carta de uma desconhecida-max ophuls

A câmera voa, roda, baila e flerta com os atores.
O filme, feito por Ophuls ( voce conhece esse austríaco? o mais romantico dos diretores? o mais sofisticado, elegante, nobre, que é capaz de fazer Visconti parecer vulgar? ), bem, voltando, o filme feito por Max Ophuls baseado em conto de Stefan Szweig, fala de um amor irrealisado e se passa na Viena de 1903.
Assistimos a bengalas com castão de prata, carruagens que correm pela chuva sobre calçadas de granito, chás entre espelhos de cristal e veludos da Bélgica, cartas em bicos de pena à luz de gás, vestidos de seda e cartolas negras, luvas retiradas e cigarros acesos...e pensamos que ainda hoje todo o nosso imaginário do amor-sublime está intimamente ligado à essas noites escuras, às sombras de velas, escadarias secretas e peles pálidas entrvistas em decotes discretos.
O filme é uma delícia para os românticos, para os sonhadores, para os literatos, para os fora de moda e fora de esquadro ( Ophuls foi um diretor cheio de lutas, incompreensão e dor, seus filmes em seu tempo eram considerados pesados e exagerados- hoje ele é considerado um mestre- leve, fluido e romantico ).
Fácil de assistir, ele deixa uma vontade de ver de novo e viver mais um pouquinho naquele universo de frases bonitas, ruas bonitas, chuvas bonitas e luzes tão tristes...

A MULHER DE AREIA DE TESHIGAHARA

Feito em 1965, A MULHER DE AREIA de Hiroshi Teshigahara, venceu a palma de ouro daquele ano e concorreu a dois Oscars. Vamos ao filme.
Um homem anda pela areia. Ele coleta insetos para sua coleção. Se hospeda numa casa que fica num buraco, entre as dunas. Lá vive uma viúva, só. Ele se torna um prisioneiro.
O filme é longo, imperfeito, difícil e cheio de grandes e muito fortes cenas.
Primeiro sua fotografia. Areia, cabelos e peles filmadas em detalhes gigantescos dando ao filme um erotismo absurdo. Nós quase sentimos o cheiro dos corpos, quase tocamos o suor que escorre, parece possível tocar as peles que são lavadas, arranhadas e mordidas por todo o filme.
Os atores, Eiji Okada e Kyoko Kishida dão um show de raiva e de sexualidade pura. Raras vezes assisti filme mais erótico.
A música vanguardista de Toru Takemitsu é de uma inesgotável complexidade, preenchendo a fita de climas e momentos impressionantes.
É um filme que excita para em seguida assustar. E é uma alegoria perfeita sobre o sentido do trabalho e da função do homem na Terra.
Único.

A PAIXÃO DE JOANA D'ARC-O QUE É ISTO?

Foi Jean Cocteau quem disse que A PAIXÃO DE JOANA DARC de Dreyer é um filme que parece ter sido feito no tempo em que o cinema não existia. Pois eu digo que Dreyer não faz cinema. Ele faz um outro tipo de arte, uma arte tão original, tão moderna, tão radical que ainda não foi nomeada.
Durante 3/4 do filme o que vemos são paredes brancas e rostos em super-close. Joana, muito jovem, muito crente, muito indefesa, é cruelmente massacrada por inquisidores balofos e machistas. Dreyer usa como roteiro os autos do processo real e isso dá ao filme algo de documentário e de perversamente doido.
A fotografia, de Rudolph Maté, é de um glorioso branco e no final, a cena da fogueira tem o mais belo fogo que já ví.
Falconetti tem aqui aquela que é considerada a mais fantástica atuação feminina da história e o que posso dizer é que chorei ao vê-la perceber, com um olhar apenas, seu final inevitável. Joana sente medo, e nós sentimos com ela.
Carl Dreyer se interessou por apenas um assunto: Deus. Todos os seus filmes falam disso: Deus, o mal, a fé, a dor. Ele foi um bruxo, um louco, um poeta, um Homem. Joana é um soco na boca, um filme poderoso, duro, cruel e absolutamente incomparável em sua originalidade rica e bela. Sua montagem, em que os cortes são velozes, a câmera sempre se movendo em horizontal, os atores berrando e rindo, Joana suplicando e chorando, as portas parecendo fugir e diminuir... é fascinante.
No mais assisti finalmente este mítico filme numa cópia sem trilha sonora e com cartelas em francês. Mesmo assim seus 80 minutos pareceram 20 e me sentí completamente arrasado por sua força. OBRIGATÓRIO para quem se importa com os mistérios da vida e a dor de ser.

