COMO ERA O SÉCULO XX?

  Uma aluna me sensibilizou ao perguntar como era o século XX. Se eu viver até 2060, mesmo assim, esse pobre e assustado século será meu tempo. Respondi para ela que foi uma época em que as pessoas tomavam sol. Pessoas bonitas eram pessoas bronzeadas. E todos, sinto dizer, pareciam mais saudáveis. Fumavam, usavam péssimas maquiagens, mas pareciam mais alegres, naturais. Acho que era porque não havia tanta preocupação com dietas, genes, plásticas, proibições. O sol era mais amigo. E veja, chovia muito! E no inverno fazia frio.
   Minha resposta foi essa. E como ela tem onze anos, escrevo agora uma lembrança, comum, banal, de meus onze anos...
   O envelope azul era feio. Novo e já amassado. Dentro vinha um disco pequeno, com um forte cheiro de petróleo. O selo, ao centro da bolacha também era azul e nele se lia Fermata. A vitrola era um grande móvel de madeira clara, lustrado. O visor tinha uma luz verde. Apertei o botão branco e o prato girou. Coloquei o braço com a agulha sobre o disco. A familia toda se apertava ao redor da vitrola ABC. Queriam saber qual minha música favorita. Nove acordes de piano, lentos, e então a voz jovem e estranhamente melancólica de Elton John. Uma belíssima balada, meu primeiro disco. Rica melodia, belo arranjo de orquestra, bateria ribombante, a guitarra espalhada e esmerilhada, o refrão com multi vozes sonhadoras, uma balada que parece estranha, excêntrica, refinada. O disco, simples, acaba. E eu respiro fundo. Minha familia não gostou.
  Goodbye Yellow Brick Road era o single mais vendido aqui, em SP, no mês de abril de 1974. E Elton era o rei. Tocava no rádio também, Beannie and Jets, Candle in The Wind, Daniel, Roy Rogers e Sweet Painted Lady. Ele era o campeão, mas aquele momento era mágico. Dizem que 1966 foi o auge dos singles no rádio. Falam de 1972 também. E eu vi momentos sublimes em 1980, 1982, e depois na MTV em 1991 e 1995. Mas o meio de 1974... nas manhãs de sábado, em que não havia aula...Us and Them, Angie, D`yer Makèr....Tinha Wings Live and Let Die. Lennon com Mind Games. E Sorrow, David Bowie no rádio AM de SP.
  Gaye era uma balada linda de Clifford Ward. A regravação de I Am a Believer com Robert Wyatt. You Done Nothin com Stevie Wonder. No More Mr Nice Guy, Jet, 48 Crash, Elected. E David Essex, Sweet, Abba, Soley Soley...Slade. Tinha Harold Melvin, Diana Ross e Stylistics. E o Secos e Molhados. Os Novos Baianos. Gita. E Esse tal de Roque Enrow!
  O rádio era uma festa! Uma mistura que ia de Originais do Samba e Benito di Paula à Guess Who mais T.Rex... Era uma educação musical completa. Lembro de gravar num K7 a banda War e na sequência veio Dave McLean. Era surpresa e mais surpresa! Tudo misturado.
  Isso era o século XX. Uma salada tosca. Uma invenção improvisada. Um prato cheio.
  E a gente era guloso pacas!!!!!

OS INFINITOS- JOHN BANVILLE....ERAM DEUSES, ERAM HOMENS ERA A VIDA.

