Chic - Good Times (Tilt 1979)



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NÓS ERRAMOS E PEÇO PERDÃO ( OUTRA VEZ )

  Imagine um cara que em 1977 está ouvindo Lynyrd Skynyrd. E também Led Zeppelin, The Who e Eagles. Então ele vê na TV um negro de um metro e noventa descendo uma escada. Esse negro está maquiado, tem um leque e se move como uma bicha. Que reação esse cara vai ter...Pior de tudo: esse gay canta as alegrias do amor físico. ALEGRIA.
  Cena dois. Uma garota é, em 1976, louca por Peter Frampton, Paul MacCartney...então ela vê uma mulher, desajeitada, rebolando como uma prostituta das mais baratas. Ela pede mais sexo, more more more, e pela primeira vez essa menina do rock vê uma puta barata na TV.
  Mais uma cena. Dois irmãos do Brasil, que ouvem Stones, Rod e Purple, acham cômico uma música besta que fala de macho man. Mas ao ver o clip num domingo de noite se sentem estranhos...tem uns caras rebolando, um bigodudo vestido de couro preto, um índio meio pelado...que é isso!
  Pela primeira vez na história do POP ( se a gente ignorar o jazz, pois o jazz nunca foi POP ), a música do bordel se tornou mainstream. Sim, porque o que mais nos incomodava na disco era o fato de seu amadorismo e seu sexo barato, muito barato. E feliz. No rock sexo é sempre dor, ansiedade ou desafio. Na disco ele era uma noite no puteiro. E esse local tinha além de suas meninas desajeitadas, bichas, muitas bichas alegres e sem vergonha.
  Como reagiu o mainstream, eu incluído...COM ÓDIO! Um ódio que voce, que tem hoje 30 anos, não pode nem imaginar... tanto ódio que os fãs chegaram a juntar 3 toneladas de discos de disco e os destruir dentro de um estádio de beisebol. Mas esse ódio era do que...
  Alegria, latinos, negros, gays, todos felizes e se exibindo...isso não pode!!!! E a acusação foi aquela de sempre, ISSO NÃO É MÚSICA! Claro, não se podia assumir o preconceito de raça e de sexo...
  É música sim! Os caras cantavam e tocavam muito bem e os arranjos, alguns, são coisa de gênio. Longos arranjos de violinos, de baixo e de percussão. Lindo!
  Madonna e Prince, espertamente, pegaram tudo da disco, deram um banho de loja e o deixaram aceitável para muitos dos ex raivosos. Mas nos anos 80 já havia algo de neurótico na coisa, a AIDS, a repetição de algo que fora espontâneo, alguma coisa parecia fake em 1986. Hoje, 2017, Beyoncé e que tais continuam a repetir a festa. Mas quanto mais o luxo aumenta menos feliz ele parece.
  Em 1976 os loucos tomaram os negócios. Raivosos e idealistas tomaram via PUNK. Deslumbrados e festeiros via DISCO. Foram quatro anos fantásticos! ( Hoje os loucos tomam as rédeas em casa, e isso não causa nada de novo ).
  E eu, em 1978, ouvindo Kiss, Aerosmith, perdi a festa...
  ( Mentira! Eu ouvia disco e ia à Banana Power escondido... ).

Sylvester - You Make Me Feel (Mighty Real) - 1978 (By Lázaro)



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Andrea True Connection - More,more,more (Musikladen Live Performance) Or...



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O PRAZER DE PENSAR - THEODORE DALRYMPLE. UM PRAZER EM FORMA DE LIVRO.

