Mostrando postagens com marcador skate. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador skate. Mostrar todas as postagens

FREAKY STYLEY- THE RED HOT CHILI PEPPERS ( A DÉCADA DE 80 COMEÇAVA A DEFINHAR EM 1985 )

   Eu ouvi muito este disco ( e o seguinte dos caras, o que tem Fight Like a Brave ). Devo ter escutado umas mil vezes em três anos. Mas vamos a uma historieta....
   A década de 80 começou a mil. Em 1980 o que rolava era new wave e ska e deixa eu dizer o que era isso. Ska voce sabe, é aquela delicia, musica pra pular a vida inteira; e new wave nada mais era que um pop adrenalinizado, isso porque após uma bela safra entre 70/74, desde 1975 que a música pop tava uma mixórdia sem tesão e bem deprê. Tinha o funk e o disco, mas tou falando de música de branquelos. Então a new wave recuperava o pop do fim dos anos 60 e dava um mix com a urgência do punk e mais uma dose de cinismo wit. Tudo embalado com luxo e bom humor. Ok? Mas tudo isso durou muito pouco tempo e já em 1983 a coisa tava muito estranha. Um monte de bandas se achava a última bolacha do pacote, ou pior, posavam de salvadores do planeta. Até que...
  Na época eu ainda não tinha preguiça. Lia a Rolling Stone gringa, a Trouser, a Spin e a MM. Andava com um bando de modernetes que amavam se vestir de preto e escutar Bauhaus, Dead Can Dance e Cocteau Twins. Eu e eles viviamos numa hiper deprê de luxo e pensávamos estar em Berlin 1930 ou Tokyo 2030. Até que um dia eu mostrei pra eles o que eu disse ser o "som do futuro". Era o segundo disco dos Red Hot, o tal de Freaky Styley. Eles acharam que eu estava brincando e riram, todo mundo sabia que o som do futuro era Laurie Anderson !!!! E que no ano 2000 todo mundo ia vestir um tipo de terno de plástico com gravata que muda de cor. E vinha eu dizer que o futuro era uma banda de americanos, logo americanos!, que vestiam bermudas e camisetas!!!! E tênis!!! Que coisa mais antiga!!! Ninguém em 2000 irá ser assim!!! Não tenho o menor pudor em dizer: eu acertei povo! Disse que a moda do futuro seria toda baseada naquilo que os skatistas usavam em 1985 e que a coisa mais moderna de então era essa mistura geral, essa geléia de funk com punk com psicodelia e surf; skate com HQ mais rap e solos de guitarra. Riram, pensaram que o que viria seria um tipo de frieza Kraftwerk.
   Freaky Styley me absolveu de meu amor, que continuava em 1985, mas escondido, pelas coisas hippies, pelos doidos de Venice Beach, pelas tatoos e pelos cabelos compridos. O disco explodiu na minha cabeça e me liberou para ser maloqueiro de novo, para ser preto e branco e amarelo, para me jogar. Eles não tinham vergonha, não faziam pose e não tentavam ser artistas. O melhor, não sofriam, celebravam. Eles anteciparam o começo da década seguinte e racharam a geladeira de cristal da década de 80. Com eles, e mais a chegada do rap, a década Armani  começava a terminar. De repente o Duran Duran pareceu muito velho e eu, que aos 19 me sentia com 35, agora aos 21 me sentia com 15.
