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TAMBÉM O CISNE MORRE - ALDOUS HUXLEY

Huxley esteve em Hollywood nos anos de 30 e 40. Na verdade foi morar por lá como roteirista. Deu palpites em muitos roteiros que não levam seu nome e nas horas vagas, escreveu romances. Este é de 1939, pouco antes de ADMIRÁVEL MUNDO NOVO. -------------- Aqui ele já percebe a aramdilha que fora armada para o homem do século XX ( e XXI ). A ditadura do prazer faria com que as pessoas abrissem mão de tudo: honra, liberdade, verdade, laços familiares, sentido d vida, tudo em nome do prazer, um prazer que seria sempre ilusório, pouco durável e portanto sempre em fuga. Ajoelhados perante aquele que lhes dá o prazer, prazer este puramente sensorial-físico, o ser humano seria para sempre um poço de ansiedade, espremido entre o medo de perder o prazer e a submissão a quem o proporciona. ----------------- Há um personagem aqui, um gordinho meio padre meio carpinteiro, bastante artificial pois ninguém conversa daquele modo, que é porta voz de Huxley. Ele diz que inclusive a religião e a ideologia política fazem parte desse tipo de prazer barato, ambos dando ao ansioso a ilusão de fazer parte de uma irmandade e de possuir uma missão na vida. Imenso prazer esse. ---------------------- O livro foi escrito durante a guerra civil da Espanha e Huxley condena os fascistas, lógico, mas não defende os republicanos. Ele sabe que se mantidos no poder, os republicanos fariam o mesmo que Franco e sua gangue, ou seja, prisões, assassinatos, exílios, crimes. Para ele, TODA ideologia é criminosa pois tira do homem sua única chance de felicidade, a independência. ------------------- A trama? Weeeellll...Huxley, como Orson Welles, ficou impressionado com Hearst e sua Shangrila. Então Huxley escreve sobre um bilionário americano, brega, que vive entre Vermmeers, Rafaellos e El Grecos. Coleciona objetos antigos, enche os jardins de estátuas e tem uma biblioteca de sonho. Aterrorizado pela ideia da morte, ele tem uma laboratório onde tenta se desenvolver um soro que prolongue a vida. Uma jovem é sua amante. Há ainda um inglês que vem catalogar uma nova coleção de manuscritos raros, um jovem cientista idealista e o tal pároco. --------------- Na primeira parte é uma sátira ao nível Evelyn Waugh. Huxley ri da loucura americana. Mas depois o romance se torna pregação filosófica e por fim um drama de mistério. Huxley era o tipo do cérebro que podia escrever o que quisesse, sua falha era o excesso de pregação. Se em A ILHA isso destroi a obra, aqui ela se salva. É um belo romance. -------------------- Diz-se aqui que tudo aquilo que pode ser descrito ou pensado dentro da gramática, por palavras, nada vale, pois é puramente humano. Teria Huxley lido Wittgeinstein????? Para Huxley, temos 3 níveis: o animal, que é válido e puro, mundo de instintos e de fomes, o médio, o pior, que é o humano, totalmente ligado ao tempo e ao prazer sem sentido, e o nível 3, fora do tempo, eterno e divino. Complicado? Não acho. Talvez porque eu já tenha sentido na carne cada um desses níveis. Talvez um dia eu fale sobre.

PORQUE VOCE NÃO GOSTOU DE CIDADÃO KANE ( E DE TANTOS OUTROS FILMES )

Vejo Cidadão Kane pela terceira vez. Na primeira vez eu odiei. Na segunda percebi porque ele é famoso. Ontem adorei. Kane é vítima de sua fama. Ninguém vê um filme que é chamado de maior filme da história sem se decepcionar. ----------------- Quase todos os filmes que tinham a fama de obras primas me decepcionaram na primeira vez. O processo é perverso: Voce assiste esperando uma epifania, voce assiste comparando com seus filmes favoritos, querendo que a tal obra prima te emocione muito, que te abra janelas. Isso não acontece. Voce fica com raiva. Fim. -------------- Os únicos dois filmes que não me decepcionaram foram Oito e Meio e Fanny e Alexander. Vi os dois já sabendo de sua fama e senti estar diante daquilo que deles falavam. Já filmes que hoje adoro, filmes famoso e considerados históricos, como Morangos Silvestres, O Atalante, Sete Samurais, só me conquistaram na segunda assistida. Vistos uma vez e livres da imensa expectativa, eles se mostraram como são. Lindos. ---------------- Rastros de Ódio e Vertigo foram amores a primeira vista, mas foram vistos como bons filmes, apenas isso. Quando os vi nos anos 80 eles ainda não tinham a fama mitológica que têm agora. ------------------ Aliás diretores como Ford, Hawks, Hitchcock demoram a ser apreciados como devem. É preciso primeiro tirar deles a capa de elogios e de análises exageradas. Devo ainda dizer que a primeira vez que vi The Red Shoes achei quase insuportável. Hoje é meu filme de cabeceira. -------------------- Kane começa com os cinco minutos mais bonitos da história. Greg Tolland, o fotógrafo genial, filma a grade do portão de Xanadu. Funde com a fachada. Com vários takes. E faz desse início uma aula de expressionismo. Detratores dizem que Welles roubava o crédito de seus colaboradores, mas nunca vi um diretor colocar o nome do diretor de fotografia em destaque tão grande. Nos créditos finais o nome de Tolland está ao lado do diretor. -------------- Kane é importante por dois fatores que não são pouca coisa: Usa tudo que o cinema tinha inventado até então e antevê tudo que seria feito depois. E traz o diretor como interesse central do filme. Pela primeira vez não se via um filme pela história ou pelo ator, se assistia com a expectativa daquilo que Welles iria criar na cena seguinte. E ele não para de inventar. O filme inteiro é uma invenção. ---------------- Por fim, em tempos de fake news, é urgente ver um filme que fala do poder da imprensa. Kane cria fatos. Kane constroi famas. Há uma frase definitiva: O que eu colocar em manchete passa a ser o assunto mais importante. Não importa se for relevante ou não. ------------------------- Melhor filme da história? Talvez.

O TERCEIRO HOMEM. É ELE O MELHOR FILME INGLÊS DA HISTÓRIA?

