BELO

   Um último toque sobre a questão da beleza na arte.
 Se a arte é a substituta da religião, por trazer para nós o sentido do sagrado, e se é sagrado aquilo que não pode ser profanado, ou seja, aquele objeto que é único, intocado, irrepetível; bem, então a música, oferecida com extrema facilidade, se torna, toda ela, mesmo a melhor, kitsch. Uma obra de Schonberg ou Bartok se faz kitsch por poder ser cortada, usada, acelerada, congelada, à vontade. E isso é uma forma de kitschização.
 Mas não de estupro, que é a dessacralização daquilo que foi um dia sagrado. Isso seria usar Mozart numa cena de carnificina ou Debussy num estupro coletivo. E sei que tudo isso já foi feito.
 A beleza plena, sagrada, tem um preço. E, apesar de adorar rock, sei que o rock é como, sempre foi, um eterno orgasmo. Em 3 minutos há a obrigação de se atingir um pico de beleza. E essa rapidez, que é um talento, pode se fazer kitsch. A sequência sem fim de músicas que dão pequenos gozos mas nunca um orgasmo.
 Postei Schonberg como provocação. Na grande música há todo um desenvolvimento que leva ao sagrado. A beleza transformadora é essa caminhada que exige tempo, calma e alguma sabedoria.
 Em alguns discos POP, penso em Kind Of Blue, penso em Exile On Main Street, há o tempo de desenvolvimento e uma beleza imperfeita que pode ser atingida. Mas no mundo de 2017, quem ainda ouve esses discos inteiros e em solidão...