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THE GOOD, THE BAD AND THE UGLY

Por volta de 1972, meu primo cantava o tema de Ennio Morricone enquanto brincava de cowboy. O assobio, e o vocal. Como pode um cara criar uma coisa tão esquisita? "aaaaaa....fiu fiu fiu....aaaaaaa....fiu fiu fiu..." Um moleque no Caxingui de 1972 cantava isso no meio do mato. E eu, com 9 anos, conhecia a canção. Canção? ------------- Nós perdemos a noção conforme o tempo passa. Mas podemos tentar imaginar. Como deve ter sido emocionante, em 1967, entrar numa sala escura, digamos na avendida São Luis, imensa sala, e ser invadido sensorialmente pela primeira audição do tema de Ennio Morricone. E também pelos letreiros do começo do filme. Desenhos de cowboys e sangue que se esparrama. E então o sol inclemente. Alguém já percebeu que o tema do filme é o sol? -------------- Primeiro um fato: Eu não sou fã deste filme. Nem de Sergio Leone. Acho seus filmes longos demais, me cansam. Uma edição faria bem a eles. Eu eliminaria do roteiro toda a história da prisão no acampamento militar. Uns 15 minutos que não fariam falta. Por outro lado eu reconheço sua genialidade. Ver este filme hoje é ver um filme que não envelheceu um só dia. Por isso, apesar de não ser um dos melhores westerns já feitos, é o mais amado pelo público em geral. Ele é contemporâneo. Pois no fundo, no âmago, não é um western. É um filme policial, um filme de samurai, uma comédia, mas não um western. -------------- Já comprei brigas em grupos de amantes de faroeste por isso. Para 90% deles, é este o melhor filme da história. E eu ouso o criticar. Não gosto da paisagem. É óbvio ser a Espanha. Os EUA não têm aquelas plantas, aquelas montanhas, e até a luz é outra. A comida tem batatas!!!! Cowboy não come batatas e muito menos usa prato de barro. As casas são de tijolo e há ainda uma cena entre monges católicos, além do que todos os coadjuvantes nos lembram que o filme é italiano. Se movem como gente de contos de Boccacio e não como americanos. As caras, imensas, são latinas. E na longa cena no deserto a gente percebe que esse deserto tem vegetação. Mas por outro lado.... ------------ Há uma sequência no filme que chega a causar espanto. Cada frame, ou take, é uma foto icônica. Todas viraram monumentos. Lá está o close em Clint. Os olhos. O charuto. A capa de lã. A cara suja de Elli Wallach. O sol. A cara ruim de Lee Van Cleef. Clnt com a capa puxada para trás. O chapéu. Cada segundo é um meme, um poster, uma foto de antologia do cinema. Não há como negar: é um dos filmes mais importantes da história. E nos últimos 60 anos, é o mais central. Mais que Bonnie e Clyde. Mais que 2001. Mais que Mash. Talvez apenas O Chefão de Coppolla tenha tanta centralidade. Nele vemos todo o cinema do futuro. ( Não por acaso é a Bíblia de Tarantino. Tudo o que ele fez está aqui. ) -------------- Leone, dizem, não queria Elli Wallach no filme. Pra quem não sabe, em 1967 ele era o mais famoso dos três. Grande ator de teatro. Grande no cinema. Ele tem uma das melhores atuações cômicas já vistas. Tuco é um palhaço. Tudo que faz dá errado. Sem ele o filme não teria vida. Lee Van Cleef é o ponto fraco do filme. E temos Clint Eastwood, o mito. O imortal. -------------- O filme é feito para amarmos Clint Eastwood. E a questão é: outro ator saberia tomar partido desse papel? Eis o grande mérito de Clint: ele recebe esse presente e sabe o usar. É uma personagem para dar ao ator condição de mito. Clint o toma para si. Sem ele, com um ator sem seu carisma, o filme seria outro. Seria vulgar. Seria vazio. Apenas Steve McQueen teria o dom para tal papel. Mas Steve em 1967 já era uma grande estrela. O que vemos aqui é a construção de uma grande estrela. E nisso o filme é exemplar. ---------------- Toshiro Mifune é o molde de Leone. Seus épicos são o esqueleto dos de Leone. O mesmo tamanho. O mesmo tipo de personagem. A força da música. Clint é um samurai. Por isso a capa. Por isso ele se move como se fosse usar uma espada. Leone intui, genialmente, que o filme de samurai do ocidente é o western. Ele acerta. Clint acerta. O futuro o prova. -------------------- É um grande filme icônico.