   Ele tem sido eleito neste século o melhor filme britânico da história. Breve Encontro, de David Lean é seu concorrente direto. O Terceiro Homem foi dirigido por Carol Reed. E se voce não sabe, nas décadas de 40, 50 e 60, ele é tão poderoso quanto Lean. Já assisti quase todos os seus filmes. Sempre são bons, e às vezes impressionantes. Em 1968 ele ganhou Oscar de direção pelo seu pior filme, OLIVER. Eu acho que a crítica nunca o perdoou por ter derrotado Kubrick e 2001 nesse Oscar. Carol Reed foi meio que exilado das citações críticas. E O TERCEIRO HOMEM passou quase, que idiotice!, a ser considerado um filme de Orson Welles!!!! ( Uma tese idiota e puramente política. Orson faz um papel. E só isso. Em 1949, ano do filme, ele já estava em baixa. O roteiro é de Graham Greene, um dos mais fortes e famosos escritores da Inglaterra, o diretor, Reed, era um dos reis do cinema inglês. Onde eles deixariam Welles meter o nariz no filme? ). Além do que, a famosa fotografia deste filme, de Robert Krasker, fotografia que é das mais bonitas já feitas em preto e branco, bem, esse estilo de fotografia é o estilo presente em 70% dos filmes ingleses da época. A Inglaterra dos anos 40 tem a fotografia de cinema mais fascinante de seu tempo. Krasker, Jack Cardiff, Otto Heller, Oswald Morris, Ronald Neame, todos usam sombras, névoas, umidade, como em nenhum outro lugar.
  O filme se passa em Vienna, no imediato pós segunda guerra. Um americano, Joseph Cotten, veio encontrar um amigo, Orson Welles. Mas esse amigo está morto. Ou não? Pra não estragar o prazer do roteiro genial, não conto mais nada. Há no filme doses imensas de tragédia, maldade, tudo com o cenário de uma cidade em ruínas, um povo faminto, noites geladas, desconfiança geral. Foram à Vienna filmar tudo, usaram toda avenida bombardeada, cada beco sujo, hotéis suspeitos, e até o esgoto imenso. Orson Welles é talvez o mais odioso vilão já visto, e Cotten o mais ingênuo doa americanos. Temos ainda Alida Valli como uma tcheca fatalista e Trevor Howard como o inspetor inglês, uma ilha de bom senso em um universo de desespero.
  Carol Reed não comete um só erro. É daqueles filmes perfeitos, tudo exato, nada demais, nada de menos. Cenas que se sucedem, esteticamente magníficas, mas jamais bonitas, mais que isso, são fantásticas. É uma obra prima e um dos mais belos filmes que assisti na vida.
  Será o melhor filme inglês? Claro que não. Ou claro que sim. Como saber? Temos uns 10 filmes que merecem essa posição. Escolher um é trair os outros. E de traição, basta este filme.

HAJA EGO ORSON WELLES!!!!

   Lá vem o EGO gigantesco usando um ridículo sotaque irlandês. Orson Welles tinha uma vaidade tão imensa que ele só funciona quando sua personagem é tão ególatra quanto ele mesmo foi. Othelo, Macbeth, Kane. Aqui ele é apenas um marinheiro da Irlanda. Mas, claro, um marujo que dispensa grana e lutou na guerra civil da Espanha. E lá vai Orson com um sotaque irlandês grotesco se exibindo como rei da ética em um roteiro, dele mesmo, onde nada faz sentido algum.
  Casado na vida real com Rita Hayworth, que em 1948 era a maior estrela do cinema global, ele a coloca no filme apenas para poder ganhar dinheiro da Columbia, estúdio onde sua mulher era rainha. E faz este fiasco. Rita, mal utilizada, é uma vamp sem eira nem beira. Suas falas são banais e não cola a conclusão de sua personagem. Sem surpresas, tudo no filme é forçado.
  Ah! Mas o "pobre" Orson pode culpar o estúdio maldoso. Dá sempre pra chorar e dizer que a Columbia não deixou ele fazer o que queria. É por isso que admiro tanto Hawks e Huston. Fizeram o que queriam dentro dos estúdios e sem chorar nunca. Mas Orson...coitadinho! Tantos filmes ruins por culpa do meio que o massacrou...Bah! Não cola! Ele foi e é ídolo de quem se vê como "artista vítima do meio hostil", ou seja, 99% dos artistas medíocres e dos críticos que são cineastas frustrados. Orson era um ego inflado que só fazia coisas boas, Macbeth, quando o material era tão imenso quanto aquilo que ele imaginava ser.
  Lady from Shanghai poderia ser divertido se tivesse uma gota de humor. Mas Orson sempre se leva a sério. Então, essa sopa muito cheia de cebola, uma confusão de ricos neuróticos e um marujo que se vê dentro da vida deles, é uma chatice sem fim. De bom só a fotografia de Stanley Cortez. Aliás, Orson sempre soube que um bom fotógrafo salva metade de um filme. A outra metade um roteiro mal escrito e um ator egocêntrico se encarregam de aniquilar.

