COMO SER UM CONSERVADOR - ROGER SCRUTON ( NÃO EXISTEM NA POLITICA BRASILEIRA ).

   Talvez um dia tenhamos tido verdadeiros conservadores. Mas eles devem ter se afastado da politica em 1889. O horrendo golpe republicano alienou do brasileiro sua alma conservadora e instituiu a história brasileira como um eterno recomeço, um jogar fora o passado. Começo que jamais termina.
   Dos livros de Roger Scruton este é o mais politico. Portanto não espere outro assunto a não ser as agruras do partido conservador e do trabalhista na Inglaterra. Claro que é um excelente livro e eu o recomendo para todos. O que ressalta no texto é a diferença imensa que há entre o conservadorismo real, inglês, e aquele que cá é chamado de direitismo. O direitismo, chamado por Scruton de liberalismo, prega o progresso, o consumo, a indústria e a economia como únicas verdades. Isso existe no Brasil, em que pese ser aqui conspurcado por uniões podres e cínicas com o estado.
  Conservadorismo, o verdadeiro, doutrina de Burke, de Alex de Tocqueville, prega o respeito ao passado. É uma democracia que leva em conta os mortos, os vivos e aqueles que ainda não nasceram. Tem no centro tudo o que nasce de baixo e não o que é imposto de cima. Seu vínculo é o amor entre familiares e vizinhos e não o dever para com o estado.
  As pessoas amam sua família, sua rua, seu bairro. E é esse amor que as une aos desconhecidos das cidades. Uma cidade é a união de famílias e não a união de indivíduos. Para esse amor ser respeitado, ruas, igrejas, monumentos, paisagens precisam e devem ser preservados, conservados. Uma cidade só é humana quando tem história, passado, e quando suas dádivas são guardadas como herança para o futuro. Lar, clube, time, igreja, escolas, praças. São esses os organismos de uma nação. Não se deve, jamais, impor a essas pessoas aquilo que lhes é melhor, o que se deve é garantir a liberdade de que elas continuem construindo sua história.
  Scruton escreve suas melhores e mais lindas páginas na defesa da beleza. Beleza é conforto, é bem estar, é dar sentido, é sentir-se aceito dentro do mundo. A arte moderna abomina essa ideia e Scruton explica como e quando aconteceu esse desprezo à beleza. A arte, deixou de ser um modo de se atingir a plenitude, e se tornou modo de destruir tudo.
  Vou resistir a tentação de comentar o fantástico capítulo final. Nele Scruton descreve a alegria. Para fazer justiça a algo tão bem escrito só se eu o reescrevesse. Leiam.
  Termino contando uma experiência minha...
  Em 1980 ainda andava de noite pela avenida Paulista com o coração em suspenso. Sombras nas esquinas e luzes embaçadas nas janelas dos casarões, os últimos, que contavam silenciosamente sua história para mim. Eu andava devagar, usufruindo de cada fachada, cada uma com seu emaranhado de linhas, cada linha cantando uma história.
  O pessoal do governo não conservou nada, e a indústria derrubou tudo. Segundo os seguidores de Le Corbusier e de Niemeyer, aqueles casarões não tinham valor nenhum. Eram bolos de noiva, lixo. O valor seria vidro e aço, linhas retas e muita luz. Hoje lamentamos sua extinção. Nunca voltarão.
  Uma casa é um lugar cheio de história. Tem coisas, tem cheiros, tem segredos.
  Nesse lugar a gente fuma, bebe, fala, dorme, lê. A gente tem coisas, a gente ama pessoas e por essa casa a gente trabalha e sonha. Essa a base do conservadorismo. Manter vivas as coisas. Preservar para o futuro o que melhor há do passado. E nessa ideia se encontra a beleza, o conforto e a história. Amar uma nação, a sua, é poder amar sua família.
  Muito "grosso modo" é isso.
  Mas é mais. Bem mais.

Status Quo - Paper Plane



leia e escreva já!

