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BERCEUSE- CHOPIN POR MAURIZIO POLLINI.

Pela cortina, atráves do tecido branco. Meio dia, sol. Uma abelha. Água em um copo. Vidro. Não, nada disso! Outro tempo: Matando aula, estou na rua. Sento no meio fio. O suor gruda nos meus cabelos ( Meus cabelos! Deus! Eu fui um adolescente de longos cabelos românticos! Vejo em fotos: eu era bonito... ). Continuo: Sentado no meio fio são três da tarde. Um sobrado ao lado, todo branco. O quarto, lá no alto. Tem uma cortina branca. Voa ao vento da tarde. Alguém lá dentro toca piano. Estranho! Não sei se era um disco. Não sei se era um pianista ou uma mulher. Mas era ela. Sempre foi. Então eu ouço. E o sinal do intervalo toca na escola, a minha, lá no fim da rua onde estou. Gritos de crianças abafam o piano. Me ergo e vou pra casa. Eu sei que ela está agora comendo seu lanche. Com sol nos cabelos. E as mãos, distraídas, passam pela boca que mastiga. Camisa branca. O tempo se foi e eu estou de volta à mesma escola. E aquele sobrado ainda existe. Mas não ela. O amor agora é outro. E a escola, aquela, apagou seu restro dentro de mim. ----------------- Ouvir esta música é tudo isto. E é mais ainda. Chopin era uma afirmação da alma diante da matéria. Sua música é uma prece. Arabescos. Cascatas de notas. Cristais. Cenas de Max Ophuls. Preciosos momentos. Pollini, um grande, está a altura da missão. A música é a mais abstrata das artes. Construção invísivel de inefabilidades impossíveis. E duram. A ferramenta é o tempo. ---------------- Postarei o viedo de um menino indiano. Seu sorriso é isto.

La Ronde 1950 Sequence HD

O CINEMA ÚNICO DE MAX OPHULS

ERA moda na virada do século XX para o XXI a Viena de 1900. Queriam fazer um paralelo, como se este nosso tempo tivesse algo a ver com o hiper chique período de Klimt e Schoenberg. Estamos em alma muito mais próximos da virada do XVII para o XVIII. Max Ophuls é representante desse tempo. Seus filmes nos mostram o que foi aquele tempo. VEJO uma caixa com 4 filmes do mestre, lançadas em 2020 pela Versátil. Mais que filmes, são educação. Os filmes refinam nossa visão, afinam nossos ouvidos e despertam nosso gosto. A RONDA é dos filmes mais elegantes já feitos. Único diretor que pode ser comparado à Max é Michael Powell. Mas Powell é inglês, sua elegância é a do vitorianismo, assexuada. Raramente Powell fala abertamente de sexo, e quando o fez perdeu seu público. Sexo em Powell é desafio, consequência típica de um puritano. Sexo em Ophuls é prazer, sempre prazer, mesmo quando termina em dor. Anton Walbrock, o maravilhoso ator alemão que atua em tantos filmes de Powell está em filme de Ophuls. Isso não é casual. A BELEZA é superlativa. Há sofrimento em Ophuls, mas não há neurose. O mundo aqui é não freudiano. A valsa é o segredo deste cinema. Cada um dos filmes é como uma dança organizada. Max Ophuls é famoso por seus movimentos de câmera, e de Wes Anderson à Todd Haynes, não há esteta que não o admire. O problema é que o esteticismo desses diretores é, na maioria das vezes, apenas exibicionismo e homenagem. Em Ophuls é um modo de viver e de contar uma história. A CAMERA CANETA. É assim que muitos se referem à camera de Ophuls. Em época de máquinas grandes e pesadas, anos 50, ele já fazia a camera valsar. Ela não para. Corre pelas casas, voa entre rostos, revela cenários de luxo, dialoga com quem assiste. A melhor palavra para descrever as imagens é essa: LUXO. Os filmes de Ophuls são objetos de luxo. UM DOS FILMES se chama O PRAZER. É a própria filosofia de Max. Sua obra é uma ode à vida e as mulheres. Poucos diretores revelam tamanho amor às mulheres. E tanta compreensão por elas. São o centro do mundo e dos filmes. Klimt amaria estes filmes. VEJA esses filmes. Nada é mais apropriado para nossa época, tempo que ama o gozo mas não o prazer.

MARIA ANTONIETA É UM APURADO RETRATO DE 1999.