O MAIS PERFEITO DOS FILMES-REAR WINDOW

Raras vezes assistimos a algum filme perfeito. Ocasionalmente o filme pode ser genial, sublime, divertido, mas ele sempre apresenta falhas. Momentos de tédio, tomadas inúteis, frases dispensáveis.
JANELA INDISCRETA não tem um só momento fraco. Desde sua abertura, até seu final perfeito, tudo é feito com precisão, com sabedoria, com maestria.
O som, sem trilha sonora-mas com ruídos e trechos de melodias-que lembra Tati, é perfeito. O cenário, um apartamento e o prédio em frente- é fascinante. As histórias vistas nas janelas e jardins- são tão cativantes que dariam vários outros filmes. Mas este, este filme é absolutamente prazeroso. Torcemos para que não termine.
James Stewart é um fotógrafo solteiro que convalesce com a perna quebrada. Ele é obviamente impotente. Grace Kelly ( sua entrada em cena é A MAIS LINDA IMAGEM FEMININA DO CINEMA ) flerta com ele, o seduz, o conquista. As cenas entre os dois são leves, sofisticadas, cheias de humor e com subtramas de raiva e dor. ( O filme é alegre, mas tem algo de neurótico por trás ). Stewart se agarra em sua solteirice e se envolve com as janelas ( cinemas ? ).
O final, irônico, é de uma riqueza perfeita, e todo o filme prescinde de falas, poderia ser um filme mudo. Stewart agora tem duas pernas engessadas e Grace, linda como o impossível, comanda o apartamento.
Quem mais poderia fazer um filme pop onde as mulheres são víboras, os homens são impotentes e seu único cenário é flagrantemente falso ?
Hitchcock é cinema e o amor à Hitch é a prova final de todo/qualquer cinéfilo.

O AMOR É SEMPRE MENTIROSO-VERTIGO

O melhor dos diretores ( aquele que fazia grande arte e comércio pop ao mesmo tempo ), dá em VERTIGO o mais devastador retrato sobre a ilusão do amor.
Não contarei sua história para não adiantar sua magia. Direi no entanto, que jamais uma cidade foi mais bonita que a SanFran do filme, com seus azuis e amarelos da primeira parte "sonhadora" e seus neuróticos verdes e cinzas da segunda parte. O filme, quase sem diálogos, é como um sonho-alucinógeno, e nos faz realmente sentir o que seu protagonista sente.
Pierre Boulez disse que a trilha sonora deste filme ( bernard herrman ) é a mais perfeita da história cinematográfica. Não sei se ela é, mas direi que ela é hipnótica, wagneriana, obsessiva, inesquecível.
James Stewart tem aqui aquela que é possivelmente a melhor atuação já vista. Ele passa, na hesitação de sua voz, no olhar ansioso, toda a carência, todo o amor do personagem. Sua sina, seu futuro vazio, o seu medo.
Como todo filme de Hitch, o crime é mero pretexto para sua profunda análise da doença humana, das taras e psicoses, das dores e mentiras do mundo. E tudo isso, que em outras mãos se transformaria em arte hermética e obscura, com Hitch se torna diversão simples, direta, nítida e nada pedante, porém, profunda.
Suas cenas recordam muito TAXI DRIVER, a personagem feminina mostra um desamparo tocante e é este o filme que deixa mais clara a afinidade que Bunuel sentia por Hitchcock.
Seu final, trágico-imperfeito-abrupto-louco e vazio, é dos mais cruéis já filmados e ficamos sentindo a mesma dor absurda de Stewart.
Inesquecível, ele nos faz pensar muito. Nas mentiras do amor, na ilusão que criamos para nós mesmos, na busca inutil pela perfeição, e na música irresistível dessa ilusão.
Um dos maiores filmes já feitos e sem dúvida é este o mais moderno e influente dos filmes.
Hitchcock é o cara.