Status Quo - Down Down (Glastonbury 2009)



leia e escreva já!

A BOBAGEM DO TAL ROCK ADULTO E A VERDADE DO TALENTO...PENSANDO A MORTE DE GEORGE MICHAEL.

   O coração de George Michael havia parado de bater a muito tempo. Assim como Prince, seu tempo acabou por volta de 1995. A era dos Clinton, de Seattle, das camisas de flanela enterrou o POP chique, vaidoso, hedonista dos dois e de tantos outros. A versão branca da música de Stevie Wonder, Marvin Gaye e Al Green não tinha mais vez. E o tipo de música de Prince, o negro feliz, vaidoso, satisfeito, sexy, se tornou o RAP, mais agressivo, mais masculino, mais suburbano. O público de George passou a ouvir música eletrônica, o de Prince, RAP.
  Para piorar, George processou a Sony, num tempo em que gravadoras ainda mandavam em tudo. Fosse hoje ele não teria o menor problema, mas na época ele ficou isolado. Na geladeira. Quando voltou o mundo já mudara. Os anos 80 eram outro planeta. E as meninas, seu maior público, dançavam ao som de Ricky Martin, pois George já assumira sua condição gay. ( Ironia ).
  Ele não se tornou um novo Elton John porque não tinha o gênio de compositor que Elton tem. George era uma voz perfeita. Listen Without Prejudice é seu melhor disco e em Praying For The Time ele atinge o sublime. Ouvir essa canção nos recorda que a beleza é aquilo que mais precisamos. Praying é a faixa que abre o disco. Quando a orquestra começa a tocar nos sentimos em outro mundo. Isso é genial.
  A geração de George teve a pretensão de unir música popular adulta ao rock. Perceberam que mesmo Dylan era apenas um adolescente velho. Dylan podia ser genial, mas era um teen sempre. Pensaram em ser adultos copiando a postura de adultos. Bowie, Ferry, Robert Palmer, George, todos vestiram ternos, pegaram melodias Cole Porter- Gershwin- Berlin e pensaram que assim seu POP se tornaria adulto. O máximo que conseguiram era parecer adultos no lugar errado. Erraram de desejo e erraram o alvo, claro. Mas em meio a esse processo criaram um tipo de trilha sonora chique que nunca mais foi tentada por ninguém. ( OK, Amy sim... ). Sade, Paul Weller no Style Council, o Everything But The Girl, todos chegaram nesse hibridismo que jamais foi adulto, mas que era uma bela festa de adolescentes travestidos de Cary Grant.
  O estranho é perceber que Al Green fez tudo isso 15 anos antes. E sem imitar ninguém.
  Bowie saiu dessa e voltou a tentar ser um tipo de vampiro eletrônico. Vários deles se tornaram cantores de dvd. Ferry nunca saiu desse mundo. Vestiu bem e se sente em casa nele. E George sumiu. Alguns shows bonitos, tristes, intimistas. E o coração na voz. A voz...
  Termino falando que Rick Parfitt morreu aos 69 dia 23. Sua banda era o STATUS QUO e essa banda nunca mudou. Desde 1970 eles fizeram e refizeram o mesmo disco, um boogie de pub, rock analfabeto de adolescente feliz. Eu amei essa banda na minha adolescência e voltei a escutar, muito, de 2012 em diante. Penso que nada é mais distante do mundo de George que eles. A música deles é diversão, diversão e só diversão. Com algumas baladinhas muito lindas. On The Level é o melhor disco.
  Bom saber que a música POP pode ser tão variada.

O QUE SIGNIFICA O NATAL.