   John Banville escreve aqui o melhor romance dos últimos 14 anos. É meu terceiro Banville e é, em suas primeiras página, o que menos promete. Parece bobo com o deus Hermes voando por entre os humanos que se reúnem numa casa de campo inglesa. A sensação é de que se trata de uma sátira sem leveza. Mas rapidamente a coisa muda e começamos a perceber que o romance é uma obra de arte. Mestre da língua, Banville faz poesia em prosa, filosofia em diálogos e diverte em meio a um drama pesado. Esse escritor irlandês, nascido em 1945 e que esteve na Flip, acho que em 2011, merece muito mais fama neste país tolo do que tem tido. Candidato ao Nobel, jamais irá vencer, aposto, é figura central da prosa deste século. Este livro o prova.
  Adam é um velho matemático. Famoso, ele revolucionou a ciência pura, ( ciência pura é aquela que vive no mundo abstrato, onde sua ambição está dentro dela mesma, não é prática. Como a arte, é inutil ). Adam descobriu uma equação que resolve o infinito. Adam está em coma após um derrame. Na casa está sua segunda esposa, alcoólatra. Seu filho, Adam Jr., um alegre e otimista rapaz. A nora, Helen, uma belíssima loura vaidosa, e a filha, Petra, que tem sérios problemas mentais. Há ainda Ivy, a ex-dona da casa, uma nobre falida que agora é empregada da familia, Duffy, um empregado. Depois chegam Grace, um amigo gordinho e desagradável de Adam, e o namorado de Petra, um rapaz frio, vazio, distante. Há ainda Rex, o cachorro, um velho labrador. Com esses elementos, mais a presença do deus grego Hermes, que narra boa parte do livro, e de Zeus, que está sempre desejando Helen, John Banville narra uma história que fala sobre morte, alma, carne, natureza e familia. O tema é pesado, mas, como um mestre, Banville nunca nos deprime. Essa a magia do autor. Ele faz com que um velho em coma narre alguns capítulos, suas sensações, seus pensamentos, e mesmo nesses momentos o que sentimos é maravilhamento, prazer. O livro dá enorme satisfação. Ele fala de chuva, de luto, de desentendimento, e é claro, solar, vivo.
  Todos os personagens são narradores em algum momento. Até o cão tem seus parágrafos. Mas Hermes e Adam são aqueles que mais falam. Vemos a vida pelo ponto de vista de um deus e de um homem em coma, na quase morte. Entramos na abstração da matemática, tomamos contato com  a natureza, com o infinito e com a dor de viver. A morte paira ao lado de cada frase. Deuses sofrem por não poder morrer, homens sofrem por morrer. Apenas os bichos e as crianças muito jovens são felizes. Ignoram que exista a morte.
  Não contarei a surpresa reservada às últimas linhas. Mas posso dizer que quando terminei o livro a minha sensação foi de espanto. A mesma sensação rara de se abrir um presente aos 7 anos no Natal. Um laço se desfez, a caixa se abriu e eu sorri. Um dos mais belos finais que li em minha vida. Uma afirmação do valor da vida. E ao mesmo tempo um tapa na cara. Lindo.
   Livros como esse recuperam nossa fé na literatura, na ficção e no homem. A criatividade, esse dom sem razão, e as palavras, ferramentas que quando bem usadas são encantamento. John Banville conseguiu escrever um romance para adultos, sem nada de fácil em seu texto, que produz o mesmo encanto de um grande livro de poemas. Parece um sonho. Parece uma epifania. Parece o Olimpo.
  E não é.

