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UMA PROMESSA ( WALK ON THE WILDE SIDE )

Eu tinha fugido da escola e estava ouvindo um disco. E naquela tarde de agosto, sol de bosta, prometi que nada em minha vida seria nunca jamais "nos conformes". Devo a Lou a primeira vez que tive orgulho de ser um merda.
Eu era jovem pra caramba então. E passei a gostar de pensar que havia a porra de uma maldição sobre mim. Bobagem eu sei, mas devo a Lou a primeira vez em que ser um pseudo-maldito não me pareceu ser um loser.
Nada mudou. Passou um monte de anos e não passou nada. O que me seduz ainda é aquilo que ninguém quer. Se voce gosta de azul eu vou amar o amarelo. Continuo sendo um espirito de porco.
Lou Reed pegou minha orelha com essa linha de baixo que é a melhor da história do universo ( Herbie Flowers ) essa voz que é a voz do cara merdinha das ruas e esse som límpido, safado, sexy. Tinha de haver um coro de black girls, tinha de ter um sax de bêbado. Há um clima aqui que é como cheiro de gim com sêmem jogado no azulejo. Mas a voz de Lou, o merdinha, jamais perde a elegãncia.
Naquela noite eu perdi minha virgindade. Ela tinha cabelo de fogo e peitos de porcelana. E cheirava a walk on the wilde side. Era elegante, mas era todo o pecado do mundo.
All right.

MITOS: PAUL E LOU IN BRAZIL

....e Paul merce cada aplauso recebido e toda homenagem. Pois ele é um sobrevivente, um cara ( raro entre os loucos anos 60/70 ) que nunca perdeu o rumo e que nunca precisou de escândalo para fazer sucesso. Seu êxito se deve a seu talento. Imenso dom de melodista e de arranjador.
Mas há algo que me arrepia em tudo isso. Mrs Vandebilt é minha canção favorita de 1974 ! Eu ficava escutando a rádio Difusora AM esperando entre canções de Bad Company e Elton John, Stylistics e Stevie Wonder, que logo tocasse Mrs Vandebilt. Isso foi no tempo do Corcel e do Opala, da tv a válvula e do compacto simples. É tempo demais !!!!
Assim como eu cantava Hey Jude aos 6 anos de idade, enquanto minhas primas me admiravam, pensando que eu seria um tipo de Mozart do Caxingui. Caceta !!!! E hoje, em meio ao buraco de ozônio, a mocinhas de chapinha e celulares, no burburinho de fãs que choram e não páram de tirar fotos, ele, Paul, continua aqui, cantando Mrs Vandebilt e Hey Jude.
Quem mais ?
Os 60 tiveram um poder absurdo em produzir mitos. De Lennon à Hendrix, de Dylan à Jagger. Pelé e Garrincha, Beckembauer e George Best. Muhammad Ali e Jim Clarck, Rod Laver e Gerry Lopez. Luther King e Malcolm X, Kennedy e Che Guevara. James Brown e Michael Jackson. Andy Warhol e Kubrick, Panteras Negras e Baader Meinhoff, Brigitte Bardot e James Bond.
Mitos. Não digo que sejam os melhores, mas sim que se cristalizaram como símbolos.
E se Paul chama multidões, Lou Reed canta ( canta ? ) discretamente, como foi subterrâneo o Velvet Undeground. E se os Beatles foram ( são ) a mais amada e famosa banda do mundo, é ( será sempre ) o Velvet Underground a banda guia de todo grupo que quiz e quer ser maldito. Se os Stones ou o Led foram melhores, o Velvet é bem mais perene, afiado, e deu muito mais cria. Porque desde 1969, não nasceu um só nome no rock dito alternativo, que não tenha um pé no Velvet. Microfonia com baladas de mel, vídeos chics e doidos com postura extra-cool. No mundo do rock-arte, tudo é V.U.
Portanto toda a adoração é devida a Lou. ( Além do que, foi ele, com Mick Ronson, que fez o meu disco favorito: Transformer. )
A gente acaba nisso: Paul, Dylan, Jagger e Richards e mais o que ( falo dos vivos ).....Bowie ? Led ?
Quem desde a década de 80 pode lotar um Morumbi e ser chamado de mito ? Madonna lota. Mas é um mito ? Morrissey não lotaria a Vila Belmiro e o REM idem. Oasis, Blur, Radiohead, Pearl Jam, bandas que têm ou tiveram o fanatismo de seus fãs. Mas são mitos ? Fora dos meios roqueiros, quem os conhece ? Seus pais já ouviram falar ? O garotinho de 10 anos já os escutou ?
Porque mito é o artista que define uma época FORA DE SEU MEIO DE ORIGEM.
Paul saiu do meio rock inglês e se tornou ícone global ( em era pré-tv mundial ). Coisa que nem Led ou Bowie ou Lou fizeram. Que só Michael Jackson ou Madonna conseguiram ( em era de MTV ) e que Dylan fez ( saindo do meio pop para as altas esferas da arte e da politica ).
Não haverá outro Paul. E nem mesmo outro Velvet Undeground. Todo aplauso é justo.