   George Clinton produziu o disco e de tudo que eles gravaram é de longe o mais negro. Tem até cover de Sly Stone. Flea nunca tocou com tanto groove, suas linhas de baixo são de fazer qualquer um se balançar inteiro. Anthony Kiedis nem tenta cantar, é grito e rap todo o tempo. Eles não fazem balada, nada de violão, e os metais são aqueles de James Brown: Fred Wesley e Maceo Parker. Impossível dizer qual a melhor faixa, mas eu adoro Catholic School, Yertle The Turtle, American Ghost Dance.... Foi ao som delas que grafitei meu quarto, mudei de amigos, voltei a brincar com meu velho skate ( um fracasso ), fui pra rua e crei um grupo de teatro beeeeeem relax na faculdade. Eles tinham atitude e foi com eles que percebi que na história do rock o hype do momento é sempre inglês, mas depois de uma década é na América que as influências sobrevivem. ( De Velvet a Iggy Pop, passando por Neil Young, Talking Heads, MC5, Television, Strokes, Beastie Boys, Nirvana, Pumpkins, Sonic Youth e um vasto etc ), que o rock inglês sempre "parece" moderno, mas o novo sempre vem de uma banda da América que pouca gente conhece.
   Quando chegou 1990 o skate ditava a moda e sexy passou a ser tudo ligado a esportes radicais, então esses mesmos amigos usavam seus tênis Adidas e vestiam camisetas da Quiksilver. Estavam ouvindo Husker Du e Pixies. O mundo dá voltas e eu fazia questão de lhes recordar aquilo que eles falaram de Freaky Styley: que era tosco, brega e "coisa de americanos". Sempre desconfie de bandas modernas eu lhes dizia, de agora em diante o futuro será das ruas e das praias e não mais das cabeças de alguns novos Bowies. O futuro não nascerá no triste quarto de algum artista inocente, mas das coloridas doideiras mestiças das ruas sujas e de portos perdidos. Freakey Styley me anunciou tudo isso e até hoje, em que não mais me interesso por "novas bandas únicas", quando sem querer noto alguma coisa que parece realmente jovem, livre, descompromissada, é ao espírito de Freaky Styley que peço conselho.
   Ouça e pule muito, hoje ele não mais parece original claro, foi copiado por vinte anos, mas sinta o groove, o humor, a mistura de gêneros.... é um clássico, um fertilizador. Enjoy it.

OS REIS DE DOGTOWN ( ETERNAMENTE JOVENS )

Há tempos eu ouvia falar desse filme. Dirigido com volúpia por Catherine Hardwicke ( que depois fez Crepúsculo, o que prova que cinema hoje é questão de equipe ), produção de Art Lison ( de n filmes de Scorsese e Lumet ) e David Fincher. Com Emile Hirsch, Heath Ledger, John Robinson e um ator exuberante, Victor Rasuk. E com a melhor trilha sonora desde QUASE FAMOSOS. Pois ontem eu o assisti....
Skate em 1976 era coisa de boiola. Quem não podia pegar onda, por falta de coragem ou de oceano, andava de skate. Mas andar de skate era como andar de patins, voce flutuava com delicadesa. O filme é sobre o nascimento de uma nova era, sobre quatro caras que mudaram TUDO, e não só o ato de deslizar sobre um shape. Pois como diz o filme: toda revolução vem da rua.
Que revolução ?
Existem lugares no mundo que são O LUGAR. O lugar certo para se estar naquele momento. Paris em 1922. O Village em NY em 1948. Londres em 1965. Barcelona em 1991. E Venice Beach, LA, em 1976.
Porque lá havia um Pier onde se pegava onda. E 3 moleques de 14 anos que não podiam ficar no mar ( apanhavam dos surfistas mais velhos ). Esses "heróis" eram : Tony Alva, um filho de chicanos, pobre e arrogante, Jay Jay, filho de hippie drogada, e Stacy Peralta, um responsável cabeludo, teimoso, tímido. Os três pegaram aqueles skates e resolveram voar. Mas é muito mais que isso !
Heath Ledger, em atuação magistral, faz o doidão-dono-de-surfshop. Ele resolve empresariar os garotos. Cria a Zephyr. Pausa : Em 1977 leio na revista POP, editora Abril, sobre esses caras. Fotos de Jay Jay andando dentro de canos de enchentes. O cara parecia cool, rebelde, nervoso... ele era mesmo tudo isso.