JORI IVENS- KEVIN KLINE-HENDRIX-MAN RAY-ERROL FLYNN-SAMURAI

   A ESPADA DA MALDIÇÃO de Kihachi Okamoto com Tatsuya Nakadai
Primeiro filme da caixa número dois Cinema Samurai. Bastante forte este filme sobre um samurai que tem forte impulso de matar. Pessimista, o final fica na memória. Nota 7.
   A LÂMINA DIABÓLICA de Kenji Misuni com Raizo Ichikawa
Um grande ator faz o papel de um órfão que tem o apelido de homem-cachorro. Humilde, ele é humilhado por todos. Achei este o menos bom da caixa. Nota 6.
   SAMURAI ASSASSINO de Kihachi Okamoto com Toshiro Mifune
Um grande filme! Mifune brilha como um samurai desencanado, e o enredo trata de traição e vingança. Cenas de luta maravilhosas e uma fotografia estupenda! Nota 8.
   A ESPADA DO MAL de Hideo Gosha com Mikijiro Hira
Uma obra-prima. Um samurai mata um inocente e a partir daí se desenrola toda a trama. O clima do filme, lama, chuva, closes, remete a Kurosawa. Tenso, dark, é um filme de aventuras que humilha os filmes de aventuras. O requinte estético é sublime. Nota DEZ.
   TIRANIA de Hideo Gosha com Tetsuro Tamba
Uma belíssima obra-prima! Passado todo á beira de um mar de inverno, corvos, as imagens ficam na memória. Pescadores são massacrados. Um samurai discorda disso. O resto é uma rede de medos e de segredos que deixam o espectador ligado e excitado. Forte componente erótico e forte componente de drama. Um filme belíssimo! Tem de ser visto. Nota DEZ!!!!
   O FILHO DO DESTINO de Kenji Misuni com Shigeru Amachi
O mais curto. São apenas 70 minutos, mas quanto drama há aqui! Um órfão e seu triste destino. Ele falha em tudo! Duro e tristíssimo. Nota 7.
   A ÚLTIMA AVENTURA DE ROBIN HOOD de Richard Glatzer e Wash Westmoreland com Kevin Kline, Susan Sarandon e Dakota Fanning
Errol Flynn merecia coisa melhor! O filme mostra o último amor de Flynn. Já decadente, drogado, ele se apaixona por uma aspirante a atriz de 17 anos ( na vida real ela tinha 15 ). A mãe da menina é a megera ambiciosa que se espera. Dakota está muito fraca e Kevin tenta dar vida à um papel muito raso. O filme é feio, desagradável, árido. Talvez o filme mais esquisito do ano. E creia, por mais que o assunto seja ótimo e pudesse dar um grande filme, este é muito, muito ruim.
   JIMI, TUDO A MEU FAVOR de John Ridley com André Benjamin, Hayley Atwell e Imogen Poots.
Ridley fez a opção certa! Apesar de poder frustrar os fãs, ele escolheu mostrar apenas dez meses da vida de Hendrix. A transição de 66 para 67. O estilo do filme tenta copiar o tipo de cinema moderno da época e temos um ator fazendo Clapton que é sósia dele. Jimi é bem interpretado e apesar de fisicamente ele ser muito mais "viril", André segura o papel. A atirz que faz Linda Keith é de uma beleza mágica. Não vi mulher mais bonita no cinema atual. Um detalhe: o filme é dela. O roteiro centra na relação dela com Jimi. Ponto ruim: os herdeiros não liberaram música nenhuma. Só ouvimos covers que Jimi gravou. Hey Joe, Like a Rolling Stone... Eu gostei bastante e acho este um dos melhores filmes de rock entre os mais recentes. Nota 7.
   LE COQUILLE ET LE CLERGYMAN de Germaine Dullac
Estou revendo o box dos filmes avant-garde. São curtas feitos por artistas que tentaram transformar o cinema em outra coisa. Nos anos 20 a arte teve uma escolha a fazer: ou a narração realista, ou a poesia sonhadora. Todos os filmes aqui optam pelo sonho. O partido do realismo venceu. Mesmo nossos filmes mais ousados têm sempre um pe´ no sentido do real. Eles devem fazer sentido. Ter começo e fim. Este que destaco do disco um, é belíssimo! Um delírio que mistura igreja, mar, natureza, mulher, medo e desejo. Não procure sentido. Não procure simbolismo. Ele é exatamente o que parece ser. Nada mais. Nota DEZ.
   L'ETOILE DU MER de Man Ray
Sim, Ray foi um grande fotógrafo avant garde, amigo de Duchamp e dos surrealistas. Este delírio é de uma beleza refulgente. Kiki de Montparnasse é a atriz. As imagens fazem com que sonhemos acordados. Nem Bunuel fez imagens tão próximas do que é um sonho. Nota MIL.
   MENILMONTANT E BRUMA DE OUTONO de Dimitri Kirsanoff
Este é um filme que virou mito. A história trágica de uma mãe solteira. A atriz principal beira o milagroso. O filme parece um documento do sofrimento. Ela fica na rua, com o bebê....é doloroso. É real e é estranho. Impossível fazer hoje um filme tão pouco cínico. Nota DEZ. Bruma de Outono é apenas bonito.
   REGEN de Jori Ivens
Chove em Rotterdan. Apenas isso. Documentário em estado puro. A chuva cai. E é só. E com isso, o famoso doc holandês fez um dos mais belos filmes já feitos. A beleza, simples, banal, se torna eternidade e magia. Ivens amava a vida. Muito. E o que nos resta é amar seu filme. Muito. Uma obra-prima. Como dar nota.....
  

