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ALI

   Uma questão que fica sem resposta desde o século XVII é o que faz um gênio surgir. Mais que isso, o por que de ele nascer exatamente no momento em que nasce. ALI mudou o mundo com sua presença ou o mundo preparou o surgimento de um Muhammad Ali...essa a questão. Na verdade há uma mistura das duas coisas. O mundo em seu desenvolvimento histórico pede pelo surgimento de um homem que ocupe um lugar e cumpra um dever; e nasce uma pessoa que sente, intui e percebe o momento em que vive. Essa pessoa se ergue, levanta a cabeça e segue. Cumpre a missão. Ocupa aquele lugar.
   A geração nascida nos anos 40 é tão especial por ser a geração das oportunidades. Sim, parece um papo muito americano-capitalista, e é. Foi a primeira geração, em toda a história do mundo, a ter livre acesso a informação, a ter tempo livre, a viver dentro dos trinta anos mais prósperos do ocidente. Eles cresceram junto com o crescimento da TV, cinema a cores, rádio, imprensa underground, gravadoras de discos, voos internacionais. Mais importante que tudo, foi a geração que viveu em um planeta onde a maior parte das pessoas tinha menos de 30 anos. Baby Boomers.
   O otimismo imperava, mesmo que irado. É preciso ser um otimista para crer na paz, no direito, no amor. E na igualdade racial. ALI foi tão especial por, assim como Pelé, atender ao chamado do esporte, mas diferente de qualquer outro esportista, a atender também ao chamado de seu povo e de sua época. O futebol precisava em 1960 de um jovem mito. Pelé surgiu. Precisava o automobilismo de um jovem mártir e Jim Clark foi esse cara. Assim como o tênis, o golfe, o basquete, o ciclismo, todo esporte teve seu CARA na explosão da TV. E desse modo, Os Beatles também são filhos desse momento. O mundo queria um mito do rock. Uma fábrica de hits. A trilha sonora de um sonho. ALI se encaixa nesse panorama, mas ele o transcendeu. Foi além do que o mundo queria. Esfregou seu ego, preto e vaidoso, falastrão e sem censura, na cara de todos. Ao contrário de Pelé, Clark, ou mesmo Eddy Merckx, Rod Laver, Palmer e Chamberlain, ALI saiu do mundo da competição esportiva e se fez um porta voz de uma era. Por isso de todos eles é o único que pode-se dizer que mudou mais que sua profissão, mudou um mundo.
  Olhe para um rapper e voce verá muito de ALI. Olhe para Obama e voce verá um filho de ALI. Ele abriu caminho, dividiu mares, e o mais importante, soube unir quando foi preciso. Foi sábio.
  Muita gente no esporte depois de ALI e sua geração tentou ser mito. Para os brasileiros, Senna é um mito. Para os argentinos, Maradona. Para os italianos, Pantani. Mas nada do que Senna falou tem qualquer relevância, nada do que Maradona disse tem seriedade e nada do que qualquer outro esportista disse vai além do prosaico. ALI foi um grande Homem. Muito mais que um boxeador.
  Que Deus lhe dê a paz merecida.

O MAIS NOBRE DOS ESPORTES

Quem já disputou alguma coisa a sério sabe que sempre há uma hora em que voce quer estapear seu adversário. Não existe essa besteira de que o que vale é competir. Voce quer é ganhar sempre. E se puder, humilhar o adversário. Quem fala em "o que vale é saber perder", é aquele que já sabe ser a derrota certa.
O boxe é então o menos dissimulado dos esportes. Sim, ele tem sua máfia de resultados, doping etc. Todo esporte tem. Mas sua prática, ali, sobre o ringue, é um ato de verdade. Nada na troca de socos finge uma nobreza de delicadas atitudes. Sua nobreza é outra. É o sangue azul da coragem, do se deixar atingir, do saber se esquivar, conseguir se reerguer, e principalmente: derrubar o oponente. Eu respeito todo lutador.
Nenhum esporte é tão épico. De Ali a Sugar Ray, de Joe Louis a Marcel Cerdan, de Rocky Marciano a Carlos Monzon. Uma galeria de heróis, de martires, de loucos e de poetas do corpo. Mas principalmente: uma constelação de homens com atitude. Não é a toa ser o boxe o mais cinematográfico dos esportes, o mais jazzistico, o esporte existencialista. É um fio de navalha.
O volley jamais terá um herói. São bonzinhos. O tênis precisou de dois séculos para produzir um John McEnroe. O futebol, como disse Eric Cantona, está matando todos os seus cavalos selvagens. É uma época de Kakás e Christianos Ronaldos. George Best ou Garrincha seriam desempregados. No automobilismo não existe mais a atitude kamikase. Ela está extinta. Jim Clark ou Gilles Villeneuve jamais again. Mas mesmo na era de Jackie Stewart, Maradona, Borg ou Magic Johnson, era o boxe quem tinha Mano de Piedra Duran, Leonard ou o estúpido e fascinante Mike Tyson. Cavalos selvagens. Originais. Vira-latas únicos. Extintos.
Pessoas boazinhas odeiam boxe porque ele é violento. Bem...homens são violentos. A vida é violenta. Voce trucida um boi pra comer um hamburger e um bacaninha de um mico trucida um passarinho no ninho. Eu sou vegetariano e adoro boxe ( não o de hoje. A atual safra é a pior da história ). No ringue nada é falso, nada é cinico, não há frescura. Voce derruba o cara na sua frente. E depois o cumprimenta. Ele está lá porque quer. Voce está lá pra bater e levar na cara. Simples assim. Puro.
Tenho um certo desprezo por esportes fru fru. Coisas como volley ou ginástica olímpica. Patinação e peteca. Mas não sou tão troglô. Adoro xadrez e golfe. Curling e surfe. ( Que também deixou de produzir os Mickey Dora e Tom Curren do mar ). Mas é o boxe o esporte mais dramático, mais objetivo, mais corajoso, mais vital. Nobre.
Em mundo anônimo ele está com os dias contados. Burocratas e cientistas não suportam a doida exuberancia de um esporte de Ali e Julio Cesar Chavez. O boxe não é racional. As luvas serão penduradas. Os ringues transformados em lan houses. Tempo de guerra, de droga e de sequestros. Mas não da violencia do boxe. Tempo de mentira.
Pena......quem jamais vestiu as luvas não sabe o que perdeu.