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A ALEGRIA DE VIVER: RIGOLETTO

Há aqui toda a Itália. Não o país folclórico, aquele de Rossini, que aliás adoro, mas a Itália do campo, das flores, do sol marítimo, do desejo de amar. Nietzsche, em um dos seus mais espetaculares erros, disse que Wagner era Dionísio em música. Mais tarde ele percebeu que o alemão nada tinha da vitalidade do sol e do vinho. Wagner era nórdico, da neve, dos deuses do Valhala. No Mediterrâneo Nietzsche encontrou o espírito grego, solar, livre, na música de Bizet. O filósofo alemão não disse isso, mas essa vitalidade está presente aqui, desde 1851, no Rigoletto de Giuseppe Verdi, a ópera feliz. Profundamente italiana, profundamente erótica, cada minuto de música é desejo de respirar, de sentir calor na pele, de encontrar o amor. Tudo é invenção melódica, Verdi é gênio na criação de melodias que grudam na mente. Duas árias aqui se tornaram conhecidas do mundo, são hinos de nossa civilização, mas a obra, prima, tem mais, bem mais. A orquestra colore as vozes, que ao estilo italiano, são o centro e a alma da música. Coros e solistas, vozes femininas e masculinas, tudo é um encontro, uma celebração. Popular e erudito, esta é daquelas invenções que parecem ter sido criadas pela natureza. ( Observe como toda obra de gênio transcende quem a criou e se torna uma coisa viva e sem dono ). --------------- Carlo Maria Giulini, não há maestro mais indicado para estar aqui, rege a Filarmônica de Viena. Placido Domingo, em 1980, jovem, em seu auge, toma a obra para si. Há um momento, voz solista contra coro distante, que dá arrepios na alma. Gravação DG. Quem vive escutará.

JOHANNES BRAHMS

Reza a lenda que na saída de emergência do Metropolitan de NY, havia uma placa onde se lia: Em caso de Brahms, saída. ------------ Para Johannes Brahms não há meio termo: ou voce não consegue o escutar ou se encanta com sua música discreta. Um dos compositores mais famosos do mundo, ele chegou a ser chamado de novo Bach e novo Beethoven. Hoje tem uma sólida posição na história. É o mais respeitado após Bach, Mozart, Haydn e Beethoven. --------------- Mas continua a ser chamado de chato e muita gente adormece em seus concertos. Por que? Não é dificil responder. Por ser discreto, o anti Wagner, o anti Tchaikovski, Brahms exige atenção, completa a focada atenção. Se voce o escutar com 70 ou mesmo 80% de sua atenção, tudo que voce irá perceber é uma massa de violinos e de sons que nunca se afirmam. Enquanto Wagner pega uma melodia e a berra em seus ouvidos, enquanto Tchaikovski passa meia hora chorando sem parar, Brahms apenas sussurra a melodia e quando triste, deixa que voce perceba isso. Brahms é portanto um aristocrata. Ele não se dá de barato. Mas esse anti-apelo não é aquele do modernismo, em que se faz uma obra hermética para afugentar os filisteus, não, Brahms tem pudor, tem elegância, nunca e jamais exige qualquer coisa de voce. -------------- Ouço a quarta sinfonia com a Filarmônica de Viena, regente Bernstein. Nos momentos em que consigo me concentrar, sou filho de meu tempo, concentração é capacidade de poucos, percebo a riqueza melódica de Brahms. Em meio a uma massa sonora oceânica, irrompe a melodia que logo se vai. Não são ondas sonoras, são correntes submarinas. Quando me distraio com um pensamento, pronto, perco a corrente e passo a divagar em meio ao mar de acordes discretos. Brahms é sempre discreto. ------ Não, não me apaixonei por Brahms, não dessa vez. Mas também não o desprezo como um chato. Há nele algo que não capturei ainda. Um apelo secreto. Em oposição a Wagner, que nos joga tudo na cara, ele esconde as cartas e espera que as revelemos.

