A DOCE VIDA EM PARIS um livro de DAVID LEBOVITZ

   Fecho o ano sempre com coisas de boa energia, ensinamentos de prazer, de bom viver. Assim, costumo assistir musicais, ouvir músicas que me deixam em êxtase e ler livros sobre viagens, bebidas, comida. Apenas o prazer é permitido.
   Neste divertido livro, um americano viaja à Paris com o objetivo de aprender mais sobre culinária. Chocolates é seu alvo principal. David mostra Paris sob os olhos de quem não é rico. Ele anda pelas ruas, mora num apartamento pequeno e precisa de trabalho. Assim, os lados bons e ruins da cidade são descritos. De pior, o egocentrismo do parisiense típico. O modo como eles furam filas, esbarram nas ruas, urinam nas esquinas, têm banheiros feios e pequenos, dirigem de modo suicida, amam a burocracia, riem pouco, fazem o pior café do mundo, e pouco se importam com dietas, câncer de pele e os males do fumo.
  Mas há todo o lado bom, que acaba por fazer com que ele more definitivamente por lá. O apuro em se vestir, a beleza física de simples vendedores de peixe, as feiras de rua, as padarias, o serviço de saúde público ( o melhor do mundo ), o prazer de andar pelas ruas, o chocolate, o capricho, a sabedoria na arte de viver bem.
  David exibe os detalhes de sutilezas que diferenciam a América, e cada vez mais nós, brasileiros, com eles nos parecemos; e franceses, com quem nós aqui, cada vez menos nos parecemos. Da administração do tempo ( tudo lá acontece no tempo lento dos latinos ), ao modo de se cumprimentar ( tudo deve começar sempre com um bonjour monsieur, de uma ida à loja à uma consulta ao banco ).
  É um gostoso livro para dias em que a gente está em movimento e requer leitura simples e leve.

Easy Steampunk Clothing and Costumes



leia e escreva já!

Easy Steampunk Goggle Tutorial



leia e escreva já!

O QUE É A TENDENCIA STEAMPUNK

   A molecada não é burra. Criou essa moda Steampunk. O que seria isso: misturar duas coisas aparentemente opostas: a aparência vitoriana com o modernismo decadente do século XXI. Então temos carros movidos a vapor. Pistolas mecânicas de madrepérola que emitem raio laser. Ruas da mais moderna cidade com carruagens e esteiras futuristas. Um mundo tão irreal quanto o mais bizarro sonho. E por isso, um mundo que revela a verdade mais secreta:
Queremos a tecnologia de hoje. E queremos viver em outro tempo. De preferência o passado. É a mais nova roupa do romantismo.
   O visual é fascinante! Tudo remete ao sonho. Um simples fusca se torna um tipo de mecanismo de relógio mágico. Sherlock Holmes se une a Blade Runner. Dr. Who com Matrix. Meninas japonesas vestidas de personagem de Henry James com maquiagem punk. Ligas nas pernas com tatuagens.
  Muitos livros e muitos filmes são feitos nesse novo estilo. Há muito de Art Nouveau. Com tecnologia vintage. Relógio de bolso e charuto. Telas e teclados. Muito ferro e muito cristal.
  Daí as barbas. Os babados. O sobretudo. O chapéu.
  Desconheço se existe música nesse movimento. Deve haver. E deve ser sexy e decadente. Muito século XXI e ao mesmo tempo muito "virada de século decadente".
  É claro que tudo isso será esquecido bem depressa. É moda. Mas, puxa!, que belo modismo!

O FIM DO PALCO. A VIDA DE GLENN GOULD.