   A base de uma civilização saudável é o costume. A raiz está no amor, amor que cria a família e que daí se espalha formando a vizinhança. O amor ao seu lugar é o que constitui a identidade. Uma nação é o conjunto de pessoas que se protegem por compartilharem a mesma raiz: a família. A verdadeira democracia garante o respeito a essa base. Familia, bairro, praça, igreja, clube, time, festas populares. Por maior que seja a cidade, ela é habitável quando constituída por essa células. O estranho é que há uma intelectualidade que detesta toda essa rede amorosa. Chama-a de hipócrita, falsa, doente, cínica. Na verdade esse intelectual vê sua face em tudo aquilo que olha.
   Ditaduras começam por atacar alguns desses costumes. Mudam escolas, mudam ruas, mudam nomes de lugares, mudam festas, proíbem encontros, amizades, religiões. Mantém apenas a família porque precisam de filhos. Mas se pudessem fariam fábricas de crianças. O ideal de toda ditadura é a indústria. Um mundo industrial.
   Por isso o natal é sagrado. De todas as festas do ocidente é a mais vital. Ela festeja a família e o nascimento. Ela festeja o milagre. E essa festa é atacada, e já faz algum tempo, em duas frentes: na comercialização, que retira toda a interioridade da noite de natal; e na simples negação, que tem orgulho em dizer que o natal não existe. ( Para esses estou aqui a falar do nada. O que prova apenas a burrice desses seres vaidosos ).
  Toda civilização precisa preservar seu legado. Respeitar os que morreram fazendo viver aquilo que ele nos deixaram, e garantir aos que não nasceram a herança que vem desde sempre. Quando essa corrente se rompe a civilização perece.
   Tenha um bom natal. Olhe uma estrela e pense no tempo transcorrido, nas gerações e mais gerações que o comemoraram. Respeite-as. Ame. Conserve seu mundo.

O GATO ZEN - KWONG KUEN SHAN

   Kwong nasceu em Hong Kong e mora na Inglaterra. Li um ano atrás O Gato Filósofo, um bonito livro da editora Estação Liberdade. Kwong não é escritora, é pintora. Ela faz lindos desenhos sobre gatos e escolhe frases de Confúcio, Lao Tsé, de grande nomes chineses e os combina. O livro se torna assim um delicioso passeio por beleza e sabedoria.
  Kwong confessa ter tido gatofobia por anos e que faz apenas 6 anos e superou esse medo. Hoje ela tem 3 gatos e os usa como modelos. Os desenhos, elegantes, leves, sempre bonitos, nos acalmam, nos deixam em suspensão.
  Vejo no Tube que a edição francesa é muito mais caprichada. A brasileira tem papel bom, boa impressão, mas é econômica, formato pequeno. Isso barateia o livro, é nossa realidade.
  Bela lembrança para amigos que amam gatos.

[Nouveau concept !] Le premier livre-tableau : Les Chats du Tao



leia e escreva já!

LIVROS COMO PRESENTES DE NATAL.

   Tempos atrás dei para um amigo as 700 páginas de Anna Karenina. Ele jamais leu. Ou seja, acabei por dar um presente inútil. Era meu livro favorito, a intenção foi boa, mas errei.
   Se voce for dar livro como presente de natal, nunca dê um livro que signifique trabalho para ser lido. Seu amigo pode simplesmente não ter tempo ou o desejo de ler aquele livro "genial". Ele pode amar livros, mas não aquele livro.
   É por isso que existem livros como LIMÃO SICILIANO de Charlô Wharteley e Stella Espírito Santo ou O HOMEM CASUAL de Fernando de Barros. Livros bonitos e fáceis de ler são presentes sem chance de erro. No mínimo servem para enfeitar a mesa de centro da sala.
   Esses dois, já velhinhos, eu cito porque acabei de os ler. São ok. O livro do limão tem doces muito bons e alguns drinks saborosos. O de Fernando, editor da Playboy nos anos 90, homem que foi produtor de cinema e teatro, português de nascimento, é um manual do vestir sem ostentar. Legal.
   Volto a dizer, livros são ótimos presentes. Mas escolha os bonitos.