Não é um filme feito em 1999. Ele é deste século. Mas Sofia Coppolla faz um dos mais perfeitos retratos da geração que tinha 20 anos em 99. Mas vamos por itens...
Um dos mais exaustivos problemas em estudos literários, e que serve para tudo mais, é o fato de que jamais vamos saber o que significava ler Dante em 1400 ou assistir Wagner em 1860. Nós somos, em nossa parte mais profunda e básica, os mesmos homens de 1400 ou de 1860, mas jamais saberemos o que era SER um homem desses tempos. Sabemos o que um leitor de Dickens queria, temia, pensava, mas não sabemos "como ele se sentia lendo Dickens". Aquilo lhe era engraçado, triste, perturbador, tolo, mero passatempo, inesquecível...não há como saber. Basta dizer que um livro que voce leu aos 15 anos não é o mesmo aos 40 anos. Voce é o mesmo leitor. Mas sua experiência de leitura é outra.
Sofia Coppolla foi esperta. Um dos grandes problemas das adaptações literárias e dos filmes históricos é que os personagens se tornam "limbo". Não são figuras da época retratada porque não sabemos como elas andavam, falavam ou riam. E não são de nosso tempo, pois isso pareceria "tolo". ( Game of Thrones é um exemplo desse limbo ). Sofia teve a sacada de fazer da princesa da Austria uma menina de 1999. Isso faz com que o público de hoje SINTA o que seria ser uma princesa em meio a um ambiente hostil. Ninguém no filme tem atitudes ou gestos de 1780. Eles falam, agem e pensam como nós. O rei Luis é apenas um boa vida velho, o herdeiro real é um nerd virgem e a princesa é uma patricinha gastadora e de bom coração. Eles, os verdadeiros, eram desse jeito...Impossível saber como eles eram. Então, já que tudo na história oficial é uma convenção, que se faça aqui mais uma convenção.
Kirsten Dunst mereceria o Oscar do ano. Ela consegue ser crível em um papel impossível. Seu rosto de maravilhamento e de deslumbramento é sublime. Ela quase não atua, o que sempre, como Cary Grant dizia, é o mais difícil. Atuar, super atuar é simples. Dar um show de atuação, maquiagem e trejeitos, isso é muito mais fácil e óbvio que atuar "quase" como se não se atuasse. Quem subiu em um palco sabe disso. Dunst faz isso. O filme é uma linda oferta para ela. A gift.
Muito se falou da beleza estética do filme e do fiasco que ele foi. Nem isso e nem aquilo. Hoje ele está se tornando cult e a beleza não se compara aquela de Ophuls. Quem já viu um filme histórico de Ophuls sabe que a beleza de Coppolla é simples. Nunca suntuosa.
A crítica atual é tão mal preparada que chega a dar desgosto. Ninguém percebeu que toda vez que a princesa acorda e tem seu ritual da manhã, a música que toca é a mesma de ALL THAT JAZZ. A peça de Vivaldi. Só faltou ela dizer "Showtime!", como faz Joe Giddeon no filme genial de Bob Fosse. Esse é o paralelo genial de Coppolla. Giddeon fuma, bebe, transa muito e se arrebenta. Ele é o cara de 1960-1970, o cara do século XX. Quando no futuro olharem esse século todos os historiadores dirão que foi um século onde todos eram Joe Giddeon: Loucos. O que Maria Antonieta diz, e por isso a mesma música, é que ela aposta que este século será visto no futuro como um tempo parecido com Versalhes 1780. Luxo, futilidade, festas, inocência infantil e consumo. Jogo, drogas e risos em MEIO À RUINA TOTAL. Algum crítico notou isso...Não lembro de ter visto.
A revolução francesa venceu. Nosso tempo é o tempo que ama a liberdade, a fraternidade e a igualdade. Poucos percebem que elas são miragens e que sempre vão ser. Isso porque a liberdade não existe, pois somos limitados pela natureza, a igualdade nunca pode ser completa, pois nascemos diferentes e desejamos diferente, e a fraternidade é uma mentira. Somos naturalmente competitivos. Mas, nunca tanta gente viveu bem. O mundo ocidental tem uma fartura que não foi sonhada em tempo algum. E disso o filme também trata. Pois 200 anos de capitalismo moderno fez dos ricos pessoas menos ricas ( ainda ricas demais, mas muito menos que os ricos de antes ) e fez dos pobres pessoas com um estilo de vida inimaginável em 1780. ( Falo do mundo que contava em 1780 ). Milhões de pessoas vivem hoje a vida de Maria Antonieta. Jogo, droga, festa e sapatos novos. E inocentemente ajudam os pobres lhes dando brioches.
Por fim, o filme começa com Gang of Four. Uma obra prima do rock de esquerda dos anos 80. Isso faz voce esperar um filme sobre a revolução. Mas é um blefe. A trilha sonora, maravilhosa, é sobre melancolia. Pois junto às festas, há todo o tempo a sombra cinza da tristeza que flutua. Muito anos 80. Muito 1999. Muito hoje. Nada 1780. ( Incrível como para a geração nascida nos anos 60 a trilha sonora é tão importante quanto o filme em si. Culpa dos maravilhosos hits feitos entre 1963-1983 ). A trilha tem Sioussie, Cure, New Order, Bow wow wow e até Adam Ant. É um clipão chic dos anos 80. Muita gente disse isso. Mas provo aqui que é mais, muito mais.
Enjoy it!