white light/VU/white heat

WHITE LIGHT vem uma massa de som mal gravado. Uma embolação de piano, guitarras e vocais. Tudo esmagado entre os sulcos do vinil azulado. E uma vozinha irritante, cínica, sobre toda essa montanha de cacofonia.
WHITE HEAT ele fala sobre algo a ver com machos e gays. Eu soube que os técnicos de som do estúdio ligaram os botões e foram embora. Não queriam ouvir o que ia ser gravado. Eles estavam acostumados a trabalhar com Miles Davis e Bob Dylan. Aquilo não tinha nada a ver. Na verdade, não tinha a ver com nada.
OOOOOOOH...WHITE LIGHT no rocknroll tudo sempre foi de verdade. Lennon era de verdade, Hendrix era de verdade, James Brown era de verdade. Mas esse chato era irônico. Não era de verdade, ele era feito por sí mesmo, ele era distante, ele era...argh...confuso. Não era símbolo de adolescente nenhum. E não se metia a artista bacana. Que droga ele era?
OOOOOOOOOOOOOOOOOOOH...WKITE HEAT e era amigo daquele tal de Andy Warhol, o cara fake, que chamava seu ateliê de Fábrica, que disse que todos seriam famosos por 15 minutos no futuro, que se mantinha distante da vida, cercado de telas/ cãmeras e puxa-sacos, que dizia que o símbolo de nossa era seria a lata, a estrela pop, a produção em massa, a publicidade. ( Andy criou o mundo de 2009!!!!! mas em 1967, quem poderia saber ? ).
WHITE LIGHT termina sem ter começado. Um zumbido de algum instrumento de cordas, os vocais mal ensaiados, um cabaret de algum buraco de grande cidade cheia de óleo e gás, uma porcaria de música mal tocada e mal gravada. Mas
Agora até dá pra dançar. Um bumbo ( queria entender o porque de se botar uma dona de casa nas baquetas...) e uma guitarra que tenta solar. Faz zumbido, se enrola pela melodia como uma trepadeira venenosa. Esta tem melodia ! Será que este troço vai melhorar? John Cale começa a falar: ele narra um pacote. Um embrulho. É um rap de branco galês formado em música erudita de vanguarda. Eu mostrava essa música para meus amigos fãs de Zappa. Eles riam e não levavam a sério : uma piada. Parece ressaca de ópio.THE GIFT. Mas
A coisa se destrói de vez. Uma porra de massaroca de som molenga e confuso que se parece com um aviãozinho caindo de cansado. Tem uns vocaizinhos de brincadeira. Uns ruidozinhos de acidente. O tal bumbozinho batendo com ritmo invariável. Que droga é esse Lou Reed? Fica com essa pose de Ginsberg/ Burroughs/Kerouac...Ele tá se achando! Pra que gravar isto? Não estamos na época de all you need is love? Então para que pintar de preto a capa de Sgt.Peppers?
SHE EVER COMES HERE NOW. O fiapo de voz de Lou. Como um farrapo. Por esta cançoneta todo compositor inglês daria a vida ( e todo cara esperto a tem plagiado desde então ). Caraca, isto é bonito pra cacete!!!! Mas não é flor e cor; é ressaca de heroína e escuridão. Vamos virar este vinil pelo qual paguei uma semana de trabalho e esperei um mês de alfândega...................
Agora fodeu! Isto não tem o menor sentido! É apenas barulho! A guitarra é uma serra elétrica cheia de microfonia, todo o resto é um frenético ribombar de explosões histéricas, e os vocais... sonâmbulos zumbis em catatonia pagã. ( Seja lá isso o que for... ). Tomara que este pesadelo acabe logo...Acaba!!!!! Que bosta, ACABA LOGO!!!!!!!!!!
Todo pesadelo pode ser pior. SISTER RAY. SISTER RAY. SISTER RAY. SISTER RAY. SISTER RAY.
SISTER RAY.SISTER RAYSISTERRAYSISTERRAY SISTERRAY SISTER RAY. S IS TER R AY
Nada nunca foi assim. Nada nunca mais será assim. Nada nunca será outra vez como antes foi. _Esta música mudou a vida de todos que a ouviram na hora certa. _Depois dela nenhuma música pode me chocar. Nada nunca será louco demais após sister ray. Ela vem como manada de paquidermes trotando. Ela vem como ópera de mendigos de marte com raios nos olhos. Vem como o enterro de flores cobiçadas. Vem como agulhas enfiadas nas unhas. Ela vem e vem e vem.
Esse disco de merda acaba.
Amanhã vou escutar de novo.
Faz vinte e cinco anos que o escuto de novo.
Faz quarenta e dois que ele é o disco central da história do rock.
Sem ele nada que interessa teria existido. Nada. Nada. Nada.
Ele nada vendeu. Mas há o mito : os poucos que o ouviram se tornaram artistas. Formaram bandas, pintaram quadros, escreveram peças e romances. Ou simplesmente piraram. Nada.
Existem discos mais bonitos. Mais satisfatórios. Criativos. Mas nenhum tem o seu potencial destrutivo, a sua coragem, a sua INTELIGÊNCIA. O que irrita nele ( como em tudo que Lou e Cale fazem ) é o fato de que eles são e sabem que são mais inteligentes. Colocam qualquer gêniozinho irado ou sofredor no bolso do colete. Derrubam qualquer poeta. Fazem com que todo barulho perca sua originalidade. Após White Light nada é novo de novo.
OUTRA VEZ.