RICHARD WAGNER, O HOMEM QUE DEU ORIGEM AO "WAGUINÃO"

Richard Wagner foi uma estrela tão grande, que no Brasil seu sobrenome virou nome e Wagner passou a ser "Guinão" ou "Waguininho". Ele levou a idolatria a níveis nunca vistos e conseguiu até mesmo criar Bayreuth, um festival anual onde desde então suas óperas são encenadas. A cidade alemã vive em função de Wagner. O último e o maior dos românticos, Wagner levou aos limites o sonho do romantismo: seu ego cresceu às alturas de Napoleão e sua obra se tornou paradigma. Tudo que veio após Wagner era consequência de sua obra. Mesmo aqueles como Verdi e Brahms que eram seus oponentes. Mas o que exatamente ele fez? ------------------------------- No campo puramente musical, ele libertou a orquestra da submissão ao canto. Quando ouvimos Rossini ou mesmo Mozart, notamos, surpresos, o quanto a orquestra é submissa a voz. Toda a ópera existe em função do cantor. O acompanhamento fica ao fundo, em Rossini e nos italianos em geral, bem ao fundo. Wagner faz da voz humana mais um instrumento. Voz e orquestra dividem atenção. Outro fato: tudo é cantado em alemão. Apesar da Flauta Mágica ser em alemão, toda ópera, de todo país, tinha de ser em italiano. Isso foi revolucionário, pois foi um ato de rebeldia nacionalista. Wagner afirmou a existência da nação alemã. E como tema de sua obra, criou uma mitologia germânica, o passado medieval alemão, passado que só existiu na sua cabeça. Afirmando seu ego Wagner afirma a Alemanha. --------------------------------- Nietzsche a princípio viu em Wagner o Super Homem, o ser superior dono de seu destino. Mas eles logo brigaram. Nietzsche começou a perceber em wagner o culto da morte e não da vida. Não havia sol no alemão e Nietzsche passou ao lado dos italianos, os solares mediterrâneos. ------------------------- Paulo Francis amava Wagner e gostava de dizer que ouvir Wagner sob efeito de maconha era uma experiência "muito louca". Como todo wagneriano, Francis ouvia Wagner em qualquer ocasião. Servia para amor e para guerra. Desculpe Francis meu heroi, mas ao ouvir Wagner ontem, versão Karl Bohm, Sinfônica de Viena, o odiei muito. A música de Wagner é para mim insuportável. Não faz sentido! Faço minha as palavras de seus críticos de 1880: é somente barulho. Melodias rudes, secas, sem sentido, desenvolvimento atabalhoado, pianíssimos e fortes que se sucedem sem parar....Wagner ama variar o volume e parece uma criança brincando com o botão de High and Low. Não consigo prestar atenção em Wagner. Não me diz nada. É aborrecido. Okay, sei que sou um leigo, mas por Jorge!, consigo sentir em Prokofiev a arte em seu barulho e na riqueza de Dvorak suas linhas melódicas. Nada sinto de bom em Wagner. Nada. Tudo é exagero. Tudo é histeria. Tudo é....sinto muito....adolescencia. --------------------------------------------- Wagner sonhou em criar a arte total: na ópera tudo seria superlativamente misturado: música, teatro, arquitetura nos cenários, pintura, literatura no texto. Dizem que o cinema fez de seu sonho uma realidade. Tendo a concordar, Wagner faria filmes se tivesse nascido 50 anos mais tarde. E talvez resida aí sua fraqueza. Como algumas boas trilhas sonoras de grandes filmes, sua música talvez pareça mais viva quando no palco. É preciso cenário. É preciso luz. É preciso cor. Então não seria a música de wagner música pura, mas sim música de cena. Ele daria um genial diretor de musicais na Hollywood dos anos 50. E nisso vai meu elogio sincero.