Vejo na TV O Legado de Glenn Gould, um fantástico documentário sobre o gênio canadense. Se você não sabe quem ele é...
Glenn nasceu em 1932 e explodiu nos anos 50 como o jovem revolucionário que tocava Bach como ninguém jamais tocara antes. Sua filosofia era: Não faz sentido tocar como todos tocam. A música ao ser executada deve ser recriada, revivida, renovada. Mas isso, claro, dentro da partitura. Deve-se ler a obra e reler a obra. Glenn Gould trouxe à música aquilo que a literatura crítica usava desde os anos 20, A Leitura Criativa. O leitor como co-autor da obra. No caso, o músico como co-autor da obra musical.
Seu sucesso em salas de concerto foi avassalador. As pessoas iam para ver aquele jovem pianista "pirar". Gould logo sentiu que aquilo não fazia sentido. E daí nasceu seu segundo ato criativo ( que na época causou raiva em outros pianistas ): Glenn Gould defendia que a gravação em estúdio tinha MUITO mais valor que a apresentação ao vivo. Por dois motivos:
No estúdio o artista tinha controle sobre a obra. E ao mesmo tempo podia interagir com engenheiro de som e produtor. Podia incorporar o acaso, o acidental. Podia criar enquanto interpretava.
E, segundo, no estúdio o TEMPO era vencido. A gravação se eternizava, ela vencia o efêmero, ela podia respirar em novas audições.
Críticos começaram a atacar Gould. Ele mexia em dois pontos sagrados: A primazia do show ao vivo, e o respeito à interpretação consagrada. O Bach de Gould era o Bach de Gould, ou melhor, o Gould de Bach, pois seus fãs diziam que Gould ressuscitava Bach e o fazia escrever para Gould. ( Bach era o Deus de Gould. )
Antes de qualquer artista POP, Glenn Gould percebeu que o estúdio libertava o músico, lhe dava asas, era um brinquedo. As Variações Goldberg se tornaram um hit de vendas nos anos 50, mas algo não ia bem com Glenn, e este bravo documentário mostra o que.
Incrível a massa gigantesca de fotos, entrevistas, documentários e depoimentos que existem de Glenn Gould. Ele foi um superstar por toda a vida. Mas sua alma era a mais retraída possível. Ele conta que odeia a plateia, não cada um deles, mas o todo. A plateia existe como massa que presencia a intimidade do artista. Ela é invasiva. Ela quer sangue, suor, dor. E Glenn queria tão somente TOCAR. Quando ele toca o que vemos é uma profunda relação entre ele e o piano. O público fica excluído disso, não existe. E é essa indiferença que fascina o público desprezado. Ele tem a vã esperança de poder penetrar dentro do mundo de Glenn Gould. Impossível !
Glenn conta que não acredita na morte. Que isso lhe foi sempre natural, não foi algo que ele procurou. Filosofias do Aqui e Agora lhe eram repugnantes. A vida não ocorre aqui e muito menos agora. A vida é em outro ponto. Sua atitude diante da vida, hiper individualista, alheia, distante, revela sua crença. Crença que ele conta ser impossível de descrever.
Lembro que em 1982 eu comprava todos os números da Rolling Stone. Foi a leitura dessa revista, com um dicionário ao lado, que me deu a facilidade em ler o inglês. Numa última página inteira eu li a data: Glenn Gould, 1932-1982. Ele morria cercado de mistério. Afastado dos shows, solitário, se ia aos 50 anos. Cedo.
Para ele não fazia sentido tocar duas vezes a mesma obra do mesmo jeito. Se até mesmo no POP temos dificuldade em aceitar novas interpretações no palco, imagine no meio erudito... ( Esqueça o jazz. Gould não tem ligações jazzísticas. Suas releituras são dentro da partitura, como eu já disse ).
Esse documentário é brilhante! passou no canal Curta! Procure ver.

Glenn Gould-J.S. Bach-The Art of Fugue (HD)



leia e escreva já!

ILHAS, VEREDAS E BURITIS - ELIANE LAGE, UMA VIDA INCRÍVEL !