DOM HEMINGUAY/ MUSASHI/ TOSHIRO MIFUNE/ AVA GARDNER/ X MEN/ CHEF/ MARION COTILLARD

MOGAMBO de John Ford com Clark Gable, Ava Gardner e Grace Kelly
Gable é um caçador, Ava uma mulher de passado duvidoso, Grace uma esnobe. Entre bichos e nativos os 3 se envolvem em disputa amorosa. O filme é bastante tolo. Irremediávelmente ultrapassado, vale pela beleza luminosa de Ava Gardner. Nota 3.
CHEF de Jon Favreau com Jon Favreau, Sofia Vergara, Scarlett Johansson, Dustin Hoffman e Robert Downey Jr.
Um bom filme. Simpático apesar de nada especial. Um cozinheiro briga com o dono do restaurante e acaba por abrir um trailer de fast food chique. Nesse momento ele reata relação com ex-esposa e filho. De ruim temos todo o começo do filme. De muito bom a parte estradeira, rodovias e paradas. A relação pai e garoto muito bem desenvolvida. Que beleza essa Sofia Vergara!!!!! Nota 6.
O GRANDE GATSBY de Jack Clayton com Robert Redford, Mia Farrow e Bruce Dern
Um amigo me avisara que o filme era ruim. Revi. Aff. É ainda pior que o musical idiota. O musical manteve ao menos duas falas de Scott Fitzgerald, aqui nem isso. Erros se sucedem: Mia é deplorável. Gatsby é no livro um homem frágil que tenta agradar, uma alma romântica perdida num mundo materialista. Aqui é apenas um bom ator sem um papel para representar. Pior que tudo, a trilha sonora de Nelson Riddle. Está no filme errado. Nota ZERO.
ERA UMA VEZ EM NOVA IORQUE de James Gray com Marion Cotillard, Joaquim Phoenix e Jeremy Renner
Apenas um drama escuro que ficaria bem como minissérie da Globo. Ok, Gray sabe narrar, os atores estão muito bem, a coisa é séria, mas...quer saber? E daí?? O filme é desprovido de invenção e de beleza, e portanto não me emocionou. Pobre polaca. Nota 3.
UM PLANO BRILHANTE de Joel Hopkins com Emma Thompson e Pierce Brosnan
O filme é tão bobo que ele consegue juntar dois atores excelentes e adoráveis e fazer dos dois uns malas sem alça. Filme sobre ricos que ficam pobres e então resolvem roubar o cara que os faliu. Emma tem de pular, cair, rir, fazer-se de tola, saltar, escorregar. Tudo para tentar arrancar um riso de nós, e não consegue. Soberba atriz, ela está no filme errado. Assim como Pierce que tem sua classe muito mal utilizada. Uma bobice sem fim. Nota 2.
A RECOMPENSA de Richard Shepard com Jude Law, Richard E. Grant e Demian Bichir
Dom Heminguay. O homem do pau gigante, o cara da mente fulgurante, o ser que fulgura no florão da Europa, gigante pela própria natureza. O Bob Le Flambeur dos desesperados, o Samurai dos anos 2000, o fodido. Dom aguenta a prisão e ao sair é traído pelo chefão que protegeu. E a coisa, sua vida, cai ladeira abaixo. Que roteiro do caralho! Falas baby, falas maravilhosas! Personagens adoráveis! O filme é engraçado e terrível, como a vida? Shakespeare podre de nosso tempo. Nota 9.
A MALDIÇÃO DO ESPELHO de Guy Hamilton com Rock Hudson, Elizabeth Taylor, Kim Novak, Tony Curtis, Angela Lansbury, Geraldine Chaplin e Edward Fox.
Era moda no fim dos anos 70 adaptar Agatha Christie para o cinema. Aqui temos uma história de Miss Marple. Mas o filme é lixo. Chato, sem suspense, feio, inutil. Mesmo o elenco não pode salvar tamanha bobagem. Nota ZERO.
MORRENDO DE MEDO de George Marshall com Jerry Lewis, Dean Martin e Carmen Miranda
Ruy Castro fala que para a geração dele a separação de Martin e Lewis foi tão traumática quanto o fim dos Beatles. Aqui eles alopram uma viagem de navio e uma mansão maldita. O estilo de Jerry é para quem aceita seus exageros. É o humor que advoga que mais é melhor. Forma bela dupla com Carmen. O filme é apenas um exercício de nostalgia. Nota 4.
X MEN, DIAS DE UM FUTURO ESQUECIDO de Bryan Singer com Hugh Jackman, James MacAvoy e Michael Fassbender
Num futuro terrível os X Men estão sendo dizimados. Wolverine é enviado aos anos 70 para mudar a história. Que bela aventura!!!! O filme tem a união de seriedade com diversão, algo dificil de se conseguir. Os atores podem brilhar, a história fala de preconceito, a ação não cansa, há suspense e velocidade, mas também temos boas falas e bons personagens. Que mais pedir de um filme de aventuras? Os filmes HQ são em sua maioria insuportáveis, mas de vez em quando surge uma beleza como esta. Nota 9.
MUSASHI, A TRILOGIA SAMURAI de Hiroshi Inagaki com Toshiro Mifune
Em 1954 a primeira parte desta trilogia foi sucesso mundial e ganhou o Oscar de filme estrangeiro. Mais que os filmes de Kurosawa, foi este o filme que fez do Japão a moda do cinema de então. O primeiro filme é mesmo o melhor. Musashi é um samurai raivoso e impulsivo, nos 3 filmes acompanhamos sua iluminação. Os filmes seriam perfeitos se não houvesse a história chatíssima de seus amores. Mas com cenas de luta perfeitas, cenários deslumbrantes e Mifune, um ator que faz nossos olhos grudarem na tela, a trilogia se torna obrigatória para aqueles que se interessam por Japão e por cinema. Nota 8.



