   Meu primeiro livro deste autor. Na verdade seu nome é Anthony Daniels e nasceu em 1949, Londres. É médico psiquiatra. Trabalhou e trabalha em clínicas. Mas esse nem de longe é o assunto do livro.
   Dalrymple, que esteve aqui no Brasil e foi atração do Roda Viva, proseia solto tendo por fio condutor sua biblioteca. Ele se assume como acumulador. Tem milhares de livros, comprados pelo mundo afora ( ele viaja muito, com preferência pela Africa e América do Sul ). Livros muito raros, livros de sebos, livros rabiscados, assinados, sujos. Ele dá a mais bela explicação do porque um livro ser insubstituível. Kindles e outras ferramentas são apenas isso, ferramentas. Máquinas que executam um trabalho. Ele também descreve o porque do prazer estar ausente no ato de se encontrar um livro raro na internet. O prazer da busca, da averiguação, da caça e do encontro. O prazer de se encontrar um livro tão desejado quando já quase se desistia. ( Tive essa experiência 3 vezes e estranhamente sempre no mesmo sebo. Fiquei anos procurando esses livros e os encontrei entre pilhas de livros ruins, em momentos diferentes, nesse sebo que não existe mais ).
  Dalrymple fala então em cada curto capítulo de um tema. Por exemplo, ele fala de um livro sobre enforcamentos ( seus livros são assim, temas os mais inusitados ). E descobre que a Inglaterra tinha um amor infinito por crimes hediondos. E que a decadência do país começa quando os crimes perdem sua atração por se tornarem vulgares. Inexiste mais o grande crime, o grande bandido, a grande história macabra. E a velha Inglaterra amava isso. Como amava venenos, forcas, cemitérios e maldições. Tudo isso se foi. A Inglaterra, mais que a França, segundo ele, perdeu completamente seu caráter.
  Há mais nesta fascinante conversa. Ele fala da pior, a mais cruel guerra da história, a do Paraguai. Ele esteve em Assuncion. Foi a guerra em que 75% da população masculina de um país foi morta. Em 4 anos. Diz que a culpa foi toda do ditador paraguaio, o homem que queria ser o Napoleão do sul. Então vem um tema maravilhoso. Dalrymple discorre sobre os ditadores daqui e da África dos anos 70. Puro horror. E dá o diagnóstico, simples e brilhante, dos intelectuais que apoiavam esses ditadores. Ressentimento é a palavra básica.
  Doenças tropicais, cemitérios, outros colecionadores de livros, o por que dos jovens não irem a sebos, o fim da cultura do livro, Dalrymple vai lembrando de volumes que caçou, que encontrou, que leu. Livros sobre a asma, sobre vacinas, sobre gado, sobre livros. Fala de canetas, de cabelo, de tintura. E  tem boas sacadas, ou não. Pois o principal neste livro é sua falta de pedantismo, de ambição. Aliás, ele fala sobre pedantismo também!
  Para quem ama livros, ama autógrafos, sebos, coleções, é obrigatório!

OS ANOS 70 FORAM UMA BOSTA.

   Quem me lê sabe que eu tenho um banzo pelos anos 70. Foi a época de meus 12, 13 anos e de bons discos. Mas foi uma bosta de tempo também!
  A gente acha que estes anos, 2016, 2017, são um tempo de violência e de extremismo. Mas os anos 70, creia, foram bem piores. A diferença é que não havia tanta comunicação pra exibir o sangue na nossa cara.
  Nem vou falar do Vietnã. Nem do Camboja. Vou falar que quase todos os países africanos tinham ditadores que matavam por prazer e que se auto denominavam "Imperadores Divinos" ou "Guias do Futuro". Havia uma guerra entre fronteiras, guerrilhas comunistas, grupos de extermínio.
  O pior de tudo é que os anos 70 foram os anos em que a figura do intelectual como líder politico atingiu seu auge. Qualquer garoto de óculos Lennon era levado a sério. Isso mesmo nos EUA e na GB. Hoje eles existem ainda, mas fedem à passado. Naqueles tempos pareciam ser o futuro. As pessoas ainda não tinham enxergado que esses caras são apenas pessoas frustradas por sua desimportância.
  Aqui na Sulamérica, ditadores de direita posavam como machos alfa e eram eliminados por outros mais machos que eles. Pior era que a única alternativa eram machos alfa de barba e boina. O que era a mesma bosta. Fidel ainda era levado a sério. Assim como Mao e Tito.
  Todo país europeu tinha seu grupinho terrorista. Todos eram comunistas e queriam expulsar os EUA da Europa. Eles matavam inocentes pelo bem futuro. Os anos 70 foram auge da criminosa filosofia que diz: Os fins justificam os meios.
  Nos anos 70 tinha terrorismo até no Canadá!
  Sim, tudo era compensado por comédias bacanas, carros grandões e gênios do esporte. Mas foram anos violentos. Muito violentos. E felizmente não existiam câmeras pra preservar todo esse horror pra sempre.

ROVERANDOM - J.R.R. TOLKIEN

   Em férias na praia, com sua esposa e seus três filhos, Tolkien inventa para Michael, seu filho do meio, a história de um cachorro que é transformado em brinquedo por um feiticeiro vingativo. Tolkien cria essa história como consolo ao filho, que havia perdido seu cachorro de brinquedo. Era um cachorrinho de chumbo, pesado, pequeno, amado pelo menino que o carregava nas mãos para todo canto. Procuraram na praia por dois dias, mas o brinquedo nunca foi encontrado.
  Depois de narrar a história-consolo para o filho, Tolkien a escreveu mas nunca a publicou. Morto em 1973, a aventura do cachorro Rover vira livro em 1982. É um livro infantil, não procure nenhum simbolismo, nenhuma mensagem, é apenas uma história bem contada. E que alívio, que prazer poder ler linhas tão bem escritas!
  Rover é um cão de verdade que vira brinquedo. E esse brinquedo é perdido na praia. Um outro mago faz com que ele vá para a Lua e lá ele vive aventuras com o Homem da Lua e o Cachorro da Lua. Depois Rover vive um tempo no mar, como cachorro marinho e ao fim retorna a seu dono original, que não é o filho de Tolkien, mas sim o menino anterior à sua condição inanimada.
  A história se desenvolve em meio a cenários simples e maravilhosos, personagens que vão de dragões lunares à sereias e gaivotas que podem voar pelo espaço. É bonito, é fácil de ler e é divertido. Um inesquecível presente para uma criança de 10 anos, um ótimo conto para um adulto que ainda dê valor às coisas da imaginação.