Então os três ( voltando ao filme ) vão a campeonato e causam sensação. Na verdade eles criam o que a gente hoje sabe ser UM CAMPEONATO. Tony Alva tira a música de dentista da pista e bota Iron Man. Acredite, até então rock pesado não era coisa de skate. E na pista ele desliza como se estivesse numa onda. Flutua, voa, dá batidas na crista. O povo fica de boca aberta.
E tudo muda. Os três, de súbito estrelas da midia, criam o conceito de ESPORTE RADICAL. Rock, roupas esportivas, loucura em se atirar, rebeldia. Mas o filme mostra : eles são o artigo genuino. São eles os primeiros a invadir casas de ricaços para usar as piscinas vazias ( sim, eles criam o skate em bowl ), eles dão os primeiros aéreos e inventam a moda skatista : tênis de sola lisa, jeans largado, camiseta velha e camisa de flanela na cintura. Era 1976.
O filme entra então em sua parte amarga. Stacy e Tony brigam por vaidade. E Jay, talvez o melhor deles, mergulha no punk : raspa a cabeça, se tatua, se droga. Mas há uma bela redenção no final. Uma cena lindissima em que eles se reencontram e brincam numa piscina. Skate com poesia, quem resiste ?
Quanto a trilha sonora.... bastava a cena com Old Man de Neil Young, mas como em QUASE FAMOSOS, a trilha chega a ser covardia!!!!
1989 foi um grande ano em SP. Uma multidão de alunos da FIAM enterrou os malditos anos 80. Todo aquele dandismo britanico com seus vinhos brancos e seus blazers foi pro lixão. Discos de Duran Duran e Culture Club nunca mais. Eu fiquei chapado !
Os cabelos voltaram a ficar soltos ( sem gel ) e longos e as camisetas tinham desenhos sujos. Jeans rasgados e caindo na bunda com tênis detonado. Mochilas e bonés amassados. Pulseiras, tatoos e bikes. Deu na TRIP da época : uma foto do bando de Venice Beach, mal encarados.
Essa galera ouvia Black Flag, The X, muito Sonic Youth, Pixies e Janies Addiction. E misturava tudo isso com Beastie Boys, Public Enemy e mais Jerry Lee Lewis, Johnny Cash, John Lee Hooker e Elvis. Liam a revista ANIMAL, muito mangá, Moebius, Alan Moore e Frank Miller. Liam Bukowski, Hammet, Chandler, Poe e tudo que fosse virulento. Grafitavam, tocavam em bandas de punkbilly e alguns ouviam jazz. Criaram a cultura de rua dos anos 90. E sabiam que eram filhos de Stacy Peralta, de Tony Alva e de Jay Jay.
Vieram as bikecross, o snowboard, le parkour, o novo surf ( que leva o skate para o mar ). A moda se tornou "da rua". Tudo mudou. O conceito de ser "radical" se firmou.
E tudo nasceu entre 3 moleques de rua, na suja e mal afamada Venice Beach, por puro fun.
Tão bom quanto este precioso filme são seus extras. O roteiro foi escrito pelo próprio Peralta e nós os vemos aos 48 anos, em reencontro. Stacy Peralta trabalha agora com skate ( foi ele quem lançou Tony Hawk ) e cinema ( tem prêmios como documentarista ). Tony Alva é uma lenda viva. Dono da marca ALVA. E Jay Jay foi preso por posse e tráfico, cumpriu pena e hoje vive no Hawaii. Mas o que mais impressiona é o carisma dos 3. Principalmente Jay. Se eles foram os caras que inventaram o esportista radical, hoje eles são os embaixadores do quarentão moleque.
É lógico que me identifiquei com o filme. Me vi nele, sei daquilo tudo, conheci aqueles caras, assisti a revolução. Mas eu te juro, como cinema, mesmo para quem tem 18 anos e não sabia que skatistas já foram o futuro, ou para quem tem 60 anos, e pensa que esporte é só ginástica, o filme é absolutamente descaralhante !!!!!!