RELATO AUTOBIOGRÁFICO- AKIRA KUROSAWA

   Em agosto de 1945, logo após a derrota do Império Japonês, Kurosawa, assim como outros 100 milhões de japoneses, esperava a fala do imperador no rádio. Como todos, Kurosawa esperava uma ordem de Hiroito. Nas ruas, as pessoas se preparavam, a expectativa era a de que todos se matassem. A vergonha da derrota seria lavada com o sangue. Espadas e facas eram afiadas. Kurosawa diz que no Japão todo "eu" era uma vergonha. O japonês se aplicava para ser parte de um todo, pensar em sua vida, em sua individualidade seria egoísmo imoral, falta de honra. Naquele dia o imperador, instruído pelos americanos, poupou seu povo. A ordem era a de reconstruir, esquecer, perdoar.
   Kurosawa fala das pessoas saindo às ruas sorrindo. A vida vencera.
   Esta biografia deste que é meu diretor de cinema favorito, é um belo exemplo daquilo que diferencia o Japão do Ocidente. Toda a trajetória de Kurosawa é marcada pela teimosia, pela obstinação e pela gratidão a seus mestres. Ele foi uma criança frágil, efeminada, tendo sofrido na escola a perseguição de mestres e de colegas. Mas ele era teimoso. Se aplicava nos esportes e passou a fazer kendô. Andava horas para ir a seus cursos e encontrou por fim um professor que o entendeu. O pequeno Kurosawa amava pintar, desenhar e ler. O pai era um ex-militar, professor de educação física. A mãe era a tipica japonesa submissa.
   Metade do livro são cenas curtas dessa infancia. Gostos de comida, dias de chuva, névoas e o amigo que era como um irmão. Kurosawa lembra com delicadeza, parece pintar as páginas do livro.
   Como a maioria dos mestres do cinema, ele se fez diretor sem querer. Arrumou um emprego de produtor e se viu como assistente de diretor. Yamamoto foi seu mestre. Ele descreve os basidores da indústria do cinema, macetes de fotografia e de edição. E louva os filmes que ele assistia então ( ele é fã de John Ford ).
   Kurosawa encerra o livro em 1950, quando Rashomon vence em Veneza. Termina para não ter de falar de pessoas e eventos muito vivos ainda. Se fecha em silêncio.
   Mas ainda houve tempo para falar da descoberta de Toshiro Mifune, um fenômeno da arte de atuar, um homem meio grosseiro que dominava a tela como ninguém mais. É bonito ler os louvores de Kurosawa, ainda mais sabendo que os dois estavam brigados na época do livro.
   Para quem ama filmes, eis um texto obrigatório.
   PS: Kurosawa é meu favorito porque ele une a aventura e o drama, a pura diversão e a arte mais refinada. Tem o visual apurado de Lean ou de Kubrick, a poesia de Dreyer ou Ophuls, a seriedade de Bergman e Lang e o heroísmo de Ford e Mann. Ele é uma enciclopédia.