MANKIEWICZ/ BETTE DAVIS/ AVA/ BOGEY/ REDGRAVE/ ALEC GUINESS

PELE DE ASNO de Jacques Demy com Catherine Deneuve, Jean Marais e Jacques Perrin
Um rei viúvo, que prometeu a esposa se casar apenas com uma mulher que fosse mais bela que a rainha, descobre que a filha é essa pessoa. O conto de Perrault adaptado em 1970 por Demy, tem música de Legrand e fotografia de Cloquet. E mesmo assim é de uma bobice exemplar. Demy foi um deslumbrado. Se apaixonou pela nouvelle vague e depois pelos hippies que conheceu em LA. Une aqui o pior desses dois mundos. Claro, é um prazer ver Marais, o ator de Cocteau, mas é pouco. Nota 2.
ESCRAVOS DO DESEJO de John Cromwell com Bette Davis, Leslie Howard e Frances Dee.
O romance de Maugham fez de Bette uma estrela. Passado em Londres, o filme conta a história do médico, de pé deformado, que se apaixona por uma garçonete, que o usa e joga fora. O filme foi um sucesso e é bom, apesar de Bette. Porque apesar deste papel ter feito dela a estrela da Warner, seu desempenho é fake. Um sotaque cockney exagerado e uma vulgaridade de carnaval. Mas vale pela boa produção. Nota 5.
QUEM É O INFIEL? de Joseph L. Mankiewicz com Jeanne Crain, Linda Darnell, Ann Sothern, Kirk Douglas e Paul Douglas.
O roteiro, do diretor Mankiewicz, ganhou o Oscar de 1949. E é brilhante! Três amigas, casadas, vão passar um fim de semana numa ilha. Longe de telefones, elas recebem de um amigo uma carta. Essa carta diz que nessa hora, o marido de uma delas está fugindo com outra. Essa outra é a estrela da escola, antiga amiga das três. Essa carta faz com que cada uma delas se recorde do seu casamento, de um momento de crise, de alguma injustiça cometida. Qual deles fugiu? Mankiewicz dirige de sua maneira segura, pausada, firme de sempre. O filme, visto pela terceira vez, se mantém como diversão de primeira. Ainda atual, ele une drama, humor e muito suspense. O elenco, como em todos os filmes do diretor, se destaca. É este o primeiro papel de Kirk Douglas. Pode ver. É ótimo. Nota 9.
A MALVADA de Joseph L. Mankiewicz com Bette Davis, Anne Baxter e George Sanders
Um dos mais famosos filmes de Hollywood, conta a história da atriz veterana que é usada por uma fã que inveja seu status. O roteiro, do diretor, tem algumas das melhores falas wit da história. E há Bette, num de seus grandes momentos que não lhe deu um merecido Oscar. Ela consegue transmitir vulnerabilidade e vaidade ao mesmo tempo. Sua voz, rouca, traz sensualidade decadente. É um papel de genialidade. Mas o filme tem mais. Tem George Sanders exalando maldade, tem suspense e uma Anne Baxter quase ao nível de Bette. É um filme maravilhoso, perfeito, histórico e deu um Oscar a Mankiewicz como diretor. E mais um como escritor. Obrigatório para quem queira saber o que significa um bom diálogo. Nota DEZ!
A CONDESSA DESCALÇA de Joseph L. Mankiewicz com Humphrey Bogart, Ava Gardner e Edmond O`Brien
A história, cheia de fel, de um diretor humilhado por um produtor. Também é a história de uma atriz, ninfo, que não dá a mínima para a fama e que se casa com um milionário impotente. O filme deveria ser forte, mas não é. Ele quer ser tão irado que passa do ponto. O drama é exagerado, as cenas na Espanha parecem falsas e até Bogey se perde. Ele não combina com o papel. Talvez seja o pior filme do diretor, apesar de ser uma obra bastante famosa. Nota 4.
O AMERICANO TRANQUILO de Joseph L. Mankiewicz com Michael Redgrave, Audie Murphy e Bruce Cabot
Um filme fascinante que encerra o pequeno festival Mankiewicz que montei para mim mesmo ( eu sei que faltaram muitos outros....fica pra outra ).  O tema é fascinante! No Vietnã de 1954, vemos um repórter inglês, frio e distante, que tenta não se envolver na guerra, se envolver com um americano comum, que surge em Saigon para fazer comércio. Os dois viram conhecidos, disputam a mesma mulher e tudo vira um pesadelo em meio a guerra dos vietcongs contra a França. Well...para quem não sabe, o Vietnã lutou contra a França até os anos 60 e quando venceu teve de lutar contra os EUA por mais dez anos. E venceu. Este filme foi filmado em Saigon, e só isso já faz dele experiência invulgar. Foi nesse ano e nessa guerra que Robert Capa morreu. Redgrave, pai de Vanessa, dá seu show costumeiro. Vemos o inglês perceber o quanto ele foi covarde, mole, inativo. Todo o filme tem jeito de documentário e na rica filmografia do diretor é um dos melhores. Foi um fracasso na época, e nesta era do dvd está sendo redescoberto. A fotografia de Robert Krasker é excelente. Nota DEZ.
A VIDA PRIVADA DE SHERLOCK HOLMES de Billy Wilder com Robert Stephens, Colin Blakeley e Genevieve Page.
Billy num de seus últimos filmes, falha terrivelmente nesta tentativa patética de filmar um caso de Holmes como um tipo de comédia realista. O filme não pega fogo. E o roteiro, algo sobre um submarino, tem um interesse nulo. Nota 1.
VIVA A LIBERDADE de Roberto Andó com Toni Servillo e Valeria Bruni Tedeschi
Lixo. Um infantil e absurdo conto sobre um senador deprimido que é substituído por seu irmão doido. Claro que ele vira um sucesso! O que há de novo aqui? Porque fazer isso de novo? Peter Sellers o fez. Jack Lemmon fez. Eddie Murphy fez. E todos foram melhores. Nota ZERO.
O PRÍNCIPE de ....com Jason Patric, Bruce Willis e John Cusak
Uma menina se envolve com drogas e o pai vai salvar ela. O pai não é Bruce. É Patric. Cenas de ação frouxas e um roteiro com falas de analfabetos. Sem nota.
UM MALUCO GENIAL de Ronald Neame com Alec Guiness
Guiness escreveu o roteiro. É sobre um pintor genial que pobre, vive de aplicar golpes nos amigos. O personagem é feio, sujo, mentiroso, mal humorado e antipático. É um filme estranhíssimo. Nada nele nos seduz. E é um filme importante e bom. Vemos a Londres suja de 1957. Uma cidade ainda em ruínas, escura, pobre, com seus primeiros mods. O ambiente salva o filme. Nota....hmmm....5.
CRIME É CRIME de George Pollock com Margareth Rutherford e Ron Moody
Uma agradável aventura da velhinha Miss Marple, a detetive amadora criada por Agatha Christie. Crimes entre um grupo de teatro, num cidade do interior inglês. Nota 5.

