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UM ELOGIO A DIE HARD USANDO BEATLES E BEETHOVEN COMO EXEMPLO

   A menos nobre das artes: o cinema. Apesar da arquitetura, que tem feito uma força enorme para se auto- aniquilar. É a menos nobre por ser a mais vulgar, a mais popular, aquela que foi criada por circos e por cientistas, não por "artistas solitários".
   A música pode ser tão vulgar quanto o cinema. Mas ela tem Beethoven e Bach. Beatles e Bob Dylan. Duke Ellington e Count Basie. Cartola e Caymmi. Bartok e Debussy.
   Veja: Mozart é nota 10. E Louis Armstrong também pode ser nota 10. Há na música essa coisa maravilhosa que não há nas outras artes, a democracia do mérito. A música mais intelectualizada, Brahms por exemplo, pode ser colocada em pé de igualdade com música feita por analfabetos ou música popular, como a de Cole Porter ou a de Robert Johnson. Por ser a mais abstrata das artes, por independer de linguagem racional, a música tem essa democracia.
   Na literatura isso é impossível. Por mais que eu adore Conan Doyle ou Michael Chabon, não posso comparar eles a Stendhal ou a Sterne. A mais intelectual das artes, a mais artificial, não comporta essa democracia. Elogio Sherlock Holmes, mas sei que ele não é 10. Por isso que não pode haver nota para livros. Holmes é delicioso, a Cartuxa de Parma é uma obra-prima. É assim.
   O cinema nada tem da racionalidade da literatura. Por depender de um grupo e por depender de dinheiro, o acaso entra em sua formação. A partir do momento em que se termina o roteiro, começa a sorte a influir no filme. Achar o ator certo, a trilha certa, a locação exata, encontrar o diretor que entenda o roteiro. E editar com sabedoria. Tudo é tão lotérico como um casamento.
   Por isso é tolice imaginar o cinema como obra solitária de um gênio titanico. Isso não existe. O cinema nunca é nobre, é sempre burguês, pois é grupal e focado em público. Bergman é o ícone do "autor absoluto", mas ele, mesmo ele, dependia da TV suéca, de um grupo de atores perfeitos, de geniais diretores de fotografia e principalmente de um público bem formado. De um público de cinema "para filmes de Bergman". Nas décadas de 50 a 70 esse público existiu. Hoje Bergman não teria esse público. Esse público não mais existe. O suéco seria um escritor.
   Existe toda uma corrente de críticos, com Ebbert na dianteira, que tenta dar ao cinema aquilo que a música tem: a liberdade de opinar. Se Beethoven é um gênio, os Beatles, mesmo fazendo canções vulgares de 3 minutos, dirigidas a adolescentes semi-analfabetos, também o são. Porque Beethoven consegue o máximo em seus objetivos. E porque a banda de Paul também tirou o máximo daquilo a que se jogou. Desse modo, pode-se dizer que Leoncavallo, mesmo sendo um "clássico", é menor que o Jackson Five, porque Leoncavallo falhou em seu métier, e os Jacksons foram perfeitos naquilo que tentaram.
   Quando Bruce Willis amarra a mangueira de incêncio na cintura e salta do prédio que explode, temos o máximo cinema em sua máxima execução. Edição, fotografia, ator, roteiro e direção se unem e constroem todo um crescendo que consegue nunca parar de funcionar. Na época de herois indestrutíveis, vemos um heroi que geme, sente dor, sangra e cansa. Vemos frases que trazem humor e ironia e nos lançamos em cenas que apesar de impossíveis sempre parecem "críveis". O filme é absolutamente perfeito.   Pragmaticamente ele entrega em 100% aquilo que quer nos dar. E faz ainda mais, cria um novo estilo de ação. O heroi que não é heroi. E nem mesmo anti-heroi. Um simples azarado. Que tem sorte....
   Duro de Matar é Beatles em relação ao Haendel que é Wim Wenders. Paris-Texas e Die Hard são tão bons quanto. Ícones dos cinéfilos dos anos 80.
   PS: O que digo é mais fácil de compreender quando vemos filmes ruins. Um filme que tenta ser genial e raro e se mostra chato e óbvio, é tão ridiculo quanto uma comédia sem graça.