OS SETE SAMURAIS- AKIRA KUROSAWA, O TEMPO É O ÁRBITRO QUE CONTA

Fazem vinte anos que vi este filme pela primeira vez. Hoje o vejo pela quarta. E penso nessas duas décadas em quantos filmes vieram, causaram sensação e foram esquecidos em seguida. Assisti Os Sete Samurais em 1991 pela primeira vez, numa cópia horrorosa, e mesmo assim o filme me pegou. Feito em 1954, ele causou sensação no Ocidente e lançou várias idéias que logo se fizeram cliché. Até então não se faziam filmes sobre grupos de heróis, não existiam filmes com heróis que eram derrotados ( embora a derrota aqui seja parcial ) e não havia esse tipo de ação vertiginosa. Kurosawa e este filme são até hoje molde de todo filme de ação épica. É estudado quadro a quadro por todo diretor que almeja o ápice.
Em pouco mais de 3 horas, vemos uma aldeia camponesa, no Japão de 1500, ser assaltada por bando de bandidos ferozes. Cansados de sofrer, esses camponeses contratam samurais para os defender. São os sete que se unem e salvam a aldeia. Mas, é claro, o filme é muito mais.
Samurais já se vêem então como raça em extinção. Seu tempo já é passado e eles trabalham por comida. Pior, os camponeses desconfiam deles, não gostam desses assassinos profissionais e nada os une de fato. Apesar do filme ser ágil, leve, às vezes até mesmo cômico, a sombra da tragédia e da solidão paira sobre os samurais. Eles não fazem parte da comunidade.
As cenas de ação são bastante violentas e nada possuem de "heróico". Todas as mortes são feias, cruéis. As pessoas morrem como ratos, aos berros e em agonia. Kurosawa é famoso por ser um mestre em ação, por saber como ninguém usar várias pessoas em ação coordenada, mas sua violência é sempre sem glamour, árida e desajeitada. Kurosawa realmente odeia a guerra.
Cada samurai tem sua personalidade muito bem definida, mas este épico apresenta um show de Toshiro Mifune. Ele faz um samurai palhaço, bruto, sujo, sempre aos berros, com gestos simiescos. É uma criação de coragem, uma criação de originalidade plena. Não bastassem seus outros filmes, este garante o lugar de Mifune entre os quatro ou cinco maiores atores do cinema. Ele brilha e encanta sem jamais parecer querer agradar. Coisa dos deuses.
A mais lembrada cena é a longa sequencia final, feita na chuva e na lama. Ninguém filmava a chuva como Kurosawa e aqui há sua prova. Um diretor menos genial filmaria tudo do alto, colocaria música de ação e faria cortes de plano e contra-plano. Kurosawa não opta pelo fácil nunca. O som é o ruído de galope de cavalos e gritos. A ação é filmada a altura do chão. O que vemos são patas que correm espirrando lama, ouvimos gritos e berros e temos então a sensação de estar na luta em si. Os cavalos correm de lá pra cá, nossa visão é detrás do abrigo, a lama espirra e a chuva escorre. O que ocorre é confusão, mortes feias e o medo em forma de cinema.
Mas o filme não é só isso. Há a procura e escolha dos sete samurais, a aldeia sendo treinada, a floresta e seus riachos, e o final, um dos mais conhecidos e amargos do cinema. Os samurais percebem nada ter ganho, nada terem encontrado e pior, não terem mais lugar no mundo de trabalho e paz do futuro.
Kurosawa, mestre maior ( não consigo pensar em diretor maior, talvez apenas Ford e Hitchcock lhe cheguem perto ), jamais filma fácil. Cada tomada é pensada em seu melhor modo e nunca no mais simples. Mas atenção: nada é feito como exibicionismo. Se toda cena tem seu esmero e seu desafio, tudo gira ao redor da história e jamais ao redor do efeito vazio. A história anda, avança, somos levados para dentro daquele Japão e colocados ao lado daqueles personagens. Esquecemos que há um diretor-gênio por detrás de tudo aquilo. Ele não é o filme, ele faz o filme.
O tempo julga com justiça toda arte. Os Sete Samurais está sempre em catálogo. Garotos de 15 anos o descobrem em 2011. Prêmio maior não existe.