MAX OPHULS/ JASON REITMAN/ GEORGE CUKOR/ JAMES BROWN/ LUC BESSON/ MYRNA LOY/ JEAN RENOIR

   HOMENS, MULHERES E FILHOS de Jason Reitman
É um daqueles dramas que eu chamo de "drama do abat-jour pastel". Tudo filmado no escurinho, em tons pastéis, com as pessoas falando baixinho, com suas caras sem expressão. Tenho uma colega que é mormon. Incrível como a América é marcada por essas religiões da limpeza, do comedimento, da ordem. Tudo se parece com ela, as roupas, as caras, o modo de viver e de reagir. O filme tem cenas de sexo, claro que vestidas, o filme fala de um mundo interligado, claro que superficialmente. E ainda termina com cenas bastante apelativas, digna do pior de Party of Five. Aliás, eu tenho uma teoria de que Party of Five, com seus teens falando baixinho e seus climas pastéis ( e aqui as pessoas chegam a ler no escuro ), é a realização cultural americana mais influente dos últimos 30 anos. Mais que Sopranos, Pulp Fiction ou X Men. A trilha sonora é sonâmbula. Por outro lado, o filme não me cansou, não me entediou e me fez sentir pena daquilo que fazemos com os pobres adolescentes...pobrezinhos. Só que o buraco é bem mais embaixo. Nota 4.
   JAMES BROWN de Tate Taylor
Das biografias que não param de produzir, esta é das menos óbvias. Isso porque se evita a odisséia das drogas e álcool, que estragou a bio de tanta gente. O filme tem uma excelente recriação do Alabama negro da década de 30 e sabe usar as músicas sem exagero. Uma coisa ótima:: as cenas musicais sabem passar a energia do som de James Brown, o cara que mais mudou aquilo que se entende por pop music. Brown trouxe o ritmo para o centro do som e desse modo criou o som de nosso tempo. O filme não é triste, é bem editado e diverte. Legal. Nota 6.
   UM AMOR DE VIZINHA de Rob Reiner com Michael Douglas, Diane Keaton
Deus meu que filme vazio! O planeta está envelhecendo e é isto que oferecem a esse público? A batida história do cara viúvo, ranzinza, que conhece uma maluquinha divorciada e após muitas brigas ficam juntos. God! Isso já era velho em 1970! Tudo bem, nada impede mais um plot batido, desde que bem feito, fresh, vitalizado. Jack Nicholson e a mesma Diane fizeram isso muito bem em 2000. Aqui não! Nota 1.
   AS DUAS FACES DE JANEIRO de Houssein Amini com Viggo Mortensen e Kirsten Dunst.
Em 1960 René Clement fez o filme mais elegante da história do mundo. Com roteiro de Patricia Highsmith, O Sol Por Testemunha, um suspense digno de Hitch, teve a sorte de capturar a Europa em seu momento mais classudo. Era aquele classudo esportivo, leve, fresco, que foi destruído pela onda hippie a partir de 1966. Este filme, também baseado em Highsmith, tenta esse clima classudo todo o tempo. Se passa em 1962, a beira do Mediterrâneo, e os atores se vestem naquele estilo despojado com finésse da época. Mas assim como o suspense vira brutalidade, a elegância vira afetação. Fake ao extremo, mesmo o ótimo Viggo e uma Dunst linda de doer não salvam a gororoba. Fuja! Nota 1.
   3 DIAS PARA MATAR de Luc Besson com Kevin Costner, Amber Head e Connie Nielsen
Quer saber? Bom pacas! Muito bem dirigido em suas cenas de ação, que são poucas, o filme tem trama, tem suspense, surpresas e um Costner na ponta dos cascos. Vale muito a pena! É melhor que um monte de besteiras tratadas como arte só por sua lentidão e pretensão. Nota 7.
  NÚPCIAS DE ESCÂNDALO de George Cukor com Katharine Hepburn, Cary Grant, James Stewart.
A peça de Philip Barry deu dois filmes clássicos, este, o melhor, de 1940, e Alta Sociedade, de 1956. Kate fez a peça em NY e a comprou. O filme salvou sua carreira. Ela faz a mimada socialite prestes a se casar pela segunda vez. Cary, no auge do relax, é seu ex-marido e James Stewart ganhou um Oscar fazendo um repórter que vai cobrir a festa. Sinal dos tempos, um repórter num casamento rico é considerada coisa de extremo mal gosto! O filme é um souflé perfeitamente realizado: leve, gostoso, chic e inesquecível. Os diálogos voam como tiros de açucar e os atores parecem brilhar com papéis que pedem esse brilho. É um filme obrigatório para quem ama a palavra no cinema. A edição do dvd traz um doc sobre Kate que vale muito ser apreciado. Ela foi única! Nota DEZ.
  TOO HOT TO HANDLE de Jack Conway com Clark Gable, Myrna Loy e Walter Pigeon
Hummm....este filme choca um pouco por seu machismo, racismo, e sua defesa do mau caráter "legal". Se voce conseguir relativizar tudo isso terá um agitado filme de sucesso típico do mais pop dos anos 30. Clark é um fotógrafo de jornal que vive usando mentiras para vender suas fotos. Pigeon é seu rival. Myrna Loy é uma milionária que vai a Guiana para procurar o irmão perdido na selva. Clark era na época o modelo do macho sexy. Gary Cooper era mais bonzinho, Cary Grant mais chic, Charles Boyer o romantico, e Clark o homenzão. Dos 4 é hoje o mais ultrapassado. Mas o filme diverte, diverte como um tipo de cartoon absurdo, um pastelão onde tanta coisa acontece que a gente fica até tonto de ver. Nota 6.
   OS SETE SUSPEITOS de Johnathan Lynn com Tim Curry, Madeline Kahn, Christopher Lloyd
Um bando de tipos estranhos são convidados a uma casa. Lá, um por um começam a ser mortos. Vi o filme por causa de Tim Curry, ator que é sempre um show. Ele quase consegue salvar o filme, mas o roteiro, de John Landis, é um desastre! Mesmo o clima soturno é mal realizado. Nota 3.
   BOUDU SALVO DAS ÁGUAS de Jean Renoir com Michel Simon
Ah o sacrifício que a gente fazia pelo cinema....Eu tinha visto este filme numa cópia horrível nos anos 80, na TV. Era um borrão truncado. Aqui está a cópia nova! O filme brilha! É um dos clássicos de Renoir, e como todo filme de Renoir, ele nos desconcerta! Boudu é um vagabundo que cai no Senna. Recolhido por um senhor burguês, ele se mostra um homem irritante. Boudu seria um tipo de homem "foda-se", o cara que não tá nem aí, que não liga para educação ou bons modos. O filme fica assim duro de ver, porque Boudu nos irrita. Ele  mal agradecido, egoísta, sujo, mentiroso, um chato. Mas não sei porque, quando ele termina, e só quando termina, sentimos ter gostado do filme. Estranhamente, parece que pressentimos que havia algo ali. Bom, as cenas de rua são lindas! Renoir mostra a França de 1933, coisa rara então, e essas tomadas nos encantam. É um filme que preciso rever.
   LA RONDE de Max Ophuls com Simone Signoret, Gerard Philipe, Daniel Gelin, Danielle Darrieux, Simone Simon, Fernand Gravey e Jean-Louis Barrault
Lindo, alegre, mágico, encantador. Ophuls dá uma aula de cinema. Como diz PT Anderson no post abaixo, os personagens dão aos atores a possibilidade de atuar, Anderson mostra uma tomada, sem cortes, onde a câmera roda pelo set e deixa a atriz, Darrieux, atuar. Todd Haynes em outro post abaixo fala da beleza dos filmes de Ophuls. Este filme é uma dádiva, um presente, um prazer. Nota DEZ!

