Abba - SOS



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Baby I love you • Original • Andy Kim • 1969



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David Bowie - Breaking Glass (Extended Version)



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TIMBRES E AMBIENTES SONOROS

   Como Brian Eno diz, o que há de melhor no Pop, no Rock ou nas vertentes black, é o timbre, o tom original que se pode tirar de cada instrumento. A riqueza possível em cada gravação, no trabalho de produtor, engenheiro de som e músicos. Aponto mais quatro exemplos que marcaram muito meu gosto musical.
   Baby, I Love You - Andy Kim.
Produção de Phil Spector com todas as marcas do louco produtor: A união de montes de instrumentos tocando juntos como se fossem um só. Aqui estão guitarras, flautas, trombones, órgãos, pianos, baterias, xilofones, chocalhos, e mais um coro de vinte vozes. A canção começa com uma batida na caixa que logo abre espaço para a massa sonora que desaba como um trem em andamento. O som avança, grosso, forte, impetuoso, e a grande surpresa é: ela consegue ser intimista mesmo com tanto som. É um trabalho de time: Spector, Jeff Barry e Jack Nitzsche. Histórico.
   SOS - Abba.
As lições de Spector e de Brian Wilson renascem nos anos 70 neste grupo sueco de imenso sucesso. O estilo é o mesmo: massa sonora unida em acordes grudentos que se espalham como toques de tinta em tela pequena. Curto, grosso e absolutamente perfeito. Tenha calma e repare: as linhas de piano e de synth são sinuosas, simples, claras e irresistíveis. E as guitarras e bateria surgem como percussão, marcam ritmo e marcam evolução musical. Por cima de tudo, os vocais. A menina triste em solo, o coro dando apoio à dor e erguendo a canção. Agnetha é uma voz como nenhum outra, sua tristeza é sempre a nossa. 3 minutos que mudam uma vida.
   Breaking the glass - David Bowie
Tudo já foi dito sobre as gravações de Low. Desde o som da caixa, gravada à parte por Conny Plank, até os sons alienados dos teclados de Eno ( tive a honra de ver a maleta-teclado, o synth usado nas gravações de Low em exposição no BR em 2015 ). O baixo de George Murray parece feito de chicotes de aço. E há o timbre da voz de David: uivos de um coiote perdido em Berlin.
   Stray Cat Blues - Rolling Stones.
Durante décadas foi meu timbre fetiche. Como se conseguiu um som tão metálico neste disco absurdo? Ouça os primeiros acordes: A guitarra de Keith é de lata, uma lata amassada e enferrujada que corta nossos ouvidos. A voz de Mick é afogada em ruído ácido e a bateria tem o timbre de latões de lixo. E no refrão: um kaos de magnífico ruído, a guitarra como vidro caindo sobre rochas. No final, swing, sexo, sangue. Jimmy Miller produziu.

Lou Reed - Vicious



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10cc - I'm not in love (complete version) (video/audio edited & restored...



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Steely Dan - Hey Nineteen (1981) HQ



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Spencer Davis Group - 'Gimme Some Lovin' Stereo Music Video



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TIMBRES, AMBIENTAÇÕES, CLIMAS.

   Conversava eu com um amigo quando foi citada a célebre frase de Brian Eno: "A música POP não deve ser valorizada por melodia ou harmonia, nisso a música erudita é muito melhor; mas sim pela originalidade de seus timbres."
   Como prometido, faço aqui uma breve explanação de algumas canções que me marcaram e me marcam por seus timbres.
   ( Antes um adendo: A música pop do século XXI tem tido uma uniformidade de timbres irritante. Parece que todos os estúdios e todos os produtores usam os mesmos equipamentos e as mesmas técnicas...Aliás, não parece, é fato ).
   The Spencer Davies Group - gimme some lovin.
Não tem como não falar dessa faixa de 1966. Mais que tudo, o grande gênio deste som é Jimmy Miller. Ele quem produziu esta canção que esbanja ambientação. Podemos ver o local onde os músicos estão. Há uma abundância de vozes, de sons de percussão e um órgão que soa como faca. É um marco da gravação elétrica. Feche os olhos e enxergue os caras tocando.
   Steely Dan - hey nineteen.
O Steely Dan usa em cada faixa de seus LPs formações diferentes de músicos. Como num menu, Fagen e Brecker escolhem o som que cada músico pode dar. O som de hey 19, faixa de 1980, gravada em LA, 38 canais, usa os músicos de estúdio mais foda que o dólar podia comprar. Mas acima de tudo ela é elegante. Começa com aqueles acordes de guitarra e se espalha em um dos melhores sons de bateria já gravados. A música é quase nua, usa o silêncio e os backing vocals são dos céus. Todos os timbres são fortes em presença e ao mesmo tempo discretos, por isso elegantes. Uma aula de bom gosto.
   10CC - i'm not in love.
É uma das canções mais importantes do pop de todos os tempos. Levou cinco meses para ser gravada. O quarteto, gente que produziu Yardbirds entre outros, perfeccionista ao extremo, faz uma canção maravilhosa usando apenas vozes como melodia. Essas vozes, apenas duas, são multiplicadas ao infinito. De fundo, um piano elétrico delicado e um baixo que parece tocado por um anjo. Eno fala de ambientação, estamos no Eden aqui. O momento em que a melodia cessa e depois retorna é assombroso. O final sempre me faz pensar que a música pop foi criada para um dia dar luz a esta canção perfeita.
   Lou Reed - Vicious.
Mick Ronson e Ken Scott são os responsáveis por este rock de um timbre nunca mais igualado ( ok, David Essex tem um disco com som parecido ). A guitarra de Mick é aquosa, plástica, suave; enquanto a bateria rebombeia ao redor do som. É preciso criar novas palavras para falar de som tão novo. Repare como a voz de Lou, "machona", noturna, detonada e sábia, faz contraste com o som da instrumentação de Ronson. O solo é tão maravilhoso que seria digno do melhor de Jeff Beck. Voce pode ouvir isto 300 vezes. Nunca vai enjoar.
    ( amanhã tem mais )