CLARK GABLE/ WELLMAN/ WELLES/ KEVIN KLINE/ WOODY ALLEN/ ASTAIRE

O GRANDE MOTIM de Frank Lloyd com Clark Gable, Charles Laughton e Franchot Tone
A clássica história do navio Bounty, que no século xviii foi palco de famoso motim. Laughton faz com vivo prazer o capitão cruel e de rígido costume; Gable é o jovial imediato que acaba por apoiar o motim; Tone é um nobre que viaja para pegar experiência. O filme, maravilhosamente bem produzido em padrão MGM, é diversão típica dos anos 30, ou seja, simples, eficiente, inteligente. Caso raro de filme que ganhou Oscar de filme e mais nada. As cenas na ilha onde eles se exilam são belíssimas! O desempenho de Laughton é de não se esquecer. Nota 8.
BEAU GESTE de William Wellman com Gary Cooper, Ray Milland, Robert Preston, Brian Donlevy e Susan Hayward
Outra aventura clássica. Três irmãos de familia nobre-decadente servem na legião estrangeira. É o filme onde se criou a imagem do "sargento durão". Cooper está no auge da fama e nasceu para ser herói. O filme, muito bem dirigido, tem humor, drama e suspense. Wellman, diretor sempre confiável, tem senso de timing, de visual, de leveza. É um mestre. Assistir este filme é como ler uma velha história de HQ. Puro escapismo fofo. Nota 8.
MR. ARKADIN de Orson Welles com Welles, Paola Mori, Patricia Medina, Akim Tamiroff
É um dos vários filmes que Welles fez em condições muito precárias. Ele antecipa muito do clima nouvelle vague, tem às vezes algo de filmes como Alphaville. Welles brinca com a câmera, com os atores, com o enredo ( um tipo de policial complicado ), mas tudo acaba parecendo muito confuso, estranhamente vazio, e em seu pior, pedante. Nota 4.
ANTIGONE de Georges Tzavellas com Irene Papas, Manos Katrakis
A peça de Sofocles sobre a moça que enfrenta o rei para poder honrar seu irmão morto. O filme é belíssimo. Não houve medo algum de ser solene, distanciado, e o texto poético é bastante preservado. Mais uma prova de que grandes peças podem ser grandes filmes. Irene faz Antigone com senso maravilhoso de destino, mas Creon, feito por Katrakis, rouba o filme. É um rosto inesquecível, feito de pedra, cruel e rígido, terrível. As vozes são aterradoras. É um filme inesquecível. Nota 9.
XEQUE-MATE de Caroline Bottaro com Sandrine Bonnaire e Kevin Kline
Kevin sempre foi e é um ótimo ator. Fez então este filme francês, provávelmente por falta de bons papéis em Hollywood. Sandrine é uma camareira de hotel de luxo em cidade de veraneio. Ela se apaixona pelo jogo de xadrez ao vê-lo como algo que simboliza aquilo que ela não tem. É casada e completa o orçamento fazendo faxina na casa de um americano que escreve. Eles jogam xadrez. O filme é muito ruim. Entediante, nada nele faz sentido. Não se entende o porque de sua súbita paixão pelo jogo, o porque do arrogante americano abrir a guarda com ela, o porque de se ter feito tal filme. Não passou por aqui até agora e ficará bem se não passar. Nota Zero.
MEIA-NOITE EM PARIS de Woody Allen com Owen Wilson e Marion Cotillard
Owen está ok. É mais um ator que consegue fazer Woody Allen como o próprio. Marion está bem como a modelo de Picasso. Mas Adrien Brody como Dali está hilário!!!! É um filme que de certa forma celebra a vida. Mas a celebra de forma sem riscos, tudo dá certo sempre. É um prazer apaixonante ver Heminguay falar, Zelda e Scott dançar e Cole Porter tocar piano. Eles são meus mitos e portanto são parte do que me faz estar vivo. Belo filme. Crítica mais longa abaixo. Nota 7.
TRÊS PALAVRINHAS de Richard Thorpe com Fred Astaire, Red Skelton, Vera-Ellen
Longe de ser um grande musical. É do tempo de "vacas magras" de Astaire. Mas...caramba! Como é bom ver um filme de Fred Astaire!!!!! Há um alto astral tão grande e convincente que seus filmes servem como um tipo de mensagem, são como um lembrete daquilo que podemos ser. O que temos de leve, nobre e bonito em nós. Os serviços que Astaire nos fez são inestimáveis. Eis um anjo. Nota 7.

