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SUPER VELOCIDADE E CINEMA MUDO.

   Assisti ontem ao quinto Die Hard ( Duro de Matar ). É de longe o pior da série. Ele me fez ter uma iluminação: as cenas de ação são tão editadas, tão mal filmadas, tão tremidas, que tudo não passa de uma maneira picareta de se esconder a ruindade dos cenários e a inverossimilhança da ação. Entedia-me!
   Veja a primeira cena: uma longa perseguição em que centenas de carros são destruídos. Na verdade a gente nada vê do que acontece, a gente acha que viu. O que percebemos são imagens em tremedeira, flashs de ruas, carros mal filmados, explosões a distancia. Não conseguimos perceber nada, apenas a câmera e a hiper edição histérica. É a vitória da idiotia, do tosco, da não apreciação estética.
   Ao mesmo tempo fico sabendo da estréia de mais um grande filme "mudo". E em p/b. Quando O Artista venceu, com justiça, o Oscar, muita gente achou que era apenas uma excentricidade passageira. Pois é, temos agora dois filmes mudos em cartaz, e veja só, ambos são excelentes. Why?
   Simples. É um pequeno movimento daqueles que pregam o CINEMA COMO CINEMA. É a radicalização do cinema. Moderninhos, que "acham" ser espectadores "anti´pop", assistem Wes Anderson ou Von Trier sem imaginar que aquele é um cinema de retorno garantido, um tipo de filme "Saramago", pseudo-arte-livre em pseudo-filmes-arriscados. Como Saramago, são filmes feitos para agradar aqueles que querem ser "diferentes".
   Tabu, assim como este filme de Pablo Berger, deseja e faz aquilo que deseja. Ao optar pelo p/b mudo, ele vai ao extremo oposto do hiper-barulhento estridente ou do azulzinho com musiquinha da Bjork. Criam um mundo que jamais se parece com o ontem, e nada remete aos video games ou ao café chique dos inteligentinhos da PUC-USP de agora. É mundo atemporal do cinema e SÒ do cinema. Nada tem de literário ou de teatral. Muito menos publicitário.
   No Estadão falam seus dois bons críticos que Berger é fã de Tod Browning e seu filme Freaks e de Charles Laughton e a obra-prima O Mensageiro do Diabo. Ou seja, Berger vai no âmago do pesadelo. Pesadelo que não é da pintura, da filosofia ou de algum livro, pesadelo que é cinema. Influenciado por filmes, só por filmes.
   Sempre que uma arte entra em crise de criação, sua saída é estudar a origem, a raiz da paixão. Um pintor olha Giotto, um escritor olha Homero e Dante, um músico vai ao folclore. O cinema busca os anos 20/30. Pode ser uma saída. Isso se o público souber voltar a olhar.
   PS: Sim, eu sei, o filme de Laughton é de 1958. Mas tudo nele remete ao cinema de Lang, Murnau e Leni.

LUMIERE E MIGUEL GOMES

   O último filme que assisti no Lumiere foi ruim. Melinda e Melinda, de Woody Allen em 2002. Faz tempo. Eu sempre adorei cinemas de rua. Estacionar o carro e andar na rua até a sala. Depois sair da sala escura e topar com a rua e sua realidade imediata. E o povo que ia aos cinemas de rua. Sempre os mesmos, gente do bairro, gente que se conhecia, familias inteiras. Era um público mais velho. Lembro de um bando de senhoras de meia-idade que riam a cada cena de Allen. E ainda sinto o cheiro de pipoca que entrava na sala. Assim como circo, o cinema de bairro acabou. Existiam salas em todo bairro. Basta dizer que o Caxingui tinha uma. A Vila Sônia outra. Era ponto de encontro dos moradores todo domingo de noite. E todo sábado havia a sessão das onze da manhã, desenhos para as crianças da vizinhança. Foi-se com o Circo.
   Miguel Gomes e Tabu. Vai ser o filme do ano. Para quem ama o cinema e o conhece. O Cahiers o elegeu o filme de 2012. Opinião do Cahiers nada significa pra mim. Mas opinião da Sight and Sound sim. E ela também o colocou nas alturas.
   Tabu é nome de filme de Murnau. E a personagem feminina se chama Aurora, nome do melhor filme de Murnau. Aliás, Aurora seria o melhor filme da história se não houvesse O Atalante.
   O filme de Miguel é em preto e branco suntuoso. E fala da colonização. Mas o que mais me interessou é a frase que ele falou na entrevista: " O público precisa voltar a crer no cinema." Crer no que vê. O público se comporta como velhos, descrentes, céticos, distanciados. Não se maravilham, não se deixam levar, não acreditam nas imagens. Perfeita a fala do Miguel.
   A quanto tempo voce não chora no cinema? Voce torce pelo herói acreditando no Homem de Ferro, ou se emociona sabendo todo o tempo que aquilo é um filme e que ele é um ator e nunca Tony Stark?
   Quando vejo Rastros de Ódio acredito todo o tempo que aquilo é real. Vivo horas no western. Aquele que vejo não é John Wayne, é Ethan. E John Ford não é nunca um cineasta, é um tipo de deus, o criador de um mundo que existe de fato. Essa é a fé no cinema. Olhar com olhos de criança. Se entregar a criação e ver nisso a verdade maior que a realidade.
   Meu pai adorava filmes. Filmes, não cinema. Ele conhecia e adorava John Wayne, Burt Lancaster e Gregory Peck. Mas vendo os filmes, e como ele se emocionava!!!!, ele se deixava levar não pela "arte" de Ford, Hawks ou Stevens, ele era levado pela história contada.  Aquela narrativa se fazia real, ele testemunhava a realidade criada. Sua emoção era por Shane, por Rick, por Ward, e não pelo ator.
   Essa uma visão que precisaria ser revivida e que eu acho ser irrecuperável.
   Pena.
   O filme de Miguel deve ser ótimo. Torço por isso.