O DOCE FIDALGO, ESSE SER TÃO ESQUECIDO...

   Em tempos de Neymar, nada melhor que lembrar da figura do fidalgo. Tipo de homem que na Itália recebeu o nome de "cortesano" e na Inglaterra de "noble man". Esse termo começou a se popularizar por volta de 1520, e popularizar é modo de falar: a literatura cortesã é a mais aristocrática de todas. Se voce quer ler aquilo que um verdadeiro aristocrata leria, o século XVI é seu século.
  Antes, em plena idade média, a literatura e as artes variavam entre o popular ( aquilo que nasce das tradições das ruas, das festas ) e a igreja. O povo era religioso, mas a igreja, dentro de suas catedrais e seus mosteiros, não. Daí viria o nascimento das universidades, todas religiosas, e depois das nações, todas começando em um centro universitário. ( ´Portugal não. Nasce antes de todas as outras nações. Portugal, a mais antiga nação europeia, começa no século XII. A consciência de ser francês ou ser inglês só nasce cem anos mais tarde ). Voltemos então ao fidalgo...
  Quando a imprensa é inventada, a Europa é inundada por Bíblias. E por livros de cavalaria. No centro de tudo isso, dessa revolução mental e espiritual, nasce a figura do fidalgo, do cortesão. Uma literatura voltada para o aristocrata. Uma literatura contrária ao comerciante, ao padre e ao artesão.
  Já naquela época, principalmente na Itália, pessoas mais atentas percebiam que o mundo era do dinheiro, e que o dinheiro era do banqueiro, do comerciante e do navegador. A igreja precisava se aliar ao dinheiro e os reis eram financiados pelo capital. A nobreza, antes símbolo do poder e donos do destino, foram jogados de lado. Se transformaram em testa de ferro da burguesia ou em adereços de desfiles cívicos. Nasce então a literatura que sonha em manter a aristocracia viva. Que já percebe o começo do fim de uma época.
  Pense bem. Se o mundo de Deus é dos padres e o mundo da matéria é dos burgueses, o que resta ao aristocrata? A história. O passado. O mundo dos sentimentos puros. O mundo platônico. Mas, como viver e agir dentro desse mundo imaterial? Sendo um homem imaterial. Viver dentro do universo dos símbolos.
  Garcilaso de La Vega é um aristocrata exemplar na mais aristocrática das nações, a Espanha de 1550. Nobre, rico, mas sabendo que a fartura minguava, De La Vega é poeta, é soldado, é amante, é viajante, e morre jovem, aos 32, no campo de batalha. Como ele, muitos nobres de Portugal, França, Itália, têm esse mesmo ideal de vida. Viver pelo e para o Amor.
  Em Garcilaso só se fala do amor. Em todo lugar, em todo canto, em toda mulher, é o Amor quem surge. O universo existe pelo Amor e por ele se morre. A obra e a vida de um fidalgo é refinada, filtrada, pelo Amor. Um fidalgo existe como ser que ama, todo o tempo. Ele acorda e se prepara para o Amor. Ele se exercita para a luta em defesa do Amor. Suspira por Amor e morre em nome dele. Todas as regras de vestuário, de etiqueta à mesa, de conversação, são criadas para ser um amante vinte e quatro horas por dia. O fidalgo se comporta entre homens, seja numa caçada, seja numa guerra, como se na presença da Amada, sempre. Esse o nascimento do homem nobre, tão ridicularizado a partir do iluminismo. E tão grotescamente exagerado na França de Luis XV e XVI. Como tudo que é humano, portanto imperfeito, o fidalgo com o passar das eras foi sendo facilitado. Tudo o que era mais difícil foi esquecido e o menos penoso, ressaltado. O nobre se torna apenas uma máscara. O espírito da coisa desaparece.
  Mas em 1550 está vivo. E ainda se deve não só ser elegante, mas também lutar, defender, arriscar, se sacrificar. E saber conversar, fazer rir e escrever sobre o Amor.
  De certo modo a fidalguia destruiu Espanha e Portugal. A casta dirigente se encantou e se platonizou. Nada de mundo real, apenas cartas de amor e batalhas perdidas.
  PS: Todo adolescente é aristocrata em algum momento da vida. Nem que seja só por seis meses. Os mais infelizes carregam isso para toda a vida. Mas é uma aristocracia sem elegância, claro, e sem batalhas para vencer ou perder. Uma aristocracia hiper platonizada.
  PS2: Nobres davam regras sobre etiqueta e gosto para a burguesia que os invejava. No mundo virtual, todos nos comportamos como nobres. Não admitimos que nos ensinem, queremos ditar. Sabemos tudo e ansiamos por uma corte de seguidores. Cada post é um ato de sedução. Mas NUNCA EM NOME DO AMOR. EM NOME APENAS DO ORGULHO.
  Pense nisso.