o filme mais sinfônico-FANNY E ALEXANDER

Bergman realizou FANNY em 1983. É seu testamento, seu último filme para cinema, seu legado ( como bom pessimista, ele imaginou estar perto do fim. Ainda viveu 24 anos...).
O filme é uma perfeita sinfonia e se a grande arte sempre aspira a ser música, Fanny é arte perfeita.
Ele começa em acordes leves e vagos, cresce em festa de sons harmônicos e coloridos, irrompe fortíssimo em graves dissonancias lúgubres e se encerra numa coda cheia de fúria, magia e mistério.
Mas do que fala o gênio, o mestre, o mais inteligente dos cineastas ?
Da luta entre alegria e dor, da disputa entre liberdade e repressão, saúde e neurose, arte e religião, fantasia e tédio, Deus e o homem. É um compêndio de todos seus filmes anteriores, de todas as suas dores e alegrias e recorda muito Shakespeare- A Tempestade ( um mago recontando sua obra e sua magia ).
Raras vezes um filme mostrou cenários tão ricos em beleza e complexidade, raras vezes tantos atores foram melhor dirigidos ( o final, quando se fala da gratidão aos atores é de se aplaudir de joelhos ), raras vezes um filme foi melhor.
Bergman captura nosso cérebro e o leva para uma viagem. Através do olhar de um menino ( Alexander ) assistimos seu crescimento, suas dores, sua revolta e seu maravilhoso humor ( o filme tem duas das falas mais hilárias já vistas ). Nos apaixonamos por sua família, odiamos certos agregados e tememos seu destino. Tudo em ritmo perfeito, uma variação entre cenas longas e curtas, movimentos elaborados de câmera ou fixidez formal, solos ( monólogos ) ou grupos de até vinte atores atuando em grupo ( coisa que hoje ninguém mais tenta ).
Tudo está neste filme. Comédia amarga e drama insuportável. Citações de PERSONA, GRITOS E SUSSURROS, MONIKA, MORANGOS SILVESTRES, O ROSTO... estão presentes os atores que aprendemos a amar, a fotografia do mestre Sven Nykvyst, a música de Schumann e Britten, as preocupações do cineasta que melhor representou a dor do mundo moderno.
É estranho o fato de que meus cineastas favoritos sejam Kurosawa, Hitchcock, Hawks, Ford, Murnau, Lang... mas é Bergman que fala, pensa e mostra aquilo que vivo, penso e gostaria de expressar. Não sei se ele foi o melhor dos diretores, não sei se ele sobreviverá neste mundo cada vez mais acéfalo; mas ele conseguiu fazer do cinema UMA ARTE NOBRE, nobre como Shakespeare, Mozart, Shelley e Rembrandt.
FANNY E ALEXANDER é obrigatório para qualquer amante da vida, do cinema, da cor. Ele é estranhamente feliz, alegre, vivo e subitamente trágico. Nietszche.
Um filme que é uma vida, um espírito livre, eterno como um homem, belo como um segundo, feito com profundo amor pela arte, imensa criatividade e potencia criativa sem igual.
Mágico, único; INCOMPARÁVEL.

LOACH/ROCKY/LORD JIM/SOCIEDADE DOS POETAS MORTOS

VENTO E LIBERDADE de ken loach.
ingleses massacram irlandeses. todos sabem do meu sangue cem por cento católico-celta-irlandes...mas não gostei do filme. na verdade o achei maniqueista, falso, tolo, vazio. será que todo ingles era tão nazista?
MONPTI de helmut kautner, com romy schneider e horst bucholz
romy aos 18 era adorável mas o filme é velho e mofado. 1.
ABISMO DE UM SONHO de fellini com alberto sordi, leopoldo trieste.
sonolento.2.
A JANELA SECRETA de david koepp com johnny depp, john turturro.
suspense sem emoção. mistério sem tensão. uma chatice ridícula. 1.
CRIMES DE UM DETETIVE de keith gordon com robert downey, carla gugino, robin wright penn. uma das mais grotescas tolices já feitas. um pseudo musical engraçadinho, um pseudo noir sem drama, um completo equívoco. ZERO.
O LOBO ATRÁS DA PORTA de henning carlsen com donald sutherland e max von sydow. são cinco anos na vida de paul gauguin ( meu ídolo maior ). o filme é escuro, denso e prende a atenção graças a força de sutherland e ao belo strindberg de von sydow ( foi sydow o maior ator do cinema ? ). 6.
SOCIEDADE DOS POETAS MORTOS de peter weir com robin willians. um filme sobre poesia e liberdade filmado sem poesia e sem imaginação. torcemos para que willians fique mais tempo em cena, pois ele é a liberdade e a poesia do filme. os meninos são aqueles meninos de dramas da Metro dos anos 40/50, ou seja, velhos meninos...6.
LORD JIM de richard brooks com peter o'toole, james mason, eli wallach. baseado em conrad, o filme é uma cara aventura arrastada e banal. a falha central é peter que faz jim como um fraco que quase acerta, quando quem leu o livro sabe que jim é um forte que erra sempre.
ROCKY de john g. alvidsen com stallone. sly imita de niro e john imita lumet. 4.