   A família Lage começa a se tornar importante no século XIX. Fazem barcos, têm minas de carvão, são absurdamente ricos. O bisavô de Eliane compra algumas ilhas na baía da Guanabara. E vive numa delas, a de Santa Cruz. Traz pássaros de todo o país e cria-os soltos em sua ilha. Um paraíso com vista para a Serra do Mar. Na ilha apenas uma casa, o palacete do dono. Os filhos desse homem estudam na Europa, têm sangue francês, enriquecem.
  Eliane nasce nos anos de 1920. O pai é um playboy. Jorge Lage não trabalha, tem ideias. E todas dão errado. Como tantas famílias ricas brasileiras, eles começam a perder dinheiro e poder. Eliane é filha desse homem com uma inglesa rica, Margie. E a menina, tímida, ama a ilha do bisavô. Interna na suíça, que odeia, sente a felicidade nas férias brasileiras, na ilha, como uma indiazinha, no sol, a cavalo, solta. A mãe volta à Europa, o pai tem festas e namoros, a menina cresce só. Internato no Rio. O que lhe salva é a natureza.
  Essa a infância de Eliane. Depois os Lage constroem o Parque Lage, se tornam reis do glamour e perdem as ilhas e o Parque quando Getúlio Vargas confisca tudo, após a morte do avô que não deixou testamento. Continuam ricos, mas nunca mais serão donos do glamour. Passam a pensar em dinheiro ( o rico verdadeiro não pensa nisso ).
  Eliane nunca ligou. Ela cresce com raiva de rituais, de etiqueta, de poses e gostos. E com uma elegância natural sublime. Sua vida é terra, é chão. Mora em Paris, em Londres. Depois na fazenda de Yolanda Penteado. Vira atriz de cinema da Vera Cruz. Vira estrela, mas nunca gostou de cinema, fez filmes por amor ao marido, Tom Payne, um inglês cineasta. O casal tem filhos e mora no Guarujá. No Tombo, selvagem ainda em 1955. Três casas em toda a praia. Vivem no interior de SP, num sítio e depois de 15 anos se separam.
  Eliane larga o cinema e encontra a vida que sempre quis. O interior de Goiás, uma fazenda. Cria gado. No meio do nada. Perde dinheiro. Mora em Ouro Preto. Mora em Olinda. Mora num sítio em SP de novo. E lá, na casa rosa, escreve este livro de memórias. 1998.
  Eliane fez o trajeto que tinha de fazer: da ilha ao mundo, do mundo aos bichos. Forte, bela, única, ela poderia ter sido uma revoltada, uma ressentida, uma dondoca da sociedade. Escolheu ser ela mesma. Bacana este livro de 2002 que releio agora.

The Beatles - Please Please Me



leia e escreva já!

1963

   Deve ser chato ser inglês e ter de olhar pra trás. Isso porque o país vive apenas de um longo passado. Seja 1600, 1810, 1900 ou 1963. Veja 1963...havia uma combustão de novidades que explodiam no ar. Nesse ano Tom Jones venceu os principais Oscars e Peter Sellers confirmava seu estrelato como Clouseau. James Bond começava a virar mito. Julie Christie e Peter O'Toole eram os atores mais quentes ( mas havia ainda Vanessa Redgrave, Terence Stamp, Tom Courtney e toda a velha guarda ). A Carnaby Street ditava moda. E cantavam os Beatles. Doctor Who na TV. O Santo também. David Bailey tirava fotos. George Best e Bobby Moore começavam a jogar e em 1966 a nação ganharia sua copa ( ao som de Kinks ). E depois...nunca mais...
   Havia Jim Clark, Graham Hill e Jackie Stewart. E nas letras os novatos Anthony Burgess, Iris Murdoch, William Golding e Philip Larkin. Eliot, Waughn e Greene ainda estavam vivos.
   E pela primeira vez, coordenando tudo isso, uma ideia londrina: a propaganda como arte. Nos escritórios moderninhos jovens publicitários pensavam em fazer arte na propaganda e arte na TV. ISSO mudou o mundo. E tudo explodindo em 1963.
   Ouço o primeiro disco dos Beatles e lembro de tudo isso ( engraçado recordar o que não vivi, nasci depois ). A banda foi adotada pela onda meio sem querer. Os Stones ou o Who tinham muito mais a ver com a coisa. Eram mais citadinos, mais snobs e bem mais perigosos. Mas os caras de Liverpool se impuseram porque eles eram muito, muito bons. O disco ainda espanta. Sim, é primo europeu de Everly Brothers e principalmente de Buddy Holly. Lennon imita o gênio do Texas descaradamente. Mas eles vão além. As vozes unidas de Paul e de John arrepiam. Nasceram para se harmonizar. E é impressionante como todas as coordenadas do POP futuro estão lá. Os arranjos enxutos, o refrão grudento, o solo breve no meio da canção, e a sensação de que naqueles dois minutos há mais que aquilo que realmente há. A faixa Please Please Me, se escutada com renovada atenção, se você tentar ouvir com ouvidos "virgens", tem uma exuberância, um tal grau de alegria e de confiança jovem que te faz sorrir imediatamente. Ela já dá a pista do talento milagroso que lá borbulha. PS I love You é outro petardo, e George cantando Do You Want to Know a Secret nos deixa comovidos...
   Deve ser chato pacas ser britânico e saber que nunca mais haverá um John. Assim como não mais um George. Mas...talvez seja ótimo saber que os outros países nunca tiveram e jamais terão Beatles.  