LISZT E O AUTÊNTICO ROMÂNTICO

Chorar não é um ato romântico. Liszt nunca é choroso. Acabo de reouvir o concerto número um para piano e orquestra de Franz Liszt. Versão soberba com Richter, Um pouco mais rápida do que eu costumava conhecer. Trevas. Aqui a música, rica, varia entre as trevas da maldição e a melancolia da vida danada. É um concerto mágico. ------------------ Franz Liszt foi o primeiro artista da história a ter seu nome ligado à expressão MANIA. Era a Lisztomania. Sim, os Beatles usaram o nome cem anos depois. Liszt era o homem mais famoso do mundo e era seguido por fãs, jornalistas, reis e plebeus, fosse onde fosse. Em seus concertos as meninas berravam e molhavam suas saias. Invadiam o palco para lhe jogar flores. Ele podia ter a mulher que quisesse, e as teve. centenas. O mito se fez: Liszt tinha um pacto com o demônio. Liszt tocava tão bem por ter vendido a alma ao diabo. Liszt não era deste mundo. Artistas do futuro usariam todos esses slogans também. --------------------------- A verdade é que ele se interessava sim, por magia negra e tudo que envolvesse mistérios proibidos. Era um romântico, o mundo normal não lhe satisfazia. Jamais. Porém, e é aí que entra seu lado mais complexo, quando jovem Franz estudara para ser padre católico ( Liszt era húngaro, Franz era na verdade Férenc ). Ao fim de sua longa vida, ele iria se isolar e retornar à religião. Liszt morreria aos 75 anos como abade. ---------------------- Sua música influenciou Wagner. Os dois foram amigos, mas Liszt logo se afastaria. Ele não suportou o mal caratismo do alemão. Como todo romântico, para Liszt a arte é a expressão de seu eu individual. Mas, felizmente, ao contrário de Tchaikovski, o eu de Liszt é interessante. E nada choroso. Em sua música há sempre algo do brilho furioso dos eslavos. Sua melancolia é altiva e ativa e sua alegria é eufórica. Ele foi o primeiro compositor clássico que admirei. Este concerto é uma bela porta de entrada para este mundo.

CORAÇÃO DEVOTADO À MORTE, O SEXO E O SAGRADO EM TRISTÃO E ISOLDA DE WAGNER. - ROGER SCRUTON.