Noel Coward's This Happy Breed - great preview



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THIS HAPPY BREED - DAVID LEAN ( CONSTELAÇÃO FAMILIAR ).

   Infeliz o povo que não consegue mais fazer filmes como este. Pior ainda, infeliz o povo que não vê mais sentido em histórias como esta. Do que trata, e por que "constelações familiares" ?
   Primeira cena do filme: Um jovem casal está de mudança para uma casa simples. É uma daquelas casas inglesas de tijolo marrom, uma fila sem fim de casas iguais: uma sala e uma cozinha; em cima, dois quartos, mais um jardinzinho nos fundos. A mudança é feita eles arrumam e limpam tudo, a casa é bem suja. Um filho e duas filhas, são os Gibbons e a história começa nos anos 20. A Inglaterra se encontra tomada por greves e desemprego.
  Um vizinho faz amizade com eles. Começam os namoros. Casamentos, vinte anos serão exibidos em duas horas de filme. Eles passam pela Segunda Guerra, passam pela morte de um membro da família, e depois de mais um. Uma filha foge de casa, e depois, muito depois retorna. E tudo é regado a chá, muito chá, dor contida, piadas, whisky, mais chá e o jardim do pai. E é aí que desejo chegar:
  Um namorado da filha é um jovem socialista anarquista, do tipo que havia aos montes nas ilhas dos anos 30. Numa discussão com o pai dos Gibbons, ele diz que "o mundo precisa mudar já!" O pai, cuidando das rosas, diz que "a Inglaterra ama jardinagem...e por isso somos do jeito que somos...temos paciência porque sabemos que as coisas têm um tempo para crescer, florir e morrer...quero que o mundo seja melhor...mas sei que a vida não é diferente deste jardim..." Robert Newton é o ator que diz esta frase simples, e muito do seu encanto se deve ao charme desse ator inglês. Talvez voce então já tenha notado o que desejo dizer... O filme, de uma forma discreta, leve e grave, sem apelos, mostra despudoradamente o VALOR SUPREMO DE UMA FAMÍLIA. O que vemos diante de nossos olhos, cheios de maravilhamento, é a mais simples, a mais banal das histórias: vinte anos na vida de uma família absolutamente comum. Nem ricos nem pobres, nem felizes, nem infelizes, sem bandidos ou santos. Banais, banais como todo pai é, banais como toda mãe é.
  Steven Spielberg gosta de dizer que David Lean nunca fez um filme menos que bom. Discordo. Ele tem um filme chato ( A Filha de Ryan ) e cinco obras primas. Este é talvez seu maior e melhor filme. E é o mais simples e modesto. This Happy Breed se tornou nos anos 2000 um clássico tão cult como Coronel Blimp, de Powell. São amados com carinho e com respeito.
  Voce tem de ver este filme. Para entender a IMPORTÂNCIA DE SUA VIDA. A dignidade da vida comum. A beleza do chá banal de toda hora. O pai modela toda a moralidade daquela família. E a mãe dá à todos a força física de uma presença real. O filme, feito em 1949, é retrato perfeito e doloroso de um mundo que morria após a guerra. Um mundo do qual sentimos falta. Não criamos ainda um melhor para colocar no vazio deixado.
  Não veja este filme esperando moral ou beleza fácil. A vida dos Gibbons é árida. Espere dele uma lição. Uma aula. Uma chamada à ação.
  Um dos mais belos filmes já feitos. E o mais comum entre os grandes.