ame, ela sempre será INACESSÍVEL). O filme dói, o filme exalta, faz recordar e é absolutamente delicioso. Mostra como ser criança é dificil, como ser pai é errar sempre, como amar é em vão, como a solidão é constante. Um filme de hoje e de amanhã, o sonho de Salles, Meirelles, Almodovar iranianos e chineses. Só não leva dez por ser modesto, um ensaio para as quatro obras-primas absolutas que Vittorio faria em seguida. nota 9.



paul auster e 4 filmes

Em seu novo livro ( Paul Auster é um autor que eu simpatizo, quero gostar mas não consigo. Eu o acho brigado com a vida, pouco criativo, quase enfadonho ); mas como eu ia dizendo, no seu livro ele tem uma bela sacada: Grandes filmes dão vida a objetos. E para provar isso ele cita 4 filmes ( que são seus favoritos e dos quais um está entre meus favoritos ).
Ladrões de Bicicleta, A Regra do Jogo, Apu e Contos de Tokyo.
No filme de De Sica, ele descreve magnificamente o início da fita. A esposa carregando dois estafantes baldes de água. O marido pega apenas um. Depois a esposa leva os lençóis da família para o prego. A câmera se afasta e vemos centenas de lençóis no prego. A relação do casal e a situação de Roma no pós-guerra mostradas por objetos mudos.
Na obra de Renoir, os pratos sujos abandonados sobre a mesa, evocando a solidão da amante abandonada.
Em Satijad Ray, a troca de cortinas no quarto do casal e o grampo de cabelo acariciado pelo noivo, como provas de um casal que se ama.
E no poema fílmico de Ozu, todo o filme é uma ode aos objetos, ao silêncio e ao fato de que numa família não existem culpados, sómente vítimas.
Quatro grandes filmes, que como Auster diz, aproximam o cinema da literatura, dos contos de Tolstoi ou da grandeza de Stendhal.

howard

howard hawks, diretor dos diretores

Ao citar meus diretores favoritos, deixei de fora 3 nomes que são dos mais perfeitos artistas que já filmaram.
Howard Hawks é considerado o diretor mais admirado por outros diretores.
Qual a razão ?
Pelo fato de que ele tira filosofia ( simples e prática ) de um nada de história.
Seus roteiros são sempre simples, falam sempre da luta do homem contra seu destino; mas suas obras não têm nenhum enfeite, nada de supérfluo.
Hawks conta uma história.
E numa era de complicações gratuitas, efeitos bolo-de-noiva e pseudo-filosofices para pseudo-intelectuais, a arte de Hawks se tornou rara e necessária.
Em tempo:
Apesar de sempre fazer parte do time classe A e de fazer muito sucesso popular, ele só foi indicado ao Oscar uma vez. E perdeu.
Em 1974 recebeu um prêmio especial, sendo ovacionado de pé ( num tempo em que isso era muito raro ).