CONQUISTADORES - ROGER CROWLEY

   Este livro foi best seller nos EUA, Inglaterra e Portugal, mas não por aqui. Talvez porque ele demonstre a importância da descoberta do Brasil para a Europa de 1500: nula. Cabral fazia a rota genial que os lusos haviam descoberto. A sacada havia sido que para se passar pelo Cabo das Tormentas era mais fácil navegar para oeste, abrir o ângulo e depois descer para leste com a força da corrente marinha. Cabral abriu esse ângulo ainda mais e veio dar no Brasil. Gostou dos gentis índios, mas percebeu que esses índios eram pobres demais. Nada tinham que pudesse ser cobiçado. Então ficaram pouco tempo e continuaram rumo à Africa. O livro gasta cinco linhas com nosso país tupi. E só.
 O autor trata Portugal como o país que inventou a noção de Império Global. Ingleses, séculos depois, apenas os imitaram. O que fez com que um país tão miserável ( Veneza, França, Espanha eram muito mais ricos ) conseguisse esse feito, maior em coragem que a conquista da Lua em 1969, é para Crowley um mistério. Sem terra, pequeno, acossado pelos espanhóis, Portugal teve a ideia: aumentar o território se jogando ao mar. Em caravelas, barcos pequenos, porém velozes. E assim surgiu a linhagem de grandes marujos, homens que venceram o vazio do oceano.
 O pensamento luso era o de exploração. ( E isso foi a miséria do país, do nosso e do deles ). Eles jamais pensavam em colonizar. O desejo era o de ficar rico depressa. Os tupis e guaranis na verdade nada tinham para ser trocado ou roubado. O português não queria explorar minas, caças ou construir fazendas; ele queria a coisa pronta. E a costa africana tinha escravos, tecidos, canela e pimenta, era só pegar. Na India a coisa era ainda melhor. Tinham joias. Os lusos eram piratas. Se usarmos essa palavra entenderemos melhor sua ação. Mas eram piratas apoiados por uma nação e por um rei que acreditava ser herói do catolicismo. Portugal seria o país matador de muçulmanos. E mataram. Milhares.
 Crowley deplora a crueldade dos europeus. Portugal vence todas as batalhas com facilidade. A proporção de mortes é de 50 pra um. A Europa tem armas melhores. Os árabes têm armas ridículas. Mas Crowley jamais chama os lusos de vilões. Isso porque ele sabe que no Marrocos, na Grécia, em Bizâncio, os árabes também mataram, torturaram, humilharam. A guerra é um mal. Mas ela existe e nesse mundo todos são o que são. Guerreiros.
 Impressiona o amor de Portugal pela batalha. Eles lutam para pilhar, para roubar, e alegremente se jogam sem titubear. A falta de ordem é grande. Marujos desviam ganhos, é cada um por si. Eis a grande diferença de Portugal para aquilo que os ingleses fariam: os ingleses punem o roubo e a corrupção com mão de ferro. Marinheiros ingleses não podem pegar nada. Os lusos fingem não perceber. Todos roubam e todos se corrompem. O que um navio inglês captura é da coroa. Cada marujo recebe seu salário. Já em Portugal cada marujo mete a mão naquilo que é capturado. O que sobrar é da coroa.
 O mundo que os portugueses encontram nas costas da India é o mundo do comércio. Barcos chineses, árabes, turcos, etíopes comerciam livremente. Há toda uma etiqueta de negócios. Os portugueses chegam dando tiros, não têm a menor paciência em negociar e logo toda a costa do mar vermelho e do oceano Índico mergulha em terror.
 Não poderia durar muito. Essas viagens de dois anos, algumas duram três, eram caras, e são venezianos e genoveses que as financiam. As pessoas ficam ricas, Portugal não. Os olhos do mundo começam a mirar a rota portuguesa, espiões italianos roubam mapas, e o segredo é descoberto. Portugal perde o monopólio. Quando vier o terremoto, já no século XVIII, a decadência do reino já virou mania.
 Crowley escreve bem. Tem o gosto da aventura e a seriedade de um historiador.