Todd Haines - Infinite pleasure Le Plaisir de Max Ophüls



leia e escreva já!

Paul Thomas Anderson on Max Ophuls



leia e escreva já!

A RONDA, O MAIS CIVILIZADO DOS FILMES. QUEM O FEZ? MAX OPHULS, QUEM MAIS SERIA?

   E esse filme poderia ser usado como um tipo de teste. Colocar para alguém assistir e observar sua reação. Quanto mais ele gostasse e penetrasse em seus prazeres, maior o nível de civilidade ela passaria a poder ostentar. Jamais em toda minha vida, pude ver, ouvir ou presenciar tamanha dose desse valor hoje tão raro, a civilidade. O prazer que essa obra prima me ofereceu é digno da maior gratidão, aquela do amor.
  Demorou para encontrar esse filme mítico. Tive uma cópia estragada, agora achei afinal uma perfeita. Lá está a fotografia de Matras, e o cenário, um dos melhores do século, de D Aubonne. Cenário imenso, propositadamente artificial, um imenso cenário que gira, que tem ruas, pontes, praças, montes de fachadas, dúzias de interiores, quartos, todos detalhistas, preciosos, uma festa sonhadora para os olhos.
  Lá estão os atores. Anton Walbrook faz o apresentador. Ele conduz a ação. Nos dá o contato às histórias interligadas, todas formando um carrossel, o carrossel sexual do amor. Sim, amor que aqui é sexo, sexo assumido, o filme, como se mostra numa cena de humor, é bastante ousado para seu tempo. Afinal, trata-se da melhor adaptação de Schnitzler da história. A Vienna dos prazeres, da cama, dos restaurantes, da hipocrisia e desse humor que faz a vida rodar e valer a pena. Simone Signoret é uma puta de rua. Serge Reggiani um soldado que a pega. E depois vem Simone Simon como uma empregada linda. Há uma cena de sedução com seu patrão onde ela exibe uma malicia saudável que ecoa até hoje. Observe o olhar que ela dá! Apaixonante! E tem Barrault fazendo um poeta exagerado que nos deixa cheios de risos e de admiração pela arte desse ator de gênio. E muito mais! Um Fernand Gravey austero e fixo, um Gerard Philipe comedido e romantico... O filme flui nessa profusão ritmica de belas falas, grandes atores, cenários magnificos e a direção...
  Hora de falar de Max Ophuls. Delicado gênio de Vienna. O que seria do cinema sem essa cultura do império austríaco de 1910? Não teríamos Ernst Lubistch, Billy Wilder e Max Ophuls. Dentre muitos outros. O cinema não conheceria o humor vienense, o luxo de Vienna, o modo de ver a vida como uma confusão de desejos e de armadilhas. Max foi dos 3 o mais infeliz. Fugiu da guerra e em Hollywood se deu muito mal. Ao contrário de Lubistch, que se tornou o rei da Paramount, e de Billy, que se sentiu em casa na América, Max nunca se adaptou. Ele manteve as raízes e os filmes que fez em Hollywood fracassaram. Voltou à Europa e na França fez seus melhores filmes. Madame D... é o melhoir, mas este chega muito, muito perto. A câmera, no estilo tipico de Ophuls, dança por entre as pessoas e o cenário, objetos se interpõe entre a lente e os atores, a imagem se distorce e a história flui num tipo de sonho prazeroso com ameaças de dor. É uma festa! Fácil entender o porque de tantos jovens diretores que não o conheciam, conheciam só de nome, se encantarem com ela agora, no tempo do dvd. Max é único! Nenhum outro se parece com ele. E mesmo em Hotel Budapeste, o filme mais Ophuls de Anderson, o estilo de Max aparece apenas em breves citações ( O que mostra o valor de Wes Anderson. Ele nunca tentou o imitar. )
  Chega de falar que eu quero o rever! Grandes filmes nos dão vontade de viver dentro dele. E este, com sua civilidade, beleza, extrema delicadeza e verve, promete um universo de encanto glamuroso. Dizem que Baz Luhrman tenta ser o Ophuls de seu tempo. A diferença entre os dois mostra a diferença entre nossos tempos. O que em Baz é histeria aqui é luxo. O que em Baz é exagero aqui é precisão. Baz nos dá um carnaval, Max um passeio. No mais belo dos lugares, seus filmes.
  Eu vos convido. Assistam e se testem. Acho que passarão...

O CINEMA ROMÂNTICO DE VIGO, OPHULS, GONDRY, LUHRMAN, WRIGHT....