PREMINGER/ KUROSAWA/ KIM KI DUK/ COLIN FIRTH

DRIVER de George Tillman Jr. com Dwayne Johnson, Billy Bob Thorton e Carla Gugino
Inominável. Ação sem emoção nenhuma. Tenho visto muitos filmes atuais e eles têm me tirado toda a paixão que eu sentia pelo cinema. Um filme muito ruim de 1930 ou 1950 é tão vulgar e idiota como um filme ruim de 2010, mas a diferença é que ele é ruim "sem querer", por incapacidade ou por falta de recursos. O filme ruim atual é cínico, esperto, se vangloria de sua burrice, menospreza o público e destrói qualquer idéia de nobreza ou de verdade que voce podia ter sobre o cinema. É um verdadeiro estupro. Infelizmente já assisti a quase todos os grandes filmes do passado, e agora, vendo básicamente os filmes "novos" minha paixão é pisoteada e aviltada....
O DISCURSO DO REI de Tom Hooper com Colin Firth, Geoffrey Rush, Helena Bonham-Carter, Claire Bloom e Derek Jacobi
Tão bom quanto o filme anterior do diretor ( Maldito United ) e com o mesmo defeito: ele não consegue manter o ritmo. O que temos é um filme com uns poucos bons momentos e outros de tédio e vazio. O que jamais cai é a excelência do elenco. Vê-los é um prazer. Alguns críticos ficaram chateadinhos com a vitória deste filme no tal oscar....para mim a irritação deles é bom sinal. Dos concorrentes era o menos ruim. Como Carruagens de Fogo e Kramer x Kramer, este é um filme médio que ninguém recordará como oscarizado no futuro. Nota 6.
ESCÂNDALO de Akira Kurosawa com Toshiro Mifune
Kurosawa estava com problemas em relação a imprensa na época, quando fez este filme sobre paparazzis que perseguem estrela da música e pintor. O filme é em tom menor, Kurosawa é dos poucos diretores da história que cresce quando sua ambição aumenta. Mifune dá seu show naturalista e a realização é bastante competente, embora não haja nem sinal da genialidade do maior dos diretores. Nota 6.
BOM DIA TRISTEZA de Otto Preminger com Jean Seberg, David Niven e Deborah Kerr
Françoise Sagan escreveu este livro na adolescencia e logo se tornou o guia das jovens rebeldes de seu tempo. Este filme é infelizmente americano, então a acidez do original está totalmente perdida. Mesmo assim é um agradável e muito bonito filme. Vemos em preto e branco o presente da menina e em cores suas lembranças. A história é basicamente a história do ciúmes de uma filha pelo seu pai playboy. Os dois vivem em baladas e restaurantes ( na Provence ) juntos e felizes e ela é até mesmo amiga das namoradas do pai. Mas quando ele resolve se casar tudo desaba. Ela passa a ter namoros casuais e trama a destruição da pretendente. O elenco é bom e Otto sempre é um diretor forte, sabe, mesmo quando erra, o que deseja mostrar. O filme se passa entre os muito ricos dos anos 50, ou seja, é tudo muito chic. Nota 6.
O ARCO de Kim Ki Duk
Um velho cria uma menina em um barco. Ele traz pescadores para lá e quando algum deles se interessa pela menina é expulso. O velho usa o arco e flexa para adivinhar o futuro e para assustar esses pretendentes. Mas ela se apaixona por jovem e foge com ele. O velho quase morre, ela volta e os dois se casam. Quem assistiu esse filme coreano e pensou ter visto um filme budista sobre o desejo e o sexo nada entendeu. O centro do filme não é o velho e a menina, o centro é o velho e o arco. A menina é uma deusa, ela é a ponte que liga o velho, através do sofrimento, a sua realização plena: o arco. Ele se torna o grande arqueiro e pode então partir, sumir na água. Como ocorre com outro filme do diretor ( Inverno, Verão, Outono.... ) o ritmo é lentíssimo, mas o final compensa tudo: é belíssimo. A estranheza que ele causa é a mesma de quando vemos ou ouvimos algo genuinamente oriental, tomamos a consciencia de que quase nada sabemos ou entendemos. Nota 7.
QUANDO VOCE VIU SEU PAI PELA ÚLTIMA VEZ? de Anand Tucker com Colin Firth e Jim Broadbent
Certas pessoas gostam de falar mal de filmes que nos emocionam por apelar ao melô. Não entendem que emocionar é sempre um mérito, desde que se mantenha um mínimo de bom gosto. Pois bem, eis aqui um filme que apela muito e não consegue causar a menor emoção. Dois bons atores em roteiro sem sal que fala de filho e pai que nunca se deram bem, e agora o pai está com câncer e o filho tem a chance de se reaproximar. Cenas enfadonhas do filho criança com o pai, do filho adolescente com o pai e do agora, o filho adulto tornado poeta e o pai doente. Pai que foi sempre alegre e conquistador. Com tudo isso nas mãos, o filme consegue ser frio, distante, chato, impessoal. Aborrecido enfim. Nota 3.