ORSON WELLES/ DEPARDIEU/ WISE/ BURTON/ DE SICA/ PETER SELLERS/ ZULU

ZULU de Cy Endfield com Stanley Baker, Michael Caine, Jack Hawkins e Ulla Jacobson
Um grande clássico do cinema inglês, foi votado recentemente um dos top 40 de toda a história do cine britânico. É diferente de tudo aquilo que voce espera. O excelente roteiro narra a história verídica de um grupo de soldados que em 1875 se defende na Africa de ataque de 4000 zulus. A primeira cena ( excelente ) já revela do que trata o filme: vemos uma longa dança ritual zulu. O filme não toma partido, os zulus não são vistos como "bons selvagens", mas tampouco são vilões. Assim como os soldados ingleses, eles são guerreiros humanos. O desenvolvimento dos personagens é perfeito, todos são bem delineados, nenhum é um herói, mas também não existe o anti-herói, têm falhas e qualidades e todos estão transidos de medo. A ação é muito bem feita, o som percussivo dos zulus vindo em crescendo, a violência explodindo de súbito. E o final é um explendor. Em suma, maravilhoso prazer. É um dos primeiros filmes de Caine, é aqui que ele se torna star ( em 64, ano do filme, ele só perdeu em bilheteria britânica para James Bond e A Hard Days Night ). Caine compõe um tenente afetado, fraco, exitante, mas que acaba por fazer o que dele se espera. Stanley Baker, grande estrela da época, é um oficial que luta para ser duro, tenta ser profissional, mas percebe todo o tempo o absurdo daquela matança. Excelente, tem ainda uma fantástica trilha sonora de John Barry, talvez meu compositor de cinema favorito. Nota 9.
A MARCA DA MALDADE de Orson Welles com Orson Welles, Charlton Heston, Janet Leigh, Marlene Dietrich
Um filme de Tarantino feito em 1958. A primeira cena é antológica: um longo plano sem cortes em que Heston anda por rua da fronteira Mexico/EUA em meio a carros, gente e casas. A câmera sobe, desce, corre e caminha e nenhum corte é feito até acontecer uma explosão. O tipo de esbanjamento de talento que foi inventado por Welles. Se Kane é seu filme mais perfeito é este que dá mais prazer ao ser visto. Fala de crime, do confronto entre um velho policial sem ética ( Welles, em atuação de explendor ) e um policial mexicano honesto ( Heston, muito bem ). Tudo no filme é fatalismo, pessimismo, escuro ( a fotografia é maravilhosa ). E tem algumas linhas de diálogo de cinismo cintilante. É um desses filmes cult-chic que fica bem gostar, mas ele merece toda sua fama. Se voce não penetrou no segredo do genial talento de Welles, este talvez comece a mudar sua opinião. Nota 9.
MAMMUTH de Gustave Kervern e Benoit Delepine com Gerard Depardieu e Isabelle Adjani
Minhas Tardes Com Margueritte é o melhor filme em cartaz. Se voce não o viu por ter ido atrás do hype, sinto muito. Lá Depardieu dá um show e pasmem, é um filme atual que trata de gente comum, sem grandes loucuras e doenças mortais. Mas aqui tudo se desacerta. Ele está ok como um aposentado entediado que parte pelas estradas atrás de papéis que provem onde e quanto tempo trabalhou ( problemas de aposentadoria ). Belo tema que poderia lembrar o Schmidt de Alexander Payne com Nicholson ( Payne é um dos muito bons novos diretores que têm pouco hype por não serem "geniais" ). Mas este Mammuth envereda pelo desejo de ser esquisito, diferente, inesperado, e nessa busca tola por arte, ele se faz previsível e pior, enfadonho. Uma pena.... Nota 2.
CORRA QUE A POLICIA VEM AÍ 2 E 1/2 de David Zucker com Leslie Nielsen e Priscilla Presley
Adoro Nielsen!!!!! Ele surge e já abro um sorriso. É daqueles humoristas que apenas por estarem em cena já fazem graça ( Eddie Murphy foi assim há séculos atrás ). Mas esta segunda aventura do hilário policial está longe da naturalidade da primeira. Aqui voce percebe o riso sendo procurado. Mesmo assim tem algumas cenas de humor antológico. Nota 6.
HELENA DE TROIA de Robert Wise com Rossana Podestá, Jack Sernas e Brigitte Bardot
O filme já começa com um erro: no papel de escrava, a muito jovem BB rouba o filme da insignificante Helena/ Podestá. E todo o resto vai nesse ritmo: o Paris feito por Sernas é patético, a guerra de Troia é constrangedoramente ruim e tudo no filme acaba por se parecer com carnaval na Sapucaí. Mistério: como um diretor tão bom como Wise se meteu nessa embrulhada? Nota Zero.
ALEXANDRE, O GRANDE de Robert Rossen com Richard Burton, Frederic March e Claire Bloom
Excelente. Burton, apesar de sua ridicula peruca, dá dignidade a figura de Alexandre. March, como seu pai, Filipe, está ainda melhor, e o filme é visto como um embate edipiano entre pai e filho. Filipe é todo desejo, virilidade, exuberância; e Alexandre, apesar de suas vitórias, é estranhamente fraco, solitário, travado. Rossen, grande diretor, sabe contar sua história. O filme flui. Não existe aqui aquele excesso de luxo hollywoodiano nos cenários "gregos", tudo é simples, claro e natural. Pode ser visto sem medo, ele se sustém, nada é inverossímel. Nota 8.
O FINO DA VIGARICE de Vittorio de Sica com Peter Sellers, Britt Ekland, Victor Mature, Martin Balsam, Maria Grazia Buccella
Uma comédia onde Peter Sellers faz um gatuno italiano só pode ser coisa boa. E é. Sellers foi um gênio e aqui ele dá uma pequena mostra disso. Faz um italiano típico e não parece forçado ou caricato. Faz rir, pelas situações de humor, não por ridicularizar sua interpretação. O filme trata de um roubo de barras de ouro e de um ladrão, The Fox, que deverá transportar esse ouro para dentro da Itália. Para isso, ele se passa por um famoso diretor de cinema "de arte", e usa a população de vilarejo, ávida por fazer cinema, como cúmplices no crime. Mature é um decadente ator americano canastrão ( ele se auto-parodia. Está ótimo ) e temos ainda todos aqueles hilários atores italianos em pequenos papéis. De Sica deixa Sellers atuar, o modo como ele move suas mãos, os olhares à Mastroianni, são aulas de como imitar sem parodiar. Uma comédia de primeira que tem ainda a bela trilha de Burt Bacharach e a linda Britt Ekland, uma atriz suéca do mal ( casou-se com Sellers e destruiu a carreira dele, e depois casou com Rod Stewart e o transformou num playboy. Os dois foram corneados por Britt ). Ah, o roteiro é de Neil Simon. Nota 7.
COLUMBO ( Box com 3 discos ) com Peter Falk, Leslie Nielsen, Lee Grant, Roddy McDowall...
Columbo é um policial feio e mal vestido, que com tranquilidade vai descobrindo seu criminoso. Quando Wim Wenders fez seu maravilhoso ASAS DO DESEJO ele escolheu Peter Falk/Columbo para ser um anjo. Vendo a série entendemos o porque. Columbo se move no crime, mas ele é sempre uma figura calma, plácida, familiar ( apesar do fedorento charuto ), um anjo que não tem uma só cena de violência. O filme começa sempre com o crime. Vemos quem o cometeu e a engenhosidade da execução. O interesse está em saber como Columbo chegará a solução. Ele então, se aproxima lentamente do crime. Toda a força da série está na composição de Falk e nos diálogos. Columbo vai irritando o criminoso, deixando-o confuso, acuado, temeroso. Columbo é obssessivo, racional, teimoso e fica todo o tempo surgindo onde menos se espera. Uma criação inspirada. Nesta caixa, o primeiro episódio tem direção de Steven Spielberg ( é seu primeiro trabalho ). Não darei nota por não ser cinema ( apesar de as imagens, com menos closes do que se usa hoje, serem quase cinematográficas. Cada episódio dura 80 minutos. )