   Tenho uma preguiça enorme, assistir O Gatsby de Luhrman aumenta essa minha indolência. Detestei Moulin Rouge e achei Romeu e Julieta bacaninha. Mas admiro Luhrman mesmo assim. Como admiro Gondry, apesar de achar que nenhum de seus filmes tenha dado certo. Quero muito ver o novo, porque gosto de Boris Vian, um tipo de Serge Gainsbourg mais velho e menos pop. Luhrman, como Gondry, como Aronofski, é um romântico. Eles criam mundos dentro do cinema. Seus filmes não se preocupam com utilidade, verdade ou realismo, eles criam. E por desejarem criar, erram muito. Falam de sentimentos. Ou pelo menos tentam isso. E não se sentem censurados. Vão até a breguice extrema. E daí?
   O que lhes faz falta são melhores roteiros. Tiveram o azar de nascer num tempo que não lhes dá bom material para trabalhar em cima. Quando topam com bom roteiro, acertam; quando não, fazem apenas pastiche, ou looooongos video-clips. Em comum, todos são fãs do cinema hiper-romântico de Cocteau, Ophuls, Vigo e principalmente de Michael Powell. Todos esses mestres trabalharam com roteiristas de gênio. E todos criaram o apuro visual de Gondry e etc. Cocteau com cenários de sonho, Ophuls com seus movimentos de câmera à valsa vienense, Vigo com a poesia de seu mundo lunar e Powell na criação de universos irreais.
   O jornal The Guardian publica matéria sobre Powell. Diz que no cinema inglês, ele é o único que pode ser comparado a Hitchcock e a David Lean. O cinema de Powell não se interessa pela alma do personagem ( e nisso ele é o oposto de Bergman ), mas sim no mundo que cerca esse personagem. A contemporaniedade desse cinema se revela aí: o cinema de Powell, como o mais moderno cinema que hoje se faz, fala do meio e não do ser, do lugar e não do homem, da ação e nunca do pensamento. É cinema puro, visual, espetacular e muito romântico por ser uma busca pelo ser diferente.
   Um depoimento de Scorsese. Ele diz ter visto THE RED SHOES aos 9 anos. Uma cópia estragada. E diz Martin que esse filme mudou sua vida. THE RED SHOES fez na criança Marty a certeza de querer criar, de querer ser artista. Hoje, em 2013, Scorsese se dedica a restaurar todos os filmes de Powell. Todos.
   Em 1975 era Michael Powell o mais esquecido dos mestres. Na época do hiper-realismo, os filmes de Powell pareciam fake. Foi então que Scorsese foi se encontrar com Powell na Inglaterra e lhe contou sua história de amor a seus filmes. Não só ele. Spielberg, Coppolla, De Palma, Schrader, o diretor inglês ficou abobado ao saber que os jovens diretores dos EUA eram seus fãs. Coppolla lhe deu emprego, consultor de roteiros e Scorsese organizou uma mostra de seus filmes em NY. Quando os anos 80 começam, Michael Powell tem seu nome reabilitado. Para sempre.
   J.G.Ballard também conta que os filmes de Powell despertaram nele a vontade de escrever. E ainda se diz que T.S.Eliot, cujo filme favorito era o TRONO MANCHADO DE SANGUE de Kurosawa, amava os filmes de Michael Powell também. Eles são poesia, claro. Dizem tudo falando pouco. Sugerem. São pura música.
   Agora, 2013, época de cinema em crise, onde em vinte anos mal se produziram vinte filmes eternos e absolutos, os filmes de Powell, revistos e revistos, restaurados e estudados, analisados e copiados, dão, aos diretores que tentam ainda algo de diferente, a esperança de um dia acertar. Joe Wright tentou isso em ANNA KARENINA e foi terrivelmente mal entendido. A suntuosidade da forma em função do sentimento. Só que lhe faltou a coragem de ir mais longe no sentimento, erro que Powell nunca cometeu ( seus filmes são cheios de emoções ). É como se hoje se copiasse a forma e se tivesse medo do sentimento. Why?
   O motivo é claro: Não dá pra ser romântico e ser cool ao mesmo tempo. Cool é assistir os filmes de Vigo ou de Ophuls, cool é ter o visual rico e onírico de seus filmes, mas não seria cool crer, como eles, no amor ou nos sentimentos "quentes". Para salvar a imagem cool, se fica no meio do caminho.
   Interessante saber que O TOURO INDOMÁVEL foi feito com dicas visuais de Powell ( ele morreu em 1990, casado com a editora de Martin ), e que há um filme de Martin que é seu sonho de fazer um filme à Powell ( A ERA DA INOCÊNCIA ).
   Para finalizar, no festival de Cannes de 2009 foi exibido em grande gala, a cópia restaurada de THE RED SHOES. Para a crítica, foi a melhor coisa do festival.
   Novo, belíssimo, emocionante, enigmático. Romântico pois.
  