Quero falar também de VITTÓRIO DE SICA.
Ele criou o verdadeiro neo-realismo.
Voce sabe o que é neo-realismo?
É aquele cinema que mostra a miséria, a dor e a coragem verdadeira da vida.
Entre 1944 e 1952, ele ganhou dois Oscars de filme estrangeiro ( uma histórinha pra voce: o prêmio de filme estrangeiro foi criado para de Sica. Seu impacto foi tão grande, ele mudou o cinema de uma forma tão devastadora, que os americanos precisavam premiar tal revolução. Para tanto, criaram o Oscar de filme com língua não-inglesa, e deram o prêmio para Ladrões de Bicicletas ).
VÍTIMAS DA TORMENTA conta a história de dois meninos de rua. Eles são recolhidos para uma espécie de Febem.
LADRÕES DE BICICLETAS. Um desempregado anda por Roma com seu filho. Ele consegue um emprego de afixador de cartazes. Para tanto, precisa de uma bicicleta. Ele a consegue. Ela é roubada. Ele tenta roubar outra. È pego no flagra. Leva uma surra dos populares na frente do filho.
MILAGRE EM MILÃO. Um órfão ingênuo. Ele cresce e se torna um tipo de bobo-alegre. Mas ele faz milagres. Transforma favelados em donos de casacos de peles e de limusines. Os favelados se voltam uns contra os outros.
UMBERTO D. Um velho professor é despejado. Não tem onde morar. È um velho desagradável e antipático. Tenta se matar. Resolve continuar vivo.
Pois é isso.
Todos esses filmes não têm nenhum ator profissional. Não usam qualquer tipo de cenário. E jamais apelam ao melodrama.
Todos fazem chorar. Todos despertam a fé no poder da arte.
De Sica era um nobre. Um poeta. Alguém para se reverenciar.
Para encerrar, uma historinha:
Pauline Kael ( a maior escritora-crítica de cinema da história. Foi ela quem abriu os olhos dos americanos para Coppolla, Scorsese etc ), disse que saía de uma sessão onde foi exibido VÍTIMAS DA TORMENTA.
Ela estava devastada. Chorava sem poder parar.
Ao lado, no lobby, ela ouviu uma mocinha comentar:
-Não ví nada de especial nesse filme!
Kael diz que sua raiva atingiu níveis estratosféricos!
Se um ser-humano pode ser indiferente a tal obra de tal poder, é sinal de que muitas pessoas começam a se tornar algo de muito insignificante. Alguma coisa muito pobre, vulgar, previsível.
Já passei por experiência como a de Miss Kael.
Minha reação foi virulenta.
Não amar De Sica é não saber o que significa ser humano. É ignorar a coisa gigantesca que um homem pode ser. È se tornar um idiota-imbecil. Um boneco de vento e de ruído. Uma besta quadrada.

JEAN COCTEAU
Jean foi poeta, pintor, costureiro, cenógrafo de teatro, ator, músico e diretor de cinema.
Em todos esses campos, fez parte do time A.
Seus filmes são uma homenagem a quem os assiste.
Mágicos, maravilhosamente simbólicos, belíssimos.
Eles são uma festa para pessoas com alguma cultura.
Um delírio visual e um discurso de poesia musical.
Afetados e metidos, sim.
Mas são bonitos pra caramba!!!!

ESQUECÍ DE CITAR
a belíssima ( chega doer a vista de tão bela ) VIVEN LEIGH ( que foi casada com Olivier. os dois foram terrivelmente infelizes juntos. ela era louca por sexo, ele era totalmente indiferente.) a terrível BETTE DAVIS ( a mulher que enfrentou o poder dos chefões. ela era melhor que Kate, mais atriz, mais concentrada ), GENE TIERNEY (provavelmente a mulher mais bonita que já surgiu numa tela. era esquizo ), CATE BLANCHETT ( a melhor da geração pós-Jodie Foster ).

E DIRTY HARRY ERA UM HOMEM VINHO.
QUEM DIRIA?

O MELHOR CLIP DA HISTÓRIA ?
Preto e branco precário.
Um galpão.
Ike Turner ( sim, ele, o odioso Ike ), toca violão sentado num banquinho.
A câmera não pára de se mover. Vai de Ike para as paredes, para o teto, para o chão, e para a jovem Tina Turner.
Ela entra de mini. Está com 25 anos. Ela se chacoalha inteira. Ela é uma mulata do Salgueiro, uma escrava da Geórgia, uma Lady de Orleans.
As Ikettes, 3 doidas de perucas imensas, entram no foco se sacudindo, berrando, suando, sexualizando tudo.
Ike está extra-cool. Indiferente a tudo.
Tina grita RIVER DEEP MOUNTAIN HIGH
E eu, 42 anos mais tarde, me emociono muito.
ENTENDEU O QUE SIGNIFICA ARTE, MENINO?

PARAÍSO É UM DISCO COM OS SIGLES PRODUZIDOS POR SPECTOR
River Deep é dele.
Phil Spector.
O garoto-produtor-gênio.
O cara que mandou no pop entre 62/66.
O cara que colocava 80 instrumentos no estúdio e gravava tudo junto.
Em River Deep, posso identificar violinois, castanholas, xilofone, sax, bumbo. acordeon. marimbas, bongôs, guitarra, violão, piano, órgão de igreja, trompete, flautas, apitos, chocalhos, pandeiros, violas.
Phil pirou em 67.
Tinha apenas 24 anos.