ORSON/ RESNAIS/ WC FIELDS/ JAMES STEWART/ CLINT/ DON SIEGEL

CIDADÃO KANE de Orson Welles com Joseph Cotten e Agnes Moorehead
Em termos estritamente racionais este é o melhor filme do cinema americano. Porque? Porque jamais outro filme usou tanto em tão pouco tempo. Todas as linguagens são usadas sem nunca ter aspecto de citação. É cume soberbo de cultura e jamais parece pedante. Tudo é usado em termos superlativos: roteiro, fotografia, estilo de atuação, música. Há uma exuberancia infinita, exuberancia que só pode ser comparada a certas obras de Goethe e de Shakespeare. Mas veja bem, emocionalmente ele é frio como Thomas Mann ou Góngora. Kane se coloca em Olimpo gélido. Nós o admiramos mas não o amamos. Nota DEZ.
GENGHIS KAHN de Henry Levin com Omar Shariff, James Mason, Stephen Boyd
Grande produção que nunca tenta contar a história de Genghis Khan. O que se conta é uma fábula bastante tola sobre um mongol que aspira unir todas as tribos sob sua liderança. James Mason faz um chinês hilário. O filme é de uma babaquice absoluta. Nota 1.
O ANO PASSADO EM MARIENBAD de Alain Resnais com Delphine Seyrig e Giorgio Albertazzi
Certos críticos dizem que hoje não existem mais filmes dificeis. O que existe é filme desagradável. Explico: os filmes ditos dificeis de hoje, não são dificeis por sua forma ou por sua impenetrabilidade. São dificeis de ver por sua desagradibilidade. Este filme deixa essa questão mais clara. Fora os filmes de Tarkovski, é este o mais dificil filme já feito. Do que trata? O que é? Resnais disse uma vez que se trata de cinema puro. Mas o que é cinema puro? O que vemos é um casal num hotel imenso. Pessoas ao redor. Não há interpretações, os atores posam e declamam ( de um modo chic que seria muito imitado pela publicidade ). O texto, de Alain Robbe-Grillet, fala algo sobre memória. Mas será isso mesmo? Talvez seja o único filme feito em que os protagonistas são os objetos: espelhos, móveis e tapetes. Um filme intransponível. Nota enigmática.
O CAMINHO DE SANTIAGO de Emilio Estevez com Martin Sheen
Emilio poderia ter sido uma estrela nos anos 80. Sheen, que é seu pai, poderia ter sido uma super estrela nos anos 70. Aqui eles se encontram e o filho dirige o pai num filme que fala de filho que morre no caminho de Santiago. O pai vai buscar suas cinzas e resolve fazer o caminho pelo filho. Parece choroso e bobo? Não é. Trata-se de um simples e despretensioso filme de estrada. No caminho o pai faz amizade com holandês doido, irlandês chato e americana neurótica. Nada de muito original, mas o filme se deixa assistir. O final é muito bom. E pasmem! Um filme americano recente que fala sobre a morte!!!! Nota 5.
SE EU TIVESSE UM MILHÃO de vários diretores com estrelas da Paramount
Filme em episódios. O que os une é um milionário que resolve dar um milhão para uma série de estranhos. Vemos o que acontece então. Os melhores episódios são aquele do empregado da casa de porcelana, que de oprimido passa a agressor; do bandido que não tem como gastar o cheque e principalmente o episódio do gênio do humor, WC Fields, em história de um casal que ao ter seu carro abalroado no trânsito compra vários carros para poder bater à vontade em motoristas irresponsáveis. Fields é hilário. Lógico que o filme é desigual, mas esses 3 episódios valem sua restauração. Nota 5.
SORTILÉGIO DE AMOR de Richard Quine com James Stewart, Kim Novak e Jack Lemmon
É sobre uma feiticeira que resolve namorar um mortal. O filme tem um erro terrível: James Stewart. Um ator brilhante, mas que está totalmente deslocado como objeto do desejo de Novak. Sua figura é a de um velho professor de latim, Kim parece louca em amar figura tão pouco sexy. O filme tem aquele visual chic-meio-louquinho de sua época ( 1960 ) e Kim é linda de doer, mas o romance soa falso todo o tempo. Nota 5.
MEU NOME É COOGAN de Don Siegel com Clint Eastwood e Lee J. Cobb
Um ensaio para Dirty Harry. Clint, aos 38 anos, volta da Itália e estrela este policial. Fala de um xerife caipira que vai à New York de 1968 capturar um bandido doidão. A graça do filme está no contraste entre um cowboy violento e a geração de drugs-sex e rocknroll. A melhor cena é a da festa hippie: mulheres nuas, beijos gay, drogas e psicodelismo, e Clint, andando em meio aquilo tudo com chapéu de cowboy e botas. O rosto de Eastwood diz tudo o que ele pensava dos loucos anos 60: lixo. Pauline Kael sempre disse que ele era um fascista, um republicano. Se era ou não isso não importa, mas que o cara tem caráter, tem uma crença, isso ele sempre teve. Nota 6.
VELOZES E FURIOSOS 5 de Justin Lin com Vin Diesel e Paul Walker
O primeiro era divertido. Boas corridas, boa trilha sonora, mulheres legais. Os outros já não eram grande coisa. Este é o fim da picada! O que se passa? Eu não sonho com a volta de filmes como O Poderoso Chefão ou Taxi Driver. Isso seria pedir demais. Mas uma simples aventura como aquelas com Charlton Heston ou James Coburn, seria pedir demais??? Ninguém consegue mais escrever meia dúzia de bons diálogos e criar um herói gostável? Um Duro de Matar, um novo Mel Gibson, um Charles Bronson ! Nada disso aqui. Apenas burrice, podridão e tédio. Nota ZERO.

FRAGMENTOS, MÚLTIPLAS LINGUAGENS, CORTES TEMPORAIS, IRONIA... PORQUE CIDADÃO KANE É O QUE É, O MAIS MODERNO E O MAIS VAIDOSO DOS FILMES

Orson Welles foi um gênio. Esse foi seu legado, foi seu brilho e foi sua maldição. Pois ele era maior que o meio. Seu gênio foi do tipo renascentista, ele fosse nascido no século certo teria sido um Wagner ou um Leonardo. No tempo e no lugar em que nasceu, tornou-se um pastiche de si-mesmo. O cinema era pouco para ele, a tv era nada para ele, a vida lhe foi asfixiante. Foi um menino prodigio que tocava Mozart aos 3 anos, que se apresentava como mágico profissional aos 5 e que com 15 anos já excursionava com seu grupo teatral pela Irlanda. Aos 18 causou escândalo na Broadway com seu Macbeth negro e aos 19 era famoso em todos os USA graças ao rádio, midia que ele revolucionou. Aos 21 já era um mito do cinema. Aos 30 era um velho acabado.
Cidadão Kane é inacreditável. Nunca ninguém foi tão genial em seu primeiro filme ( !!!!!! ). Primeiro filme.... A impressão que o filme dá ainda hoje é das mais modernas possíveis: ele é feito de fragmentos, de estilos que se chocam, de tempos que se atropelam e de uma verdade que é sempre inescapável. Imaginar o que deve ter sido ver este filme em 1941, o choque que causou, o espanto e a inveja que fez nascer...
Todo o cinema feito até então está explicitada aqui: os primeiros minutos, dos mais belos da história, são puro Murnau e Lang. A câmera que voa, as fusões que dançam, o jogo com espelhos, as imagens deformadas, a fluidez...
Mas todo o filme é feito dessa liberdade extrema. Cada cena tem um estilo de cinema próprio. Há coisas do policial noir, do cinema poético francês, da fábula e da montagem russa, do épico de John Ford. Tudo Welles pega e usa a seu modo, e tudo ele destrói.
Não há trama cronológica, certas cenas parecem de documentário, a câmera treme e segue os atores, algumas falas são improvisadas, algumas são estilizadas. Ele cria, sem se perder, um frenesi de criatividade, uma fragmentação estética que espelha a própria condição da vida moderna: incerteza e fluidez sem fim.
É conhecida a riquesa das imagens deste filme. Rostos imensos cortando o foco, cenas de fundo vivas e ricas, a tela se enche de detalhes, de movimento e então se congela e se crispa em drama puro. Mas há mais: Welles, irriquieto, usa coisas operísiticas, usa o humor, usa tudo que o cinema permite e tudo que ele viria a ser. Godard, Altman, Scorsese, Coppolla, Todd Haynes, Paul Thomas Anderson, Tarantino, Lumet, De Palma, Kubrick, Cassavettes... tudo está contido em cenas de Kane, ele anuncia o futuro, condensa o passado, brinca com o meio, faz dele o mais mágico dos brinquedos.
Mas de toda essa riquesa, nada impressiona mais hoje em dia que a beleza de suas imagens. Gregg Toland se esmera em cada take, se doa por ter recebido, finalmente, liberdade para ousar o que quisesse. E ousou. Sombras, focos distorcidos, câmera baixa, sets tortos. Kane esgota tudo o que pode ser feito em cinema. Filmes melhores podem existir, filmes tão ricos e com tamanha complexidade de detalhes e ideias, não há.
Falar sobre os bastidores, tão ricos quanto, do filme, deixo para quem assistir os excelentes extras do dvd. O que enfatizo é que Kane é inesgotável. É por direito o filme que mais despertou vocações de cineastas ( e de criticos também ). Para quem ama o cinema é seu Hamlet e seu As Meninas ( de Velazquez ). Tudo o que Orson fizesse depois só poderia ser decepcionante. E esperto como ele era, sempre soube disso. Kane foi sua jóia e sua maldição.