ESPÍRITO SUPERIOR: DESEJOS PROIBIDOS, FILME DE MAX OPHULS

A beleza.... ver este filme é uma humilhação para nossos tempos. Cultuadores do feio e do grotesco que somos ( desde Picasso? Stravinsky? ). Max Ophuls, diretor vienense desta obra-prima, talvez o mais belo filme já feito, volta a Europa após exilio americano, e volta a seu mundo. Mas é mundo já morto em 1953, ano desta produção. O que dirá hoje, tempo de funk e de Chavez ?
Em sua primeira parte o filme é só leveza e bom humor. O que assistimos é o belo mundo das elites do final do século XIX. Não é o mundo de Henry James. James mostra o mundo do futuro, do dinheiro, da América. Aqui é o fim da Europa, fim de um passado, e o que move tudo são os bons modos, as aparências, os costumes, a honra. Nada de americano.
Nunca se fizeram cenários como estes ( e percebemos o porque do amor de Todd Haynes e Baz Lhurmann a este diretor ). São espelhos, tapetes, jóias, móveis, roupas, janelas, pinturas, em tal quantidade, de tanto gosto, é tudo tão luxuoso, tão chic, tão delicado, que dá vontade de abaixar o som e ficar apenas olhando. Mas há a câmera e ela não pára. Ophuls a faz voar pelos cenários, cruza paredes e janelas, flutua pelas tapeçarias. Baila. E é tão suave que mal notamos seu movimento. Os atores sabem se comportar. São dignos do filme que lhes é ofertado. Mas Charles Boyer é mais que isso.
E ainda há uma história. Sobre brincos que são vendidos e insistem em voltar. Esposa infiel e marido general que leva a vida como ordem militar. E em sua segunda parte o filme torna-se drama e é exemplificada a diferença entre homens e mulheres: elas, quando amam, mandam os costumes para o lixo; eles se atèm ainda a seus papeis. Vem o final, um duelo para lavar a honra e uma igreja com velas e diamantes. A beleza vence.
Falar de filme como este é tarefa ingrata. A esposa, futil que se torna apaixonada, é Danielle Darrieux. O amante, nobre italiano, é Vittorio de Sica. E o general, corno que mantém a pose, e´Charles Boyer. Perfeitos. Danielle é pura cocotterie, De Sica é o sedutor que se confunde e Boyer dá um show como o militar rígido. São, dignamente, diamantes em imagens que são joalherias. Ofusca e entorpece a correção, o luxo ao ponto extremo, a civilidade, o savoir faire. Mas, fã de Stendhal que Ophuls era ( o filme tem muito do espirito de Stendhal e de Mozart ), é também mostrada, com muita leveza, o que havia de asfixiante, de falso, de tolo, em toda essa pose presunçosa. A paixão real não pode existir em espelhos de cristal e peles de vison. Fenece.
Max Ophuls é um espírito extinto. Ver este filme é tomar contato com outro mundo, outro cosmo, outra existencia possível. Somos os orfãos do planeta aqui exibido. Ainda queremos, cegamente sem saber, tudo o que é aqui mostrado. Mas não é mais possível obter ou ao menos tentar esse tipo de conforto e de código de conduta. Então, orfãos, nos embrutalhamos. Seria cruel ter Ophuls neste nosso universo. Fica seu legado de beleza. E a certeza de que já fomos muito melhores.

MAX OPHULS/ RIVETTE/ HOMENS QUE ENCARAVAM CABRAS/ MARGARET SULLAVAN

AMEMOS OUTRA VEZ de Edward H. Griffith com Margaret Sullavan, James Stewart e Ray Milland
Acabou de sair em dvd e já se esgotou. Vários milagres ocorrem neste filme. É um melodrama que nunca se torna piegas. Tem uma atuação de Margaret Sullavan que é pura feitiçaria : ela atua sem jamais parecer atuar. Ficamos comovidos com a naturalidade de suas falas e de seu gestual. Toda a vulnerabilidade exposta. Antológica. Stewart e Milland estão muito bem, mas são ofuscados pela atuação histórica de Sullavan. O filme trata de um casal. Ele é jornalista, ela é atriz. O amor os une, mas o que os une é apenas o amor. O filme mostra que isso é pouco para fazer deles um casal feliz. Eles se casam, mas a vida os separa. Raramente o cinema foi tão adulto e muito mais raro é mostrar os desencontros da rotina destruindo o amor. Apesar do final precipitado ( o filme tinha de ser mais longo ) é uma obra-prima. Ao final voce carrega o filme dentro de seu peito. Atenção : ele jamais ameaça fazer chorar. Mas nos toca de forma mais profunda. A cena do reencontro ( mais um ) é de antologia. Sullavan foi uma gigante. Nota DEZ!!!!!!!!!!!!!
HOMENS QUE ENCARAVAM CABRAS de Grant Hesley com George Clooney, Jeff Bridges, Ewan McGregor, Kevin Spacey