margaret atwood, tchecoslováquia, o amor verdadeiro

Ainda repercute em mim o livro de Atwood. Ele é tudo aquilo que o filme de Sean Penn poderia e deveria ter sido. É aquilo que Jheremiah Johnson secretamente é, e aquilo que Vanishing Point não poderia ser. Penso no sagrado.
O amor verdadeiro é sagrado. Pois se tudo o que é sagrado é intocado, o amor é intocável. Nós construímos um mundo à parte com o amor. Uma redoma o protege do mundo vulgar, frio, mesquinho, e vivemos em contato com o eterno, o sagrado, dentro dessa redoma. Mas é necessário um enorme cuidado : qualquer mentira, qualquer brutalidade destrói esse idílio. Macula sua necessária pureza. O amor então, após essa mancha, pode continuar, mas seu caráter sagrado se perdeu. Jamais será reencontrado. A relação sobreviverá como nostalgia do paraíso.
O sagrado necessita ser secreto. Uma coisa que é sómente sua. Nessa relação de voce com aquilo, será atingido o todo. Haverá uma ligação com tudo que existe ou existiu através de um contato muito íntimo, particular e sem código. Conto uma história que lí há alguns anos :
Quando o muro de Berlin caiu, foram à Praga e lá entrevistaram Vaclav Havel ( para quem não sabe, herói da resistencia tcheca contra os comunas. Escritor e primeiro presidente da nova república ). Havel contou que nos anos mais negros da repressão, ele, Kundera e Forman se reuniam no porão da casa dele. Um contrabandista conseguia discos americanos para eles e então eles os colocavam para tocar. Era um ato de resistência. Mas havia um disco que era tão livre, tão arrojado, tão etéreo que a relação deles com esse disco era SAGRADA. Tratava-se do primeiro disco do Velvet Underground.
Havel contou essa história para Lou Reed, quando os dois se encontraram em Praga, livres. É possível encontrar o sagrado num disco ? É, pois já a vivenciei.
Em 1981 comprei um muito caro e muito raro disco do Velvet Underground. Jamais havia escutado a banda. A conhecia por ter lido um artigo de revista. Nenhum amigo meu havia sequer ouvido falar de tal grupo. Velvet ? O que é isso ? Cheguei em casa e o coloquei para escutar. Alí estava : a coisa mais original, ousada, diferente e corajosa que eu poderia querer. Uma sensação de plena liberdade, de perigosa loucura, de além-do-tempo. Isso ainda não era um ato sagrado. Mas durante um ano voltei toda noite àquele disco. No escuro, geralmente bebendo, sentia que eu era o único cara em todo o mundo que escutava aquele disco. Ele era meu e só meu. Falava comigo. Ensinava coisas que não podem ser faladas. Me fazia transcender minha vida. O Velvet Underground era MINHA CASA.
Mal eu sabia que 3000 caras, espalhados pelo planeta, ouviam ao mesmo tempo o mesmo disco. Sentiam exatamente o que eu sentia. E que esses caras formariam bandas e dominariam o pop mais sério pelos próximos 30 anos... Criava-se o mito de que pouca gente escuta Velvet Underground, mas que os poucos que os escutam se tornam artistas. Eu não me tornei. Mas tive uma relação secreta, íntima com aquelas músicas que jamais foi repetida com disco algum. Houve algo de sagrado alí. O Velvet era uma gruta no meio de um bosque.
Hoje é dificil para uma banda conseguir isso. Ela cai na rede, faz clip, montes de shows e perde seu aspecto sagrado, não profanado, virginal, só para voce. Todos vão tocá-la. Ela será profanada.
Portanto, é impossível se falar daquilo que é sagrado para voce. É impossível ter uma relação sagrada em grupo. Sempre será voce em relação a alguma coisa maior que a vida e o universo.
Já tive essa relação com um livro, um filme, e o tal disco. Hoje é impossível. Tudo é de todos. Todo livro é dissecado, todo filme é acessível, todo disco é pop. Tudo CAI na rede e não SOBE à eternidade. ............................. Mas ainda há uma árvore só minha. Que fala uma língua que só eu compreendo. E que me abre as portas para além daquilo que penso eu ser. Ainda existe um canto na serra. Onde nenhum mal é possível. Lá eu deixo de ser eu. Lá eu sou a serra. Mas até quando ?