BILLY WILDER/ GAINSBOURG/ FORD/ OSHIMA/ SIRK/ HELEN MIRREN

CUPIDO NÃO TEM BANDEIRA de Billy Wilder com James Cagney
De todos os clássicos diretores de Hollywood ( Ford, Hawks, Wyler, Stevens, MacCarey ) ninguém tem tantos filmes decepcionantes como Billy. Sim, ele é um cara genial, quando acerta, mas seus filmes fracos são mais irritantes que os filmes menos bons da turma citada acima. Este fala de executivo da Coca-Cola que trabalha em Berlin nos dias da construção do muro. É uma comédia boba. As piadas vêm e erram o alvo. O resultado é histérico. Nota 3.
A ÁRVORE de Julie Bertuccelli com Charlotte Gainsbourg
Fujam! Na Austrália morre um jovem pai em ataque cardíaco junto a árvore. Essa enorme e belíssima árvore é o centro e interesse único do filme. Pena que nada de interessante ocorra depois dessa tragédia. Quem quiser que encontre um sentido nesta coisa chata e lenta, se encontrar, esse sentido será acidental, o filme é tão cheio de "arte" que tudo pode ter um significado. Inclusive o significado da picaretagem. Nota 1 ( um ponto pela bela árvore ).
DONOVAN'S REEF de John Ford com John Wayne e Lee Marvin
A vida de um dono de boteco em ilha do Taiti. Acontece a visita de uma herdeira e mais nada. Ford, após cinquenta anos filmando. mostra sinais de cansaço. O filme é flácido, solto demais. Uma bela paisagem, atores gostáveis, mas nada mais que isso. Nota 3.
O MERCADOR DE ALMAS de Martin Ritt com Paul Newman, Joanne Woodward, Orson Welles, Anthony Franciosa
Belo exemplo de cinema adulto dos anos 50. Newman faz seu tipo mais habitual: o cara malandro, egoísta e carismático. Esse cara penetra em família do sul e acaba por se tornar herdeiro do "dono" de toda a cidade: Welles. Filhos que odeiam o pai, sensualidade reprimida, poder do dinheiro, homossexualismo, há de tudo um pouco. É uma diversão completa, um prato rico e gorduroso. Joanne está muito bem como uma solteirona. Nota 8.
O TÚMULO DO SOL de Nagisa Oshima
Em Osaka, anos 60, gente das ruas vende sangue para comer. Mais prostituição, drogas e Oshima, um diretor sempre violento. O filme é representante da Nouvelle Vague japonesa. Cores berrantes, câmera nervosa e cortes abruptos, incisivos. Oshima seria o centro desse movimento. O filme, um dos primeiros dele, é irregular, mas supreende sua modernidade. Nota 5.
TUDO QUE O CÉU PERMITE de Douglas Sirk com Jane Wyman e Rock Hudson
Muito melhor do que eu esperava. Sirk, dinamarquês rei do melodrama em Hollywood, faz aqui um dilacerante retrato da classe média da época ( terá mudado tanto assim desde 1955 ? ). Jane Wyman é uma viúva com dois filhos, cheia de amigos porém solitária. Ela se envolve com seu jardineiro, um jovem livre, que tenta seguir a filosofia de Thoreau. Ninguém aceita isso e os filhos ( quase adultos ) impedem o casamento. Só, ( e é chocante se observar como na época ver tv era considerado ato de perdedores, de gente sem vida social ), ela vê que caiu numa armadilha, os dois filhos seguem sua vida e ela fica à parte de tudo. Todo esse drama é conduzido de uma forma tão leve, fina, vibrante que é impossível resistir. Voce embarca na novelona. Fassbinder o refilmou na Alemanha e Almodovar sempre o cita ( além de Todd Haynes ). Rock Hudson era um canastrão, mas ninguém sabe ser mais tão galã. Nota 8.
MANON de Henri-Georges Clouzot com Cecile Aubry e Serge Reggianni
Clouzot é um dos maiores diretores que a França já teve. Fez pelo menos quatro obras-primas, mas este não é uma delas. Conta a história de mocinha muito "livre" que trai seu amor com vários homens de poder. O namorado sempre descobre, e sempre a perdoa. O final, hiper-romantico, é em deserto. O filme se vê com interesse, mas está muito abaixo do melhor Clouzot. Nota 5.
A RAINHA de Stephen Frears com Helen Mirren e Michael Sheen
Pra que ver este filme? Qual o interesse em se rever os dias da morte e do enterro de Lady Di? Tudo visto pelo ponto de vista de Tony Blair e da Rainha...pra que? Bem...o filme é estupendo, uma aula de direção e de interpretação. Stephen Frears, diretor da geração de Ridley Scott, mas que ao contrário de Scott, optou sempre pelo risco ( é dele a obra-prima Ligações Perigosas e ainda Minha Adorável Lavanderia, Alta Fidelidade, e mais uma infinidade de pequenos filmes instigantes ), dirige com uma eficiência que beira o milagre. Penetramos na mente de Elizabeth, conseguimos sentir o absurdo daquilo tudo, e melhor, não sabemos o que pensar. Ficamos desorientados. Mas há Mirren. Talvez seja este o desempenho feminino da década. Em personagem dificílimo, contido, frio, distante ( e tão cotidiano ) Helen cria uma alma, não imita. A rainha que ela nos mostra vai lentamente tomando consciência de sua derrota, do fim de uma ilusão. ( " Eu me recolho e nada declaro, sou sincera, enquanto isso essas pessoas que jamais a conheceram estão morrendo de dor, e eu é que sou a doida" ). Pois o filme é sobre isso: os súditos passam a querer lágrimas, frases pomposas, a exibição pornográfica de luto. Quando Di morre e a rainha se esconde, pois essa é a tradição, luto não é show, sentimentos devem ser contidos e discretos; o povo passa a odiá-la. O filme tem duas cenas de antologia: a hora em que ela lê as mensagens nas flores colocadas nos portões do palácio ( todas ofensivas a ela ) e a maravilhosa cena com o cervo, quando ela percebe a beleza que mora nele e o risco de ser caçado. Esse animal, que será morto lentamente e decapitado ( decapitação é o fim de todo rei deposto ) representa a bela elegância de uma época que morrera muito tempo antes, época que Elizabeth só então percebe ter chegado ao fim. De certa forma, Blair a salva dessa decapitação e ele acaba tomando seu partido. O filme então, feito pelo esquerdista Frears, tem a sabedoria de reconhecer que perante os novos tempos de midia e falta de respeito, ( são magnificas as cenas de telejornais da época, que mostram Lady Di tão falsa em sua "dor" e o povo deseperado com sua morte; e ainda vemos no enterro o absurdo de Elton John, Tom Cruise e Spielberg serem mais "gostados" que a familia de Di e de Charles ) a rainha ainda representa algo de decente, correto e de verdadeiramente real. O filme torna-se então imenso. Que admirável surpresa! Nota 9.
TERRA BRUTA de John Ford com James Stewart e Richard Widmark
Ford chamava este seu filme de "bela porcaria". Longe disso. Apesar de ele quase não ter história ( fala algo sobre brancos resgatados de Comanches ), o filme tem um ar de improviso, de alegre camaradagem, que acaba por encantar. Há quem o chame de obra-prima. Não é. Mas ele sem dúvida é invulgar. Nota 6.