UMA PRECE TARDIA POR SUNI, O RINOCERONTE BRANCO.

Suni.
Voce morreu e sinto que Deus morreu mais um pouco junto a voce. Sinto que a vida ficou menor. Porque quando uma espécie se vai a vida se vai. Tudo fica mais sem motivo. 
Uma espécie deixa de existir e o palco deste drama diminui. A uniformidade aumenta, a diversidade encolhe. Um rinoceronte branco, personagem que aqui estava desde sempre. Que sobreviveu a romanos, gregos e nazistas. A secas, terremotos e vulcões. Mas não consegue resistir a nosso progresso. A nossa maldita cobiça. E leva com ele um testemunho. Uma presença.
O planeta perde mais uma voz, um rastro e um cheiro. Suni cai. Morto em sua terra. E sua terra cai com ele, deixa de ser terra e passa a ser vazio. O eco de sua morte roda mundo e invade meu espaço. Que seca.
Suni nada entendeu dessas mudanças. Não entendeu porque ele estava no centro delas. Porque a Terra é de Suni. E nunca nossa. Nós aqui estamos para cuidar de Suni.
E falhamos.
Mais uma espécie se vai. E para sempre vira lenda. E lenda é saudade para sempre. É ausência que não pode ser preenchida. Desconsolo.
Suni... Nunca mais.

Blondie - Heart Of Glass

para quem quer saber...

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Blondie - Rapture



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AUTOAMERICAN- BLONDIE

NEW WAVE foi o primeiro movimento no POP a se propor engolir tudo o que desse pra se enfiar no estômago e desse pra se enviar aos ouvidos.
Talvez fosse isso. 
BLONDIE. Um regurgitamento de rock tipo Beach Boys, mais Beatles, Mais Modern Lovers e mais JOHNNY THUNDERS plus BLACK MUSIC. ( Talvez primeiro branco a lançar rap ? ).
Tudo temperado com estilo visual: a primeira banda a lançar doze clips para um album- EAT TO THE BEAT, 1979. 
AQUELA COISA, óculos escuros, gravatas fininhas, sapatos sob medida, cabelos nouvelle vague, uma coisa meio boêmios anos 50.
Eu poderia escrever sobre PARALLEL LINES, o disco favorito dos críticos.
ou SOBRE eat to the beat,que é o mais elétrico e urgente....mas vou escrever é sobre aUtoAMERICan....
  pOIS ELE tem ANGELS IN THE BALCONY...(( O desejo sedento de uma voz de mulher e de um corpo de um anjo. O perfume que se espalha dentro das coisas e eu SEI que estive lá, onde VOCE sempre me teve. A inenarrável beleza ESTÚPIDA...Um Deus é aquele que viu tudo e suportou a dor dessa visão. e um ANJO toca meus pensamentos inefáveis e os beija sem paixão )).
Roberto. Dio. Mauro. Marina...Quanta saudade cabe no coração de um homem?
((( Como dizia Zeca Neves, Clem Burke é um batera maluquete. O melhor de 1980. O que não é pouco, muitos se destacam. Chris Stein é o cara. E Debbie é a playmate dos caras que jogaram a PLAYBOY fora...)))
As canções são fotografias de momentos distintos. SEM FLASH. MEIO ESCURO. 
De Hollywood à reggae made in Bali. DE rocknroll ao RAP. 
basquiat grafitaNdo. andy warhol...
...angel.      

Blondie Angels on the Balcony



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