   Kant, Schopenhauer, Auerbach, Nietzsche, Wittgeinstein, Freud, Merleau-Ponty, Foucault e Girard. Todos são citados várias vezes por Scruton e todos são, ao final, refutados pelo filósofo inglês. Refutados em relação aquilo de que se ocupa o livro, o erotismo e a morte. Uns mais outros menos, todos revelam algo de reducionista ao evitar o tema ou a aborda-lo de uma maneira que o descreve DE FORA e jamais de dentro. Scruton não tem medo. Ele não evita entrar no sentimento e no ato, na fantasia e naquilo que sabemos acontecer mas que não conseguimos entender. Roger Scruton aceita o não-saber. Para ele é isso o sagrado: fazer, aceitar, repetir, seguir, sem jamais entender. Saber que ali há algo que foge ao entendimento e que por isso pode ser puramente ilusório. Mas não parece ser. E por isso ele, o mistério, é confirmado em atos, objetos, lugares que são aquilo que precisam ser. Para Scruton o homem é sagrado. Por mais que o cinismo atual ria disso, ele é.
  Somos corpos reais que se percebem no limite da realidade. Enquanto corpo estamos no mundo, enquanto sujeitos estamos observando o mundo de um lugar que sempre nos parece fora da realidade corporal. É o que nos define como seres não-animais: olhamos para nós mesmos, analisamos o que somos e o que devemos ou não queremos ser ou fazer. Temos escolhas. Ao contrário dos bichos, estamos sempre decidindo, antecipando, planejando. Nosso corpo, real como é uma pedra, se move entre as coisas como ser que funciona por instinto. Nosso eu, colocado à parte do real, olha e tira ideias, cria e lembra.
  Dentro dessa verdade, o Amor-Erótico surge como o momento em que o corpo e o sujeito se unem em um só. Eu amo a pessoa que está naquele corpo. Ao contrário da pornografia, não é aquele corpo que desejo, o que desejo é quem está naquele corpo. A pessoa e o corpo se tornam um só para mim, e eu me torno um só para ela. E, contra a ideia de Freud, de que a paixão era nada mais que um tipo de fome ou sede, algo mecânico e animal, só aquela pessoa pode fazer por  mim o que faço por ela. Ela é insubstituível. Única em um universo.
  Scruton vai em frente e toca na escolha. Para ódio dos modernos, não podemos escolher a quem amar. Somos presos do acaso. Mas podemos escolher como amar essa pessoa que nos surge. E vem daí a ópera de Wagner. Scruton a disseca em texto e música. Lenda vinda da idade média, ela fala de um sobrinho que se apaixona pela mulher prometida ao tio. E ela o ama do mesmo modo. Tudo termina em morte e em vitória do amor. ( Contei a história de um modo bem simplificado ). O que Wagner mostra é que amor e morte são a mesma coisa. Todo amor verdadeiro só pode vencer se encontrar a morte. E essa morte é o modo que o amor encontra de durar para sempre.
  Wagner não acreditava em Deus. Mas amava o budismo. O amor era, para ele, o modo de se deixar dissolver no Nada e a morte se tornava assim uma libertação da ilusão. O amor de Tristão e de Isolda seria profanado se tivesse de viver em meio às exigências do mundo fútil e vazio do dia a dia. Para ele viver puro e perfeito ele precisa morrer.
  Scruton aceita isso e vai adiante. Para ele, esse amor não precisa de um deus para ser sagrado. No olhar que reconhece, na individualidade de cada amante, vive a eternidade da particularidade que só o sujeito pode ter. No amor e na morte o Ser se afirma como sujeito livre. Ele sai do mundo das contingencias, das obrigações, e passa a se mover no mundo das escolhas e dos riscos. Sim, ele não escolhe seu amor, mas como disse, ele escolhe manter esse amor no nível do AMOR CORTÊS, o mundo do amor que significa, que simboliza, que vai além. O amor que nega a fome, a pornografia. ( A pornografia é o desejo que transforma o amado em objeto desfrutável e intercambiável. Ela vive da dessacralização do amor e da ofensa ao corpo ).
  A música de Wagner, sagrada e prova de um eu criador, leva o ouvinte para dentro desse erotismo que, como todo erotismo, coloca os amantes fora do mundo real e dentro do mundo com sentido. Para o casal, só eles existem, só eles são vivos, só eles podem durar. Na morte eles dizem ao mundo que escolheram seu destino. Saíram do mundo dos fenômenos e adentram a liberdade. Deixam de ser dois e se tornam parte de um todo onde não há eu e voce.
  Qualquer um de vocês, se já amou de verdade, sabe do que falo. Por mais ateu, ou cínico ou frio que voce seja, sabe que no amor há a companhia da morte. O mundo inteiro morre para os amantes. O passado morre. O que existe é o amor e o medo de que ele se perca. Há um momento em que sentimos a proximidade da morte. "Se ela se for eu morro".
  Não se engane. Ela se foi e voce morreu.

TOLSTOI, A BIOGRAFIA, ROSAMUND BARTLETT.