QUANDO FREUD ERA REI : THE LONG, HOT SUMMER - MARTIN RITT

Na década de 50, em Hollywood tudo era freudiano. Cada fala e cada movimento de um personagem ( falo dos dramas dito sérios ) era calcado em edipianismo, repressão sexual, complexo de Electra, incesto, castrações e taras várias. Muita bobagem saiu desse caldo, pois todos estavam tão imersos nessa fé vienense que ignoravam que nem tudo que Sigmund ditava era verdade ( ou não pareceria ridículo com o tempo ).
Um dos melhores representantes deste estilo de cinema é THE LONG, HOT SUMMER, que no Brasil recebeu o nome inacreditável de O Mercador de Almas ( Freud explica? ).
O roteiro, perfeito, de Irving Ravetch e Harriet Frank Jr., condensa 6 contos de William Faulkner em duas horas. Milagrosamente dá certo. Quem dirigiu foi Martin Ritt, em seu terceiro filme, após triunfal carreira na TV.
Já se disse que se o sul tivesse vencido a guerra civil americana, os EUA seriam hoje o Brasil. Este filme mostra porque. Se passa na época contemporânea ( 1958 ) mas, feito no Tennessee, inspirado pelo muito sulista Faulkner, ele conta a história de um típico coronel ( que no Brasil seria um coroné do sertão ). Ele domina terras, comércio, politica e indústria de cidade. Gordo, falastrão, machista ( feito saborosamente por Orson Welles ), tudo o que ele deseja agora que está velho, é um neto. E para isso, como para tudo o mais, seu desejo é a única realidade. Na sua agressividade erótica, na sua sem-vergonhice, vemos o extremo amor a vida, o reino da libido pura. Esse coronel tem dois filhos. O filho-homem é um fraco. Seu único desejo é sexual, ele está enfeitiçado pela esposa, uma piranha sexy-jovem. O pai o despreza por isso e deixa isso claro. O filho se ressente, exibe seu sofrimento de filho não-amado e tentará matar o pai ( e ao fazer isso, readquire o respeito do pai. Sua cerimônia de entrada no mundo masculino é esse quase assassinato tabú ). A filha do coronel é uma insegura e auto-controlada professora idealista. Todo seu desejo, reprimido, é dirigido ao muito educado e calmo vizinho, um cavalheiro sulista a antiga, que irá se revelar gay. Nesse caldo de repressão, chega um homem que será o catalizador da quimica que irá fazer a coisa virar, a crise se instalar e a catarsis se tornar possível.
Ele é um desajustado, arrogante, frio e hiper-masculino matuto. Homem que vem em fuga, pois cometeu em outra cidade o pior dos crimes para aquela sociedade conservadora, ateou fogo a propriedade alheia. Ao pedir emprego ao coronel, ele irá penetrar no coração da familia. Ele e o coronel são dois iguais e reconhecem isso. O velho o adota como herdeiro e com esse ato ele destrói o filho de sangue e empurra o forasteiro para a cama da filha "certinha".
Essa história, que feita sem habilidade poderia se tornar pesada ou até ridicula, nas mãos desta equipe se faz leve, ágil e sempre interessante. Paul Newman consolida aqui seu tipo de mal caráter adorável. Ninguém soube como ele, fazer tantos tipos de péssimos costumes em filmes, e mesmo assim ser gostável. Com este papel ele venceu em Cannes como melhor ator. Joanne Woodward se casou com ele durante as filmagens ( duraria toda a vida ). A filha domina o filme. Joanne era uma atriz de gênio. Este papel, todo para dentro, é uma tour de force em seu modo de falar e na maneira como ela olha para ele. Anthony Franciosa é o filho sofredor. Ator do Actors Studio, sua intensidade é exata. Orson Welles sofreu muito neste papel. A maquiagem o asfixiava e os outros atores eram do estilo moderno de atuar ( o estilo que é o de hoje ), ou seja, buscavam dentro de si o âmago do personagem. Orson era da moda antiga, atuar era criar uma persona. Os choques foram dificeis. Além do que, Orson não perdia sua mania de querer roubar as cenas e dirigir o filme. Mas o patriarca que ele nos dá é fantástico. Um prazer vê-lo nesse papel.
Porque hoje não nos dão mais tanta fartura em um filme? Penso que se filmado agora ( o que seria dificil ) apenas um dos personagens seria mostrado. O diretor iria o dissecar lentamente, e todos os outros seriam coadjuvantes.
Se voce é daqueles caras que estão começando a descobrir que havia cinema antes de Tarantino, esse momento de renovação no cinema americano é um bom caminho de aprendizado. Os filmes feitos entre 1954/1965 de Ritt, Lumet, Frankenheimer, Penn, Schaffner, Nichols, Jewison, Mulligan e etc. É uma boa safra para se preparar para os pratos mais raros e de gormand..
Bom apetite!