A FÍSICA DA ALMA - AMIT GOSWAMI....FOI UM LONGO CAMINHO.

   ...foi um longo caminho para que eu chegasse até aqui. E como nada sei, ainda tenho uma estrada, maior ainda, pela frente.
   Não, essas palavras não são de Goswami, são de mim mesmo. Desde cedo tenho me intoxicado de informações. Lembro que aos 9 anos comecei a ler romances, aos 10, livros de ciência e aos 15 as enciclopédias. Encontrei vários gurus e cheio de medo, sempre fugi de qualquer tipo de conhecimento religioso. Se um autor revelasse o menor viés místico eu prontamente o evitava. Ria deles. Me sentia seguro no mais completo materialismo. Queria ter certezas, e acreditava que o universo era somente um tipo de explosão sem sentido e sem fim. A vida, um acidente químico. Toda emoção seria apenas um arranjo de fluidos cerebrais. O acaso guiaria tudo.
  Mas eu nunca perdi a curiosidade. E continuei a andar. Abrindo portas. E certas coisas começaram a surgir.
  Primeiro percebi que o tempo é ilusório. Ele não conta fora de nós. É artificial. Depois notei que o número é sempre arbitrário. Nós contamos coisas para tentar dar ordem ao que não tem. ( Aparentemente não tem uma ordem numeral ). O que pode ser contado, medido e pesado nos dá uma tênue segurança. E então cheguei a conclusão de que nossa razão existe SEMPRE como redutora. Ela pega o inexplicável e ao ignorar sua incompreensibilidade reduz tudo ao nível racional. Ou seja, conta, enumera e classifica. Mas essa conta nunca fecha. As perguntas mais importantes continuam sem resposta.
  Passei a me abrir ao absurdo. E a perceber as linhas de pensamento abstratas. A vida, súbito, se aclareou. O universo aumentou. E ao mesmo tempo, meus limites, humanos, foram vistos e aceitos. Só sabemos aquilo que cabe em nós. Só vemos aquilo que nossa carne consegue ver. Como hardwares, temos um limite mecânico, mas a POTENCIALIDADE é infinita.
  Amit Goswami é físico, leciona em Universidade americana. E usa a física quântica para explicar a reencarnação. É claro que li este livro com dois pés atrás! Seria autoajuda....seria new age....mas não. Ele tenta ser sério todo o tempo. Conta e reconta fatos da física e os liga, logicamente, a possibilidades de vida e de morte. Fala-se bastante da morte e por isso me identifiquei muito com ele. ( A morte sempre foi o assunto central da minha vida ).
  O Livro Tibetano dos Mortos é explicado e ao final percebemos que este autor nos ensina a morrer. Morrer visto como chance de sabedoria, de coda luminosa, de transcendência. Morrer como o grande ato da vida. É como se toda nossa vida fosse isso, preparação para morrer.
  Ele cita bastante Platão, Whitman, Schopenhauer e uma montanha de autores indianos que não conheço.
  Não vou explicar sua teoria quântica, ela é cansativa e complicada. Eu não sei se a entendi corretamente. Mas o que devo falar é que a ciência tem se aproximado MUITO de certas teses espirituais e cada vez mais ouvir um físico falar fica parecido com algum poeta exotérico a criar.
  Goswami diz que Jung falava que no futuro a psicologia seria um ramo da física.
   A mais bela mensagem do livro é aquela que diz que todo saber passa pela intuição e que intuição é criatividade. Viver é criar e criar é viver a alma. Evoluímos quando criamos, intuímos, inventamos. Porque essa é a negação do automatismo e automatismo é vida mecânica, puramente material.
   Não é um grande livro, mas é uma grande mensagem.