   A Rússia não existe. Nem Europa, nem Ásia. A coisa mais sensacional deste ótimo livro é fazer nos sentir dentro da Rússia. E a Rússia não é fácil não! Coisas que só existiam no país. O SANTO-TOLO por exemplo. Pessoas que vagavam pela nação, mendigando, sendo recebidas como santos homens e como tolos ingênuos. Aristocratas culpados. Não havia no mundo aristocratas tão esbanjadores e cercados de luxo como os russos. E ao mesmo tempo, em nenhum outro país acontecia de tantos deles largarem tudo e se tornarem peregrinos pobres. Tolstoi viveu todos os meandros da alma russa. Foi a encarnação daquilo que o país pode ser e será. Penso agora se há na Inglaterra alguém que encarne e alma inglesa. Ou nos USA. Ou na França. Talvez Wagner seja a alma alemã. Mas não há um só artista ou filósofo que resuma em si a alma da França, da Inglaterra ou de qualquer outra nação. Tolstoi é a Russia. E isso é muito complicado.
  O livro começa traçando as raízes da família aristocrata do autor. Pai e mãe têm origens nobres, a mãe com mais dinheiro, o pai com muito história. As primeiras 200 páginas do livro são sublimes. Tios e tias com vidas sensacionais. E alguma dolorosas. E então nasce Liev Tolstoi, em meio a muitos irmãos, parentes, servos, visitas, na imensa propriedade de Iasnaia Poliana. ( Servos eram parte de uma terra. Não podiam ser vendidos, portanto não eram escravos, mas eram parte das terras dos nobres, como eram as árvores e as casas ).
  O jovem Tolstoi usou sexualmente as servas, se apaixonou, caçava, brigava muito, duelou, serviu na guerra. Foi um jovem inquieto, cheio de ideias, dúvidas e excesso de energia. Desde cedo tinha paixão por vida no mato, exercícios. Mas a guerra o mudou. A absurda guerra da Crimeia, a luta contra turcos e ingleses. A Russia era então um esbanjamento. Muito dinheiro usado para o luxo, muita repressão politica e a religião ortodoxa. Tolstoi seguiu a fé de seus pais, por algum tempo. Começa então a escrever em revistas, em jornais. Publica pequenas histórias e logo se torna o escritor mais famoso da Russia.
  Faz amizade com Turgueniev, mas logo brigam. Nunca encontrará Dostoievski. Este admira Tolstoi, mas Liev o ignora. São opostos. Escrever Guerra e Paz é um prazer. Sonia, sua esposa de origem alemã, passa a limpo o texto. A obra estoura e vende muito. Pronto, ele é famoso. Mas existem os servos e Liev começa a mudar.
  A obra de sua vida é fazer o bem aos pobres. Incrível como Tolstoi passa a desprezar sua vida de artista. Ele dá muito mais valor às cartilhas educacionais que redige e imprime que ao seu livro de sucesso. Tolstoi quer educar o povo russo e abre escolas, inventa métodos educacionais, percorre as aldeias. Começa a ser perseguido pelo estado.
  Mas há a escrita. Ana Karienina é um martírio. Tolstoi escreve com dor, com desprazer, como obrigação. E o sucesso é mundial. Karienina se torna o romance mais famoso de seu tempo e Tolstoi o mais admirado dos autores. Mas ele continua a mudar.
  Pensa na morte, entra em crise, cria uma religião. Lança textos e livros religiosos, traduz evangelhos do grego, faz palestras, funda o "tolstoismo". Eis a obra da sua vida.
  Torna-se vegetariano, pacifista, influencia o jovem Ghandi. Comunas tolstoianas surgem nos Canadá, nos EUA, na Inglaterra. Ele prega o fim da propriedade privada, o sexo apenas como reprodução, o fim do estado, o trabalho como bem maior. Trabalhar com as mãos, comer o que se planta e seguir Jesus Cristo. Tolstoi é o guru da Russia e uma das pessoas mais famosas do planeta. E ao mesmo tempo passa a ser odiado pelos ortodoxos e pelo governo russo.
  Ele se abstém de suas posses, se afasta da família. Vive em trapos, como um santo-tolo. Prega a paz e a resistência pacífica. Então vem a Primeira-Guerra, a revolução de 17 e o bolchevismo. Tolstoi é considerado o precursor de Lenin. Lenin o admira, mas Liev é contra o estado, o que cria uma rusga entre as duas filosofias. Tolstoi morre em 1910, numa estação de trem. Seu enterro é um evento mundial e sua casa centro de peregrinação. O livro segue sua esposa e seus filhos até os anos 30.
  A vida de Tolstoi é o desconforto de um gênio com o mundo onde lhe coube nascer. Escrever era pouco para ele. O que ele desejava era mudar o mundo. Acabar com toda a violência. Trazer a verdade do cristianismo para o centro da politica. Dar comida e educação aos pobres. Dignidade a todos.
  Em 2017 ainda matamos bichos para comer bife. Ainda fingimos não ver os rostos de esfomeados. Rezamos sem atentar para nossa mentira fundamental: somos violentos. Educamos sem salvar. Vivemos sem agir. E a Russia, terra que Tolstoi amava mais que tudo, ainda é esbanjamento e luxo.
  Ler Anna Karienina foi um dos pontos fundamentais de minha vida.