Mostrando postagens com marcador catherine hardwicke. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador catherine hardwicke. Mostrar todas as postagens

OS REIS DE DOGTOWN ( ETERNAMENTE JOVENS )

Há tempos eu ouvia falar desse filme. Dirigido com volúpia por Catherine Hardwicke ( que depois fez Crepúsculo, o que prova que cinema hoje é questão de equipe ), produção de Art Lison ( de n filmes de Scorsese e Lumet ) e David Fincher. Com Emile Hirsch, Heath Ledger, John Robinson e um ator exuberante, Victor Rasuk. E com a melhor trilha sonora desde QUASE FAMOSOS. Pois ontem eu o assisti....
Skate em 1976 era coisa de boiola. Quem não podia pegar onda, por falta de coragem ou de oceano, andava de skate. Mas andar de skate era como andar de patins, voce flutuava com delicadesa. O filme é sobre o nascimento de uma nova era, sobre quatro caras que mudaram TUDO, e não só o ato de deslizar sobre um shape. Pois como diz o filme: toda revolução vem da rua.
Que revolução ?
Existem lugares no mundo que são O LUGAR. O lugar certo para se estar naquele momento. Paris em 1922. O Village em NY em 1948. Londres em 1965. Barcelona em 1991. E Venice Beach, LA, em 1976.
Porque lá havia um Pier onde se pegava onda. E 3 moleques de 14 anos que não podiam ficar no mar ( apanhavam dos surfistas mais velhos ). Esses "heróis" eram : Tony Alva, um filho de chicanos, pobre e arrogante, Jay Jay, filho de hippie drogada, e Stacy Peralta, um responsável cabeludo, teimoso, tímido. Os três pegaram aqueles skates e resolveram voar. Mas é muito mais que isso !
Heath Ledger, em atuação magistral, faz o doidão-dono-de-surfshop. Ele resolve empresariar os garotos. Cria a Zephyr. Pausa : Em 1977 leio na revista POP, editora Abril, sobre esses caras. Fotos de Jay Jay andando dentro de canos de enchentes. O cara parecia cool, rebelde, nervoso... ele era mesmo tudo isso.
Então os três ( voltando ao filme ) vão a campeonato e causam sensação. Na verdade eles criam o que a gente hoje sabe ser UM CAMPEONATO. Tony Alva tira a música de dentista da pista e bota Iron Man. Acredite, até então rock pesado não era coisa de skate. E na pista ele desliza como se estivesse numa onda. Flutua, voa, dá batidas na crista. O povo fica de boca aberta.
E tudo muda. Os três, de súbito estrelas da midia, criam o conceito de ESPORTE RADICAL. Rock, roupas esportivas, loucura em se atirar, rebeldia. Mas o filme mostra : eles são o artigo genuino. São eles os primeiros a invadir casas de ricaços para usar as piscinas vazias ( sim, eles criam o skate em bowl ), eles dão os primeiros aéreos e inventam a moda skatista : tênis de sola lisa, jeans largado, camiseta velha e camisa de flanela na cintura. Era 1976.
O filme entra então em sua parte amarga. Stacy e Tony brigam por vaidade. E Jay, talvez o melhor deles, mergulha no punk : raspa a cabeça, se tatua, se droga. Mas há uma bela redenção no final. Uma cena lindissima em que eles se reencontram e brincam numa piscina. Skate com poesia, quem resiste ?
Quanto a trilha sonora.... bastava a cena com Old Man de Neil Young, mas como em QUASE FAMOSOS, a trilha chega a ser covardia!!!!
1989 foi um grande ano em SP. Uma multidão de alunos da FIAM enterrou os malditos anos 80. Todo aquele dandismo britanico com seus vinhos brancos e seus blazers foi pro lixão. Discos de Duran Duran e Culture Club nunca mais. Eu fiquei chapado !
Os cabelos voltaram a ficar soltos ( sem gel ) e longos e as camisetas tinham desenhos sujos. Jeans rasgados e caindo na bunda com tênis detonado. Mochilas e bonés amassados. Pulseiras, tatoos e bikes. Deu na TRIP da época : uma foto do bando de Venice Beach, mal encarados.
Essa galera ouvia Black Flag, The X, muito Sonic Youth, Pixies e Janies Addiction. E misturava tudo isso com Beastie Boys, Public Enemy e mais Jerry Lee Lewis, Johnny Cash, John Lee Hooker e Elvis. Liam a revista ANIMAL, muito mangá, Moebius, Alan Moore e Frank Miller. Liam Bukowski, Hammet, Chandler, Poe e tudo que fosse virulento. Grafitavam, tocavam em bandas de punkbilly e alguns ouviam jazz. Criaram a cultura de rua dos anos 90. E sabiam que eram filhos de Stacy Peralta, de Tony Alva e de Jay Jay.
Vieram as bikecross, o snowboard, le parkour, o novo surf ( que leva o skate para o mar ). A moda se tornou "da rua". Tudo mudou. O conceito de ser "radical" se firmou.
E tudo nasceu entre 3 moleques de rua, na suja e mal afamada Venice Beach, por puro fun.
Tão bom quanto este precioso filme são seus extras. O roteiro foi escrito pelo próprio Peralta e nós os vemos aos 48 anos, em reencontro. Stacy Peralta trabalha agora com skate ( foi ele quem lançou Tony Hawk ) e cinema ( tem prêmios como documentarista ). Tony Alva é uma lenda viva. Dono da marca ALVA. E Jay Jay foi preso por posse e tráfico, cumpriu pena e hoje vive no Hawaii. Mas o que mais impressiona é o carisma dos 3. Principalmente Jay. Se eles foram os caras que inventaram o esportista radical, hoje eles são os embaixadores do quarentão moleque.
É lógico que me identifiquei com o filme. Me vi nele, sei daquilo tudo, conheci aqueles caras, assisti a revolução. Mas eu te juro, como cinema, mesmo para quem tem 18 anos e não sabia que skatistas já foram o futuro, ou para quem tem 60 anos, e pensa que esporte é só ginástica, o filme é absolutamente descaralhante !!!!!!