MARLON BRANDO/ KUROSAWA/ LANG/ WISE/ CLINT EASTWOOD/ LEE MARVIN

O TIRANO DA FRONTEIRA de Anthony Mann com Victor Mature
É o primeiro filme de Mann que não me satisfaz. Por um motivo muito óbvio: não gosto de westerns sobre a cavalaria. Adoro faroestes que falam sobre cidades em crise, sobre solitários cowboys, sobre corrida do ouro. Mas todos aqueles que mostram a cavalaria me entediam. Para piorar, este se apoia no talento inexistente de Mature. Nota 3.
BRILHO DE UMA PAIXÃO de Jane Campion com Abbie Cornish e Ben Whishaw
John Keats para moçoilas. Campion transforma Keats em EMO. Belas imagens e algumas belas páginas recitadas. Melhor ler o gênio romântico inglês. Nota 1.
DUELO SILENCIOSO de Akira Kurosawa com Toshiro Mifune e Takashi Shimura
Eis um Kurosawa que eu nunca vira. É de seus primeiros filmes e é a primeira reunião com Mifune. Fala, em cenário cheio de sombras e que exemplifica o Japão detonado pós-guerra, de um médico, que ao ser contaminado pela sífilis, abre mão de seu noivado e até de seu desejo sexual. É o trágico levado a seu limite. Mifune, com máscara impassível de médico que atende de graça os necessitados, mostra já o dom que lhe daria a imortalidade, ele faz muito com pouco. Sua explosão de dor, em cena quase ao final, nos corta o coração. É mundo sórdido, mas nunca nos deprime. A medicina é um dos temas recorrentes de Kurosawa. Sempre vista como mundo de abnegados. É um filme invulgar, Kurosawa foi o maior. Nota 8.
UM RETRATO DE MULHER de Fritz Lang com Edward G. Robinson, Joan Bennet e Dan Dureya
Quem nunca viu um noir de Lang está perdendo um dos maiores prazeres do cinema. Fico imaginando como seria, numa São Paulo de garoa e paletós, assistir este clássico em algum cine perdido da Lapa. O vapor subindo do pipoqueiro de rua, os táxis na saída, os cigarros no saguão... Este filme é perfeito. Um professor casado se envolve em assassinato e com mulher fatal. Todo o filme é pleno de suspense, de destino inexorável e...milagre! Lang usa um dos finais mais banais com maestria. O final tinha de ser aquele, só poderia ser esse. Bennet, máscara bela de sensualidade, e Robinson, um ator que consegue ser simplório sem ser cômico, são tão certeiros quanto o filme, mas é Dureya, um vilãozinho pé de chinelo, que rouba o filme. Exemplo perfeito do que era um filme pop da década auge de Hollywood. Nota DEZ!!!
O MITO de Stanley Tong com Jackie Chan e Tony Leung
Acho Chan um dos atores mais mal-utilizados dos anos 90. Ele merecia melhores filmes e ter estourado no Ocidente mais cedo. Este muito ambicioso projeto se perde em idas e vindas no tempo e nos continentes. Não era mais fácil ter feito uma boa chanchada com lutas? Mas não! O roteiro nos enche a paciência com seu espiritismo de araque, sua love story infantil e efeitos especiais pueris. Uma chatice!!!!!! Nota 1.
O DIA EM QUE A TERRA PAROU de Robert Wise
O clássico, infinitamente melhor que sua refilmagem ( como infinitamente melhores são os originais de A Guerra dos Mundos, A Máquina do Tempo e O Planeta dos Macacos. ) Um filme muito barato, mas com efeitos eficientes, e uma mensagem pacifista sem pieguice. Wise não perde tempo com nada supérfluo, toda tomada é em função da história, nada é enfeite ou exibicionismo. Robert Wise foi um dos grandes, seja em western, sci-fi, horror, musical ou drama. Faltou a comédia nessa carreira vitoriosa ( com dois Oscars por West Side Story e por A Noviça Rebelde ). Nota DEZ.
O CAVALEIRO SOLITÁRIO de Clint Eastwood
Eastwood tem filmes tipo Hawks e tipo Kurosawa. Quando faz um Hawks ele é relaxado, usa roteiros semi-improvisados e parece sorrir enquanto dirige. Quando é Kurosawa ele fala de heroísmo, de honra e filma de modo mais crispado. Cavaleiro Solitário é em seu tema e roteiro totalmente Kurosawa. A cidade de mineradores se parece com as vilas japonesas e sentimos todo o tempo que aqueles cowboys se tornarão samurais. A camera olha a rua através de janelas, como faz o mestre japonês e há aquele solene toque de vingança e de coragem. O tema é de vila oprimida que vê surgir um vingador que os redimirá. O duelo final é excelente. Clint tem um de seus mais tipicos personagens e é uma diversão soberba. Lançado em 1985, este filme seguiu a sina de todo filme de Eastwood até Os Imperdoáveis : a critica chamou-o de lixo, o público universitário o esnobou e o povão lhe fez justiça. Era um tempo em que filme bom tinha de ser europeu ou um americano com "grande tema", tipo Amadeus, Gandhi ou O Último Imperador. Clint Eastwood viveu o bastante para ser justiçado. Ele é o máximo e é o último dos ícones. Nota DEZ!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
OS PROFISSIONAIS de Richard Brooks com Burt Lancaster, Lee Marvin, Robert Ryan, Claudia Cardinale e Woody Strode.
Brooks foi um dos diretores machos de Hollywood. Aqui ele faz um quase-western sobre bando de bandidos que é contratado ( o bando ) para salvar a esposa de rico ferroviário de seus raptores mexicanos. É um Dirty Dozen mexicano. É mais um filho de Os 7 Samurais. Mas, com um elenco como esse ( ver Burt pular e sorrir, ver Ryan ser durão e sofrido, e ver Lee Marvin ser Lee Marvin... quanto prazer! ) e a direção segura e firme de Brooks, tudo flui em emoção, ação e reviravoltas bem urdidas. Claudia foi milagre da natureza: em cinco anos ela trabalhou com Fellini, Visconti, Monicelli, Brooks, Leone, Blake Edwards e Richard Quine. E que bela ela foi!!!!!!! Nota 7.
A FACE OCULTA de Marlon Brando com Marlon, Karl Malden e Ben Johnson
Única direção de Brando, foi caríssimo e imenso fiasco. Graças a essa péssima experiencia, ele nunca mais pensou em dirigir. O filme, que começou com Kubrick, é longo, muito longo, cheio de cenas belíssimas, mas que poderiam ter sido evitadas. Foram meses e meses de filmagens, meses de edição e uma recepção gélida de público e hostil de crítica. Com o tempo foi se tornando um semi-cult ( é um dos top 20 de Tarantino ). Não deixa de ser um western doido: há toda uma sub-trama gay e sado-masoquista na história de ex-comparsas de crime que se traem. Marlon faz um "herói" bastante esquisito, rebolativo, glamuroso. Mas é sem dúvida um filme invulgar e que deve ser conhecido. É vasto, corajoso, ousado e muito belo. Como Brando foi. Nota 7.