PRISCILLA/ FUTEBOL/ POLLACK/ NOIR/ CHRISTOPHER REEVE/ SNOOPY

FALSTAFF de Orson Welles com John Gielgud, Jeanne Moreau, Marina Vlady
Com seu ego mastodontico, Welles mistura duas peças de Shakespeare centrando tudo em Falstaff, o gordo e alegre rufião. O filme é quase incompreensível. Tem uma genialidade: seus cortes. O filme tem tanta agilidade visual que chega a nos deixar tontos. Mas fora isso... nota 4
PRISCILLA, A RAINHA DO DESERTO de Stephan Elliot com Terence Stamp, Guy Pearce e Hugo Weaving
Este filme anuncia fenômeno interessante dos nossos tempos: a transformação do travesti em um tipo de herói infantil. Como provou o big brother, o gay fofo é hoje um tipo de herói para crianças. Se tornou um tolinho inofensivo. Os Dzi-Croquettes devem estar se revirando entre sua escatológica purpurina.... Mundo onde tudo ( sex, drugs e rocknroll ) se torna, cedo ou tarde, conformismo. Bem...aqui está um filme gay sem sexo. É bacana a paisagem dessa absurda Austrália e Stephan sabe dirigir, como mostrou em seu recente EASY VIRTUE, mas é tudo tão fofo, eles são tão crianças que chega a enjoar. Os atores, principalmente o grande Stamp, são inspiradas escolhas, nenhum deles sabe rebolar. E viva o ABBA!!!! nota 5
AUSÊNCIA DE MALÍCIA de Sidney Pollack com Paul Newmann, Sally Fields e Melinda Dillon
Porque este filme me emocionou tanto? Vamos a história: jornalista ( Sally, excelente ) é usada pela polícia. Ingenuamente ela pega notícia vazada e a publica. Isso faz com que a vida do investigado ( Paul ) se torne um inferno. Qual a culpa dele? Qual a culpa dela? Aqui o jornalismo é mostrado em todo seu comércio, ela não consegue parar de produzir notícia, ele acaba por engendrar uma forma engenhosa de colocar todos a nú. Este filme magnífico, vencedor do Oscar de roteiro ( Kurt Ludke ) é dirigido com a habitual eficiência por Pollack e mostra Paul Newman em plena forma. Sua primeira aparição, entrando na redação do jornal, em termos de autoridade e carisma viril coloca até Eastwood no bolso. Há ainda uma perturbadora atuação de Dillon como uma amiga frágil de Newman. Um muito grande filme. Nota 8
EM ALGUM LUGAR DO PASSADO de Jeannot Szwart com Christopher Reeve, Jane Seymour e Christopher Plummer
Um fracasso na Europa e nos EUA, estranhamente este filme se tornou clássico em dois países: Brasil e Japão. É porque essas duas culturas tão absolutamente opostas se encontram apenas naquilo que aqui é mostrado: a crença na influência dos mortos sobre os vivos. Este filme marcou toda uma geração que tem hoje entre 40/50 anos. Fala de volta no tempo, de amor eterno, de fantasmas. Mas atenção: se voce sofreu uma tristeza amorosa séria recentemente fuja dele. É um dos mais deprimentes filmes já feitos. Defende o suicidio abertamente. Só na morte o amor pode viver. No mais, Reeve tinha um rosto tão inocente que chega a comover. Faz muita falta um ator com essa imagem de caráter. Falar dos furos do roteiro de Matheson é como falar dos furos em Batman ou em Matrix, perda de tempo. Este filme não deixa de ser uma refilmagem muuuuuuito empobrecida e simplificada do genial RETRATO DE JENNIE, esse sim, filme que faz de crente até o mais ateu dos cinéfilos. Nota 5
NASCIDO PARA MATAR de Robert Wise com Claire Trevor, Lawrence Tierney e Walter Slezak
Filme noir. O que é um filme noir? Os criticos discutem faz tempo uma definição. Falam de sombras, de mulher fatal, de crime. Mas acima de tudo falam de destino, de ser preso num destino imutável. Aqui temos um dos melhores noir já vistos. E não tem nenhum herói, todos são ruins. Fala de um sádico assassino que se casa com milionária ingênua mas que tem caso com a irmã dessa milionária. O filme é bem sexy: todas as mulheres caem de tesão por ele. Dizem todas que sentem atração por seu jeito do mal. Wise dirige economicamente. O filme não se prolonga em bobagens, as coisas acontecem. Há um maravilhoso detetive feito por Slezak que é símbolo do roteiro: até ele se vende. Uma maravilhosa diversão no gênero mais amado ( e que menos envelheceu ) de Hollywood, o noir. Nota 9.
DUELO DE CAMPEÕES de David Anspagh com Gerard Butler e Wes Bentley
Em 1950, nos EUA, em St. Louis, forma-se um time de soccer. Eles virão ao Brasil, disputar a copa do mundo. Problema: futebol nos EUA é completamente amador. Os atacantes são cozinheiros ou coveiros. Nem uniforme eles possuem. Mas treinam e embarcam. Na copa eles serão protagonistas da maior zebra da história do esporte ( de qualquer esporte ) vencerão o time mais profissional do mundo, a Inglaterra. Uma pena os americanos não amarem o futebol. Uma pena o Brasil não saber filmar aventuras. O futebol mereceria filmes como os tem o box, o beisebol, o automobilismo, o hoquei e até o hipismo. Este filme é decente. As cenas de jogo são boas, e melhor, o Rio de 1950 é muito bem recriado. O jogo com os ingleses, que na verdade foi em Belo Horizonte, é filmado nas Laranjeiras. Os EUA vencerem os ingleses em 50, seria hoje como o time de rugby do Brasil vencer a Nova Zelândia. Ou um time de basquete da Bolivia vencer os EUA. Dá pra entender? Amadores vencendo profissionais famosos. Hoje seria impossível. Na época já foi impossível. Um milagre. Como filme ele é só ok. Faltam atores de mais carisma, de mais personalidade. Se feito com os jovens Paul Newman ou Nicholson seria maravilhoso. Mas vale conhecer este filme, que foi filmado realmente aqui e que respeita muito nosso país. Nota 5
CHARLIE BROWN de Bill Melendez, música de Vince Guaraldi
Saiu o dvd duplo com os primeiros Peanuts para tv. Nada existe de melhor. Schulz era um gênio. É ver e crer. Nota DEZ!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!