Ray Davies(Kinks) Waterloo Sunset Glastonbury 2010



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UMA CÂMERA PARADA E UM CARA DE PALETÓ

   Desde 1968 os londrinos seguem a letra desta canção. Podem não mais lutarem na rua, mas continuam morrendo de tédio e fazendo bandas ( ou sendo DJs ) por não ter opção. Pois no mundo seguro do primeiro mundo, onde se marcha na onda do consumo e gastar dinheiro é tão vital como respirar, Street Fighting Man perdeu a atualidade porque não mais se luta, mas continua um lembrete válido, sinal de nossa prisão.
   Eu nunca havia visto o clip original, e acho que voce também não. Uma câmera no tripé, parada, e Mick Jagger com um paletó largo indo e vindo no meio da escuridão. Não é o Mick dos trejeitos. É o cantor ainda lindamente sem jeito. E ele marcha, anda, volta a marchar, dá um chute, gira como o relógio do tempo, como autômato do século XVIII, não dança e não finge cantar. Aos 24 anos ( !!!!!! ) ele alardeia sua relevância central no momento mais perigoso do século mais fatal.
   Ingleses gostam de dizer que Waterloo Sunset é o hino não-oficial de Londres. Musicalmente ela é mais presente neste século. Centenas de bandas imitam essa sonoridade. E Ray Davies, sempre um conservador, faz uma elegia à velha cidade de Vitória e de Disraeli. Mas Street Fighting Man é o hino do subterrâneo, a memória daquilo que deu errado.
   Esse clip, postado abaixo, é um assombro.

OS CINCO PONTOS DO MODERNISMO EM ELIOT

   1- A SOLIDÃO DO HOMEM. Separado do que e por que...
  2- A INEXPLICÁVEL ESTRANHEZA DO NASCIMENTO E DA MORTE. Estranheza pressupõe algo de mais natural. O que seria esse natural...
  3- A IMENSIDÃO DO UNIVERSO. Se é imenso e silencioso é insignificante. O vazio do universo serve apenas para cenário de novelas tipo HG Wells.
  4- O HOMEM E O TEMPO. O tempo só tem significado se houver alguma missão ou trabalho a ser realizado. Se a vida é absurda e portanto sem objetivo, então o tempo não tem relação ou importância nenhuma.
  5- A ENORMIDADE DA IGNORANCIA HUMANA. Falta de saber em relação a que. Se o homem nada sabe é de se supor que exista algo a ser sabido. O que seria isso ninguém diz. Se cobramos esse saber é porque alguém deve saber, deter esse conhecimento. Onde e quando...
  Na verdade essas proposições são apenas sintomas e não perguntas ou dúvidas reais.

O USO DA POESIA E O USO DA CRÍTICA - T.S. ELIOT

   Este livro nos apresenta um série de palestras feitas por Eliot em Harvard, entre 1932-1933. Dryden é o primeiro poeta-crítico de quem ele fala. O que Eliot procura é investigar as definições e as utilidades antes dadas ao que seja poesia. No fim, a conclusão é de que não pode haver homogeneidade no que seja escrever ou ler poesia, mas se pode retirar alguns mitos, e é aí que mora o melhor do texto.
  O poeta é influenciado pelo meio e pela memória, e talvez toda criação nasça da lembrança, da reelaboração de memórias soltas. Mas, para lermos e para entender poesia é preciso NÃO procurar encontrar o sentido o que se lê e não ler com o mapa da vida do poeta em mãos. Ler poesia é se jogar para dentro do texto e só levar em conta aquilo que está escrito, nada mais.
  Uma das mais brilhantes teses é a que diz que POESIA NADA TEM A VER COM MISTICISMO OU RELIGIÃO. Claro, há poesia mística, mas a poesia não é uma substituta da experiência religiosa. Eliot diz que com a morte da igreja, sua crise, as pessoas tentam ter vivências religiosas FORA da religião.
  Racine escrevia, como Shakespeare, para a diversão de boas e decentes pessoas. Hoje isso seria considerado banal. O poeta é visto como um tipo de guru ou de xamã, o que é um absurdo. Poetas, a maioria, escreve poesia conscientemente, como trabalho lento, e não como êxtases divinos.
  Interessante observar que em 2016 cobramos experiências religiosas, sem religião, de shows de rock, psicólogos formais, filmes simbolistas, e até de encontros esportivos.