YOJIMBO- AKIRA KUROSAWA e TOSHIRO MIFUNE

Um samurai anda por caminho deserto. Joga um graveto ao ar, ele cai e o samurai segue a direção que o acaso indicou. Ele se coça, é sujo. Entra em vila e vê um cão vindo com mão humana na boca. A história promete.
Yojimbo, quando lançado, foi o maior sucesso da vida de Kurosawa. Àquela altura ele já era famoso e já havia assumido sua dívida para John Ford. Mas este filme vai além de Ford- mistura mangá com western, comédia com drama shakespeariano.
O samurai faz jogo duplo com duas famílias rivais. Toshiro Mifune faz esse herói. Ele passa o filme falando só o básico, o necessário. Ele come sempre com muita fome, bebe com sede e dorme com avidez. Quer dinheiro, se coça e boceja muito. É preguiçoso. Mas jamais deixa de ser um herói.
Existem certas atuações ( raras ) que marcam um novo rumo. Foi assim com Brando em UM BONDE... e com Bogart em CASABLANCA. Mifune inventa aqui Clint Eastwood, Steve McQueen e até Wolverine. Clint diz sempre ser este seu filme favorito. O assistiu em 1961 e sentiu estar ali tudo o que desejava fazer. JOSEY WALES, THE BAD e até OS IMPERDOÀVEIS têm rastros de Yojimbo. E claro, POR UM PUNHADO DE DÓLARES é a refilmagem de Yojimbo.
Kurosawa dirige com precisão de mestre. A câmera nunca está onde esperamos e cada enquadramento tem a marca de um estilo único. É o primeiro filme feito com design de HQ e ainda é o mais sofisticado.
O final, duelo à western em rua poeirenta, é de antologia. Um dos grandes finais da história do cinema. E com a trilha percussiva que voce nunca esquecerá.
Mifune/Akira/Yojimbo, o que mais se pode querer ?