Filme de doidão. É uma tentativa de se fazer um filme dos anos 70 em 2010. Claro que foi um fracasso. Os atores estão excelentes, mas essa sátira à guerra, sobre batalhão de soldados psíquicos naufraga na falta de estilo e de ritmo. Algumas boas idéias não salvam o filme da chatice geral. Nota 2.
A BELA INTRIGANTE de Jacques Rivette com Michel Piccoli, Emmanuelle Beart e Jane Birkin
De todos os diretores da nouvelle vague Rivette é o mais chato. Este premiado filme leva tres horas e meia para mostrar um pintor pintando uma menina nua. Claro que o filme fala sobre o processo de criação, sobre as relações de homem/mulher, sobre a inspiração. Mas pra mim, é um pretesto para se exibir Beart nua. Emmanuelle Beart é a atriz mais bela dos anos 90 e o filme exibe isso sem nenhum pudor. É o que ele tem de melhor. No mais, pincéis, taças de vinho, belas casas de campo, e conversas desinteressantes. Emmanuelle é linda. Nota 3.
ÓDIO NO CORAÇÃO de John Cronmwell com Tyrone Power, Gene Tierney e George Sanders
Se Beart é a mais linda atriz dos anos 90, talvez Gene Tierney seja a mais linda de sempre. Cada close dado em seu rosto exótico ( ela tinha sangue chinês e americano ) provoca a certeza de que a beleza é mesmo para sempre. O filme, em seu estilo perfeito, fala sobre garoto injustiçado, sua fuga da Inglaterra e a fortuna conseguida nos mares do sul. Termina com julgamento e vingança. É o filme popular com história, o filme povão que nunca apela, o filme que satisfaz o cara que procura só um passatempo e diverte o cinéfilo. Tipo de cinema industrial do qual sinto falta. O filme que tem ação e romance, bom roteiro, produção cara e atores de carisma imorredouro. Foi isto que fez de Hollywood mito. Relaxe e goze. Nota 8.
CORAÇÃO PRISIONEIRO de Max Ophuls com Barbara Bel Geddes, Robert Ryan e James Mason
De vez em quando um diretor do passado se torna moda. Junta-se ao panteão dos intocáveis ( Bergman, Kurosawa, Welles, Wilder... ) algum diretor mais ou menos esquecido e se começa a divulgar sua genialidade. Nos anos 70 foi Ozu, nos 80 Michael Powell, nos 90 Melville e agora é Ophuls. Interessante notar que é sempre um ou mais diretores que chamam a atenção para o diretor quase esquecido. Ozu por Wenders, Powell por Scorsese e Coppolla, Melville por Tarantino. Max Ophuls, alemão que fugiu do nazismo e fez uma série de filmes na América, depois retornando a Europa, é amado por Todd Haynes e Baz Lhurmann. O estilo Ophuls está presente explicitamente nos dois. Os filmes de Max são femininos. Há um cuidado com vestuário e cenário, um modo de movimentar a cãmera em ritmo de melodia, uma atenção a sentimentos não ditos, uma delicadeza encantadora. É um cineasta que expressa frustração, raiva engolida, tudo aquilo que deveria ter sido e nunca foi. Estranho observar que a vida de Ophuls foi exatamente como seus filmes, frustrante. A história fez com que seu talento se perdesse. Pois ao contrário de Billy Wilder ou de Fritz Lang, Max jamais se adaptou aos EUA. Este filme fala de um milionário louco que se casa com moça vulgar e carreirista, apenas para contrariar seu analista freudiano. Sabemos que Ophuls tentou trabalhar com Howard Hughes. Sabemos que Hughes o humilhou. E vemos Robert Ryan em 80 minutos fazer um Howard Hughes com a complexidade que as 3 horas de Scorsese e Di Caprio não atingiram. Ryan mostra um homem cruel e sádico, torturado e muito isolado. O filme também fala do amor ao dinheiro ( ela quer crer que o ama, mas ama apenas seu poder ) e não a toa, a primeira imagem deste brilhante drama é a de Barbara, em apartamento pobre, vendo os anúncios da Harpers Bazaar. A câmera de Ophuls se mexe todo o tempo, atravessando paredes, subindo ao teto, dando closes e planos gerais. E nunca nos sentimos incomodados por isso, mal o percebemos. Este filme foi fracasso na época, hoje está justiçado. É um belo drama. Nota 9.
SANGUE NA LUA de Robert Wise com Robert Mitchum e Barbara Bel Geddes
Western de sombras escuras que fala de disputa por gado e terra. Mitchum é o pistoleiro que muda de lado. Wise dirigiu de tudo : musicais, comédias, sci-fi, terror, guerra, filme de espiões, romances. É dele A Noviça Rebelde, Jornada nas Estrelas e West Side Story. Fez tudo muito bem, mas nunca com genialidade. Este é um western impessoal. Dá pra ver, nunca aborrece, mas se esquece em seguida. Nota 6.

VINCENTE MINELLI/ GUERRA AO TERROR/ MAX OPHULS/ GEORGE CLOONEY

GUERRA AO TERROR de Kathryn Bigelow com Jeremy Renner
Estéticamente é um filme miserável. Usa e abusa de câmera tremida e é todo closes. Feito para tela pequena, para o nosso mundo de dvd. Mas mesmo assim é um excelente filme. Howard Hawks disse que para se fazer um grande filme bastam duas grandes cenas e nenhuma cena ruim. Este filme tem duas grandes cenas, mas tem uma muito ruim. O tiroteio no deserto é sua melhor cena. E o iraquiano amarrado em bombas é a outra. De péssima, a cena dos socos. Está longe de ser um filme profundo. O fato de merecer, sim, o Oscar de melhor filme, mostra onde estamos. Ele é superficialmente excelente. Ficamos absorvidos, vendo todo aquele som e fúria sem significado. Mas como em Tarantino, assistimos a talento puro sem assunto. Um adendo : Assim como nos anos 50 o tema válido era a normalidade ( o que é normal, o que é doentio ) e nos 60 era a busca por sí-mesmo ( quem eu sou e o que posso ser ), hoje o único tema relevante é a violência. Falar da violência é tocar no centro de nossa vida. Todos os outros temas são pouco urgentes. Para quem quiser saber, o grande tema dos 70 foi a paranóia, dos 80 foi o poder e nos 90 a dispersão da vida. Guerra ao Terror é retrato perfeito nosso : a guerra como guerra, sem heroísmo, sem vilões, sem política, sem porquê. Apenas um modo de se viver. De se viver intensamente. Como a droga. Nota 8.
NA TEIA DO DESTINO de Max Ophuls com Joan Bennet e James Mason
Para quem não sabe : Ophuls foi um diretor austríaco que emigrou para a Amércia durante a segunda guerra. Seu estilo é fluido, sensual, estético. Não foi feliz nos EUA e voltou para a Europa nos anos 50 onde também teve problemas com produtores. Tipo de diretor que poderia e deveria ter feito muito mais. Aqui, em clima noir, conta-se a história de mãe que protege a filha de chantagista que viu ela matar seu ex-namorado. Mason é um dos chantagistas que se apaixona pela mãe e paga por isso. O filme é simples, envolvente, bonito e magníficamente bem interpretado. James Mason, inglês com carreira nos dois continentes, era perfeito para esse tipo de papel, o de homem fragilizado. Um filme que representa outra era, o tempo dos filmes objetivos, curtos, diretos e profissionais. Nota 7.
A ÁRVORE DOS ENFORCADOS de Delmer Daves com Gary Cooper, Karl Malden e Maria Schell
Médico chega a cidade mineira. Começa a clinicar e se envolve com moça vítima de assalto. Ele é um homem estranho, bondoso e muito cruel ao mesmo tempo. Eis básicamente a sinopse do filme. Mas ele é bem mais. Coisas acontecem sem parar e tanto quanto o papel de Cooper, todo o filme parece meio doentio, torto, quase neurótico. Malden tem maravilhoso papel, um mineiro mentiroso que tenta violentar a moça. Gary Cooper é Gary Cooper, o maior ladrão de cenas de Hollywood, ficamos olhando pra ele sempre à espera do que ele vai fazer. O protótipo do que é ser astro. Daves foi com Mann e Boeticher, um dos últimos grandes diretores de westerns. 7.
O DIABO FEITO MULHER de Fritz Lang com Marlene Dietrich e Mel Ferrer
Ruim. Lang faz aqui um western todo errado. Se parece com uma sátira que não deu certo. Tenta ser leve e esperto, é apenas desagradável. Lang quando acerta é genial, mas quando erra é odiável. Este é puro ódio. Nota zero.
AMOR NA TARDE de Eric Rhomer
Quem não gosta de Rhomer acha que todos os seus filmes são iguais. Não são. Alguns são encantadores. Outros são menos que nada. Neste tudo é nada. Porque ? Muito simples. Como em Rhomer nada é artifício, tudo depende de nosso afeto pelos personagens. Aqui não se cria esse afeto. Olhamos aqueles caras falando e não queremos saber quem eles são ou o que têm a dizer. O filme naufraga. Nota 1.
AMOR SEM ESCALAS de Jason Reitman com George Clooney
Comentei este filme? Acho que só falei dele por alto. Bem... é o mais vazio dos filmes. Os personagens fazem coisas, mas o roteiro é incapaz de nos dizer quem eles são. Quando o filme se encerra continuamos não tendo a mínima idéia do que aconteceu. Porque na verdade nada aconteceu. Todos os personagens não têm razão de ser. E nem a irrazão do niilismo eles possuem. A menina deixa de ser dura e profissional sem qualquer explicação. Clooney se derrete porque ? Nada nos convence de nada. Para aceitar o que acontece precisamos desligar todo senso crítico, o que é lamentável. Pois o tema, se melhor escrito e dirigido com mais fibra, renderia um ótimo filme. Como está ele é xoxo, superficial e falso. Aliás, sua única verdade é seu conservadorismo. Sua mensagem explícita é : a família é o paraíso. Fora dela a vida não tem razão. É uma mensagem tão antiga que chega a ser vitoriana. É pré-Freud. Reitman, que produziu o filme com seu papai, Ivan Reitman, é o rei do cinema para meninos. Filmes fofos e sensíveis, isentos de qualquer raiva ou violência. Ah... e tem a trilha sonora ! Músicas de violão de vozes chorosas. São tão meladas que o CROSBY, STILLS E NASH perto delas é punk puro. Um horror !!!!! Mas há algo de bom neste melô, é George Clooney. Esse ator que destoa dos outros ( não tem músculos e tem cabelos brancos, sabe se vestir e fala com clareza ) aperfeiçoa aqui seu modo Cary Grant de atuar. Consegue passar alguma vida real neste filme tão castrado. No final chega a ser comovente sua vontade de dar profundidade a roteiro tosco. Ele é o filme. PS ; o filme me fez perceber que não estou fora deste mundo. O personagem de Clooney retrata superficialmente a minha condição espiritual : no ar. Uma pena este tema ter caído em mãos tão puerís..... nota 5 ( por Clooney, apenas )
ASSIM ESTAVA ESCRITO de Vincente Minelli com Kirk Douglas, Lana Turner, Gloria Grahame e Dick Powell
Voce quer saber o que é um roteiro perfeito ? Veja este filme. Uma mistura deliciosa de emoção e fantasia descabelada, de bons diálogos e ação corrida, drama e charme sem pudor. E com bons atores e um diretor esbanjando gosto. Que mais voce quer ? A história : Kirk é filho de falido produtor de cinema. O filme conta como ele reergueu essa companhia usando pessoas e roubando idéias. Quando o filme começa ( ele é em flash-back ) ele já faliu novamente e o que vemos são 3 de seus ex-colaboradores rememorando sua vida. Um diretor, uma atriz e um escritor. O filme cita deliciosamente a vida real. Lana Turner tem fixação pelo pai, estrela alcoólatra. É óbvio que esse pai é John Barrymore. Há ainda personagens que lembram William Wyler, King Vidor, Ava Gardner, Ramon Novarro, Billy Wilder e vasto etc. Tudo combinado de modo tão hábil que chega a nos causar um perene sorriso de prazer e cumplicidade. Kirk faz o tipo de papel em que é insuperável, o canalha. E Lana faz a alcoólatra ninfo em que se esmerou. Aliás o filme brinca com pólvora, tanto Lana como Gloria não eram fáceis. Lana, hiper estrela da Metro, envolveu-se em escândalo. Sua filha namorou o gangster de quem ela própria era amante. Tudo terminou em assassinato ( a filha matou o amante da mãe ) e Gloria era casada com o homossexual Nicholas Ray, amante de James Dean ( ele, não ela ). Gloria se separou de Ray e descobriu-se que ela tinha dúzias de casos, com homens e mulheres e até com um filho adotivo. Que elenco !!!!! O próprio Minelli era casado com Judy Garland, que morria de solidão, pois Minelli era outro caso de gay tentando mudar de vida e não conseguindo. Ela mergulharia nos remédios e ele continuaria colecionando porcelana. E fazendo filmes tão geniais como este e mais UM AMERICANO EM PARIS, O PIRATA, A RODA DA FORTUNA e mais alguns etcs... Assista este filme malicioso, fantasioso, adorável e divertidíssimo. Aprenda como se faz